Ahmet Davutoglu, primeiro-ministro da Turquia, anunciou ontem que vai demitir-se do cargo. Segundo o próprio, a saída acontecerá no dia 22 deste mês, altura em que deverá ocorrer uma nova convenção do partido. “Não tenho planos para ser candidato no congresso extraordinário, convocado de urgência. O partido deve estar unido e solidário no congresso. A unidade não deve ser posta em discussão, porque o destino do AKP não é apenas o destino do partido, é o destino da Turquia e da nossa região que está em causa”, disse Davutoglu.
O anúncio do primeiro-ministro turco surgiu depois de uma longa conversa com o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, na passada quarta-feira. Davutoglu afirmou que o seu relacionamento com o presidente sempre foi “fraternal” mas referiu-se às diferenças de longa data que os dois tiveram sobre as políticas do governo. “O candidato mais forte é aquele que está em paz consigo mesmo”, disse o primeiro-ministro numa entrevista coletiva. “Eu nunca tinha negociado os meus princípios com ninguém e os meus princípios não são negociáveis”, acrescentou. Davutoglu disse ainda que a sua saída se trata de uma “escolha e não de uma necessidade”.
Apesar do anúncio, Davutoglu parece não ter qualquer ressentimento com Erdogan, tendo afirmado que sempre teve uma relação “fraternal” com o presidente turco. “Não tenho censura, raiva ou ressentimento contra ninguém”, frisou o ainda primeiro-minitro. “Da minha boca nunca saiu qualquer palavra negativa sobre o presidente. Nem vai sair”, disse.
Apesar de garantir não ter nada contra Erdogan, a imprensa internacional avança que o presidente turco terá acusado Davutoglu pela lentidão nas alterações à Constituição para reforçar os poderes presidenciais.
Consequências A saída de Davutoglu é consequência das várias divergências que mantinha e ainda mantém com o presidente turco. Em muitos pontos, Erdogan e Davutoglu não se entendiam. Entre eles está o acordo alcançado com a União Europeia para diminuir o fluxo de refugiados na Europa, o julgamento de jornalistas no país e a retomada do processo de paz com os curdos.
A saída surge numa altura em que a Turquia enfrenta um momento de instabilidade devido aos conflitos com os rebeldes do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), aos ataques do Estado Islâmico e ao enorme fluxo de refugiados que tem recebido.
Neste momento, o país está a meio da implementação de um acordo com a União Europeia, intermediado por Davutoglu, para limitar o número de refugiados que chegam através da sua fronteira. Em troca, terá várias ajudas da União Europeia.
Com a saída do ainda primeiro-ministro, o acordo corre o risco de ser cancelado uma vez que o presidente turco sempre mostrou não estar de acordo. A decisão do primeiro-ministro foi anunciada dois dias depois de a Comissão Europeia ter proposto a isenção de vistos para os turcos, medida que faz parte do acordo alcançado.
De acordo com vários analistas citados pela imprensa internacional, quem quer que suceda a Davutoglu não será capaz de realizar uma política independente – como o primeiro-ministro fazia – e tomar qualquer decisão que seja contra a opinião de Erdogan.