O restaurante Beira-Rio está literalmente a dois passos da sede da Zomato e, por isso, serve de sala de pequeno-almoço, pausa para café e o menu do dia é quase que obrigatório. Numa espécie de mini aplicação dentro da aplicação mãe, há sempre quem de manhã fotografe a ementa e a envie por email para que todos possam escolher aquilo que lhes vai cair no prato ao meio-dia. “Isto quando não comemos o que trazemos de casa”, conta Inês, interrompida pela voz envergonhada de Sara, que admite que em caso de marmita vai mesmo em frente ao computador. Isto enquanto rouba uma bolacha do pacote aberto e que vai servindo de lanche a toda equipa.
Pedimos desculpa pela falta de glamour inicial, mas desengane-se quem achava que na sede de uma das aplicações gastronómicas com mais sucesso dos últimos anos iria encontrar um cenário gourmet. Podem levar tupperware, comer na mesa de trabalho e lanchar bolachas Maria, mas na hora de saber onde comer fora de portas, não há pai para estes foodies [nome pelo qual são conhecidos os amantes de comida e bebida e muito comum dentro da comunidade Zomato].
“Chega a ser chato, os meus amigos devem achar que eu sou a aplicação em pessoa e que sei tudo sobre restaurantes”, conta Rafael. Todos reviram os olhos em tom de “pois é, é mesmo isso”. Afinal, não há quem escape ao estigma de trabalhar em algo ligado à gastronomia. “Todos acham que a minha vida é comer e beber e estão tão enganados”, admite Nuno. “Fala por ti”, completa João, em tom irónico. “Vá lá”, admite Nuno, “hoje por acaso ofereceram-me o almoço”. Os dois fazem parte da equipa de vendas e, por isso, são aqueles que mais próximo estão dos clientes. Quando um restaurante abre, cabe aos dois ir visitar, apresentar o produto, tirar fotos e conhecer o menu.
A trabalhar na Zomato há pouco mais de um ano, João já perdeu a conta aos espaços que visitou, até porque agora não há um que abra que não solicite a visita da equipa. “Os restaurantes reconhecem a importância de estar na Zomato”, refere, lembrando alguns dos encontros mais caricatos em que até o google translate teve que usar para comunicar com os donos de um japonês que nem inglês sabiam falar. “Mas lá nos entendemos e compraram o produto”, diz orgulhoso.
Como é que isto funciona? João usa a palavra “comprar”, mas a verdade é que na Zomato o único serviço pago é o da publicidade na página. Tudo o resto é gratuito e a desconfiança das pessoas perante um serviço que os ajuda a vender sem terem que pagar por isso talvez tenha sido a barreira mais difícil de ultrapassar.
Sara está encarregue do marketing e trabalha na Zomato desde o dia um. Se agora, muitas vezes, são os próprios espaços a contactá-la para terem um perfil na aplicação, o início foi bem diferente. “Foram meses a calcorrear Lisboa para não deixar nenhum restaurante de fora”. Com uma média de 100 visitas por dia, além das bolhas no pés, Sara teve que aguentar os muitos “nãos” vindos de pessoas para as quais a palavra “Zomato” era totalmente desconhecida. “Ninguém acreditava que estávamos ali para as ajudar e que ainda por cima não tinham que pagar nada por isso”, lembra.
As primeiras portas fechadas começaram a abrir-se e a verdade é que atualmente Portugal serve de exemplo para o resto do mundo. Em dois anos, a equipa cresceu de 12 para 40 colaboradores e o site conta com meio milhão de utilizadores e mais de 1,5 milhões de visitas por mês. “Temos duas características perfeitas para esta aplicação: gostamos de comer e gostamos de opinar”, explica Sara, enquanto tenta fazer a ligação com Miguel Ribeiro, que está na Índia – país onde nasceu a Zomato – a meio de um brainstorming para trazer novidades à marca. Quando o Skype dá sinal de chamada, Miguel, country manager da empresa em Portugal que passou recentemente a liderar o mercado europeu, explica o sucesso de Lisboa, capital de um país sobre o qual, aquando o arranque da Zomato, poucos eram os indianos que já tinham ouvido falar. “Somos uns conquistadores natos”, admite, em tom de brincadeira, voltando ao ar sério quando recorre aos números: “Atualmente, 20% da população ativa de Lisboa usa a aplicação, isso é um número incrível”.
Mas afinal, estamos a falar do quê? Comida, aplicações, opiniões, rankings, check in. É a segunda vez neste texto que recorremos a um pedido de desculpas, mas o entusiasmo de uma foodie às vezes sai do prato e chega às palavras escritas. Falar sobre comida é estimulante, mas antes de avançarmos para o segundo prato, é melhor voltar às entradas.
A Zomato é uma aplicação de descoberta de restaurantes, que disponibiliza informação sobre mais de um milhão de espaços em 23 países. Enquanto utilizador, qualquer pessoa pode ser passiva e usar o site apenas para consultar aquilo que os outros dizem sobre o espaço que têm em vista, ou podem decidir ajudar a enriquecer a informação com fotos, opiniões e sugestões sobre os cafés, restaurantes e bares que vão visitando. Tudo junto, dá origem à maior base de dados sobre restaurantes de que há memória.
Façamos um teste com um dos mais conhecidos e, arriscamos a acrescentar, melhores restaurantes de Lisboa. Pesquisar “Solar dos Presuntos” na Zomato dá direito a saber que conta com 4,6 pontos (de 0 a 5), que o prato de quarta-feira é cozido à portuguesa, o preço médio é 70 euros para duas pessoas e que está fechado ao domingo. Tudo isto pintado por 154 opiniões de clientes, que conseguiram tirar mais de 300 fotografias antes de atacarem os enchidos vindos diretamente de Monção. Alguém avise o Evaristo que o seu restaurante está nas mãos dos foodies de Lisboa.