As reacções tempestivas e violentas não se fizeram esperar por parte de alguns docentes. Estupefacto com as reações, decidi abandonar aquele lugar onde não parece existir liberdade de expressão, respeito, tolerância e capacidade de comunicação.
Face ao que tenho vindo a observar, a escutar e a sentir, há um gradual crescimento de tais comportamentos, tanto nas redes sociais como no “mundo lá fora”. Emoções barulhentas, agitadas e fortemente impregnadas em vocabulário ofensivo, irado, roçando por vezes o ódio. Este inevitável conflito torna-se mais preocupante, quando o vemos nas escolas. E não falo só entre alunos. Ele está presente também entre os próprios professores e entre estes e os alunos. Os nervos em franja que cada um transporta são autênticas panelas de pressão que, à mínima acendalha, fazem explodir a tampa.
Ora, como diz o Pedagogo Sérgio Niza, numa certa entrevista intitulada “Ser professor é um Inferno”, “o principal problema da escola está neste modelo de não-comunicação em que o professor usa mais de três quartos do tempo da aula para falar sem que os alunos participem ou estejam envolvidos. Assim não há diálogo possível. Poderá algum jovem ou criança suportar isto?” — não, de facto, ninguém pode suportar isto. Quando não nos permitem ter uma palavra, uma opinião ou apresentar a nossa perspectiva sobre um determinado assunto, é certo que, mais tarde ou mais cedo, a indisciplina ou a desmotivação emergem, com todas as consequências nefastas para todos.
Como professores, talvez mais do que em qualquer outra profissão, porque a nossa matéria-prima são “pessoas” em crescimento, somos os modelos, os exemplos de indivíduos a imitar. Esta tomada de consciência é urgente. Os alunos copiam e reproduzem os comportamentos, as atitudes e a linguagem (verbal e não-verbal) dos adultos com quem privam ao longo das suas vidas.
As escolas são, pois, lugares de conflito por natureza, porque há uma massa humana em constante interação. É então ali o lugar onde os Mediadores de Conflitos devem agir em permanência. Estas personagens, capacitadas e treinadas para o efeito, devem ter uma presença fulcral na vida escolar, pelo que é urgente criar oficialmente esta figura em cada escola urgentemente.
Faço um apelo ao todos os “Artesãos da Educação” para cuidarem da sua postura, da sua linguagem, da sua atitude de paz, de confiança e serenidade. Saber estar na Escola e na vida exige que nos dispamos de preconceitos, julgamentos, crenças erradas. Os medos são o entrave ao crescimento, à aprendizagem e à felicidade de todos.
Dedico a todos os professores, e a todos os que procuram aquela serenidade, esta pequena história chinesa que Lao Tsé contava, do Tao de Rajneesh, e que me acompanha na vida:
Um pobre Chinês metia inveja aos mais ricos da região, porque tinha um cavalo branco extraordinário. Cada vez que lhe ofereciam uma fortuna pelo animal, o velho respondia: «Para mim, este cavalo é muito mais do que um animal, é um amigo. Não posso vendê-lo.»
Um dia, o cavalo desapareceu. Os vizinhos juntaram-se em frente ao estábulo vazio e deram a sua opinião: «Pobre idiota, era de esperar que te roubassem o animal. Por que é que não o vendeste? Que desgraça!» O camponês mostrou-se mais circunspecto: «Não exageremos, disse. Digamos que o cavalo já não se encontra dentro do estábulo. É um facto. Todo o resto não passa de uma interpretação vossa. Como iremos saber se é uma desgraça ou uma alegria? Só conhecemos um fragmento da história. Quem sabe o que irá acontecer?» As pessoas riram-se do velho. Sempre o tinham considerado um simples de espírito.
Quinze dias depois, o cavalo branco voltou. Não fora roubado, tinha-se simplesmente escapado e trazia de volta consigo uma dúzia de cavalos selvagens. Os aldeões formaram novamente um grupo:
«Tinhas razão, não é uma desgraça, é uma bênção.»
Eu não iria tão longe, disse o camponês. Contentemo-nos em dizer que o cavalo branco voltou. Como iremos saber se é sorte ou azar? Isto é só um episódio. Como conhecer todo o conteúdo de um livro quando se lê uma única frase?»
Os aldeões dispersaram-se, convencidos de que o velho estava a perder a cabeça. Receber doze belos cavalos era sem dúvida um dom dos céus. Quem o iria negar? O filho do camponês começou a domar os cavalos selvagens. Mas um deles atirou-o ao chão e espezinhou-o. Mais uma vez os aldeões vieram dar a sua opinião: «Pobre amigo! Tinhas razão, os cavalos selvagens não te trouxeram sorte nenhuma. Agora tens um filho aleijado. Quem te irá ajudar mais tarde? Temos pena, muita pena de ti.»
— Ora, respondeu o camponês, não exagerem. O meu filho deixou de poder usar as pernas, foi só isso. Quem poderá dizer o que isso nos trouxe? A vida revela-se aos poucos, ninguém é capaz de prever o futuro.»
Uns tempos depois, rebentou uma guerra e todos os jovens da aldeia tiveram que se alistar, excepto o inválido. «Ó velho, lamentaram-se os aldeões, tinhas razão, o teu filho já não pode andar mas fica contigo, enquanto os nossos se encaminham para o extermínio.»
— Por favor, respondeu o camponês, não julguem tão depressa. Os vossos filhos alistaram-se, o meu ficou em casa, é tudo o que se pode dizer. Sabe Deus se é um bem ou se é um mal.»
José Paulo Santos
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