“Não é o caminho que é difícil: é o difícil que é o caminho.”
Simone Weil
A linguagem e a adjetivação, em política, são cada vez mais relevantes para os emissores, intermediários e recetores. O mesmo sucede, concomitantemente, com a comunicação e o marketing político. A substituição, por exemplo, amiudadas vezes, na refrega política partidária diária e semanal pela adjetivação simplista de “a direita” e ou “a esquerda” é bem um sinal do que tem vindo a ser alterado. A simplificação da linguagem acaba por ter efeitos. Positivos para uns. Negativos para outros. Para atores e protagonistas. Porquanto tal é redutor e enganoso. E em Portugal, desde que sobretudo entrámos no tempo da vigência da atual solução governativa, é cada vez mais notório, para alguns de nós, que a linguagem política está em acelerada mudança. Desde logo e neste particular, com o PS a ser capturado pela linguagem que convém ao PCP e sobretudo ao BE – “a esquerda, nós todos”, “a direita, os outros”.
E neste domínio há já uma espécie de derrotados por captura de linguagem no curto prazo (PSD sobretudo) e, a continuar esta deriva ou mudança, no médio e longo prazo (o PS).
Durante décadas, no vocabulário político português corrente, as palavras “direita” e “esquerda”, na dialética política, na prática política parlamentar e governativa, eram sobretudo utilizadas no plano sindical, pelo Partido Comunista Português e pela quase totalidade da extrema-esquerda radical.
Isso tem estado a mudar. E é curioso verificar que quem mais tem vindo a acomodar-se com esta linguagem falsamente simplista e perigosamente redutora são, por um lado, as gerações mais novas (ainda por cima, cada vez mais em minoria num país envelhecido!), sobretudo do PS e do PSD, e por outro lado os “caddy” recém- -chegados que entretanto se aproximaram e filiaram quer no PS, quer no PSD.
Tal acomodamento tem ganho grande amplitude quando vários deles, de ambos os partidos políticos, sem currículo e histórico e experiência política, são colocados na linha da frente do protagonismo mediático quotidiano pelos diretórios políticos nacionais e parlamentares.
De forma ingénua nuns casos e por convicção noutros, esses protagonistas acabam por ser uma espécie de caucionadores de uma nova linguagem política portuguesa contemporânea, com uma perceção que pouco tem a ver com a realidade. E que acaba por ser má para o sistema de partidos, para o sistema político e para o país em geral. É por isso que em partidos políticos como o PSD, por muitos esforços que se convoquem programaticamente para o regresso às origens de partido das bases, interclassista, moderado e no centro da vida política, económica, social e cultural do país, isso, na maior parte das vezes, não passa, não colhe junto até do seu eleitorado. E de pouco servem algumas tentativas de tempero político ideológico, com posições de abertura nuns casos tímida e noutros casos oportunística em relação a discussões que têm que ver com os costumes. E, nesse particular, justiça seja feita à coerência e convicção de pessoas como Teresa Leal Coelho e Paula Teixeira da Cruz, do PSD, e de Isabel Moreira, do PS. Mesmo discordando de todas elas, neste particular há que reconhecer a sua coerência e coragem. O mesmo talvez não deva corresponder em relação a outros protagonistas. Hoje em dia na prática política portuguesa, infelizmente, há muito ruído, cumplicidade de grupos no recrutamento para protagonismo mediático, muito generalismo, Facebook e redes sociais a mais do que solidez programática, coerência e convicções discursivas – e sobretudo assertividade consentânea com as prioridades do país.
O uso da linguagem política tem mais que ver com o curto prazo do que com o médio e longo prazo. Esta nova linguagem é enganosamente mobilizadora e parceira da modernidade. Aliás, essa coisa da modernidade não é mais do que uma consequência direta do generalismo que tem vindo a instalar-se na vida política nacional. Da googlização e dos especialistas feitos na net, à pressa e a martelo.
Esta captura, direi geracional, pelos extremos – à direita e à esquerda – está a tempo demais a deixar perigosamente o centro isolado e órfão. E vai ter consequências. Já temos várias no curto prazo. E a não existirem alterações, as coisas vão piorar no médio e longo prazo.
Aliás, atualmente, na Europa e em Portugal, goste-se mais ou goste-se menos (e até a mim enquanto “natalista” isso não me agrada), é bom que se interiorize por décadas que, para se vencerem eleições, tal só será possível se não se diabolizarem as gerações mais maduras, não só com propostas, mas também com protagonistas que tenham em conta os centros de interesses e as preocupações desses setores etários. E, como é bom de ver, é só consultar o histórico dos estudos de opinião qualitativos e quantitativos e perceber quem são, o que pensam, onde estão e normalmente onde votam ou poderão vir a votar no futuro. E partidos políticos como o PS e o PSD são quem mais tem de ter isso presente. Eu sei que é mais cómodo ir na onda. Porque contrariar tudo isto dá trabalho. É verdade. Não é para muitos. Até porque vários se alimentam e vivem desta nova situação política e linguística.
Escreve à segunda-feira