Nick Kyrgios. Um bad boy que nem gosta assim tanto de ténis

Nick Kyrgios. Um bad boy que nem gosta assim tanto de ténis


O segundo cabeça de série do Millenium Estoril Open entrou a vencer no torneio. Mas a curta carreira já envolveu polémicas com outros tenistas e até críticas a músicos


O que é que se faz com um bad boy no desporto? Há quem morra de amores por ele, outros evitam-no, é sempre assim. Mas todos, mesmo sem que a razão explique, acabam por vê-los e a pensar: “o que é que eu hei de fazer?”. Basta olhar para Zlatan Ibrahimovic ou para Mario Balottelli e não é preciso dizer muito mais. Deixemos os craques incompreendidos do futebol, e peguemos nas raquetes e nas bolas amarelas fluorescentes para falar de Nick Kyrgios, o tenista australiano de 21 anos (completados ontem), que se tornou há dois anos no mais jovem a bater o número um – era Rafael Nadal (5.o) na altura – num torneio de grand slam, o Wimbledon, desde que o espanhol fez o mesmo, mas em 2005, diante de Roger Federer (3.o) no Open de França. E se em 2013, ano em que se estreou na elite do ténis mundial,  andava pelo lugar 843.º do ranking ATP, a sua escalada foi vista como uma das mais impressionantes da modalidade,  hoje em dia ocupa o último lugar do top 20 do circuito.

Ontem estreou-se no Millenium Estoril Open na segunda ronda como segundo cabeça de série e uma vitória diante de Inigo Cervantes (58.o) por 7-6 e 7-5, só que o talento durante o jogo é, infelizmente para muitos (e até para o próprio), semelhante ao seu comportamento: insultos a árbitros, fãs e declarações públicas sobre casos de traição entre tenistas. A isso junta-se o gosto pelo rap, por comédias e pelo cor de rosa e a sua cruz dourada. Sim, é pesquisar as fotografias e vai encontrar Nick a morder muitas vezes a cruz que tem ao peito ou então a relaxar com uns headphones cor-de-rosa. É que mesmo sendo um bad boy, toda a gente tem sentimentos.

Mesmo que não se perceba porque é que certos desportistas são assim, convém conhecer a sua história. Nascido em Canberra na Austrália, é filho de um grego e de uma malaia, e o mais novo de três irmãos. Começou a jogar em 2001 quando tinha apenas seis anos, enquanto alguns dos seus ídolos como Roger Federer já estavam a deixar marcas por esses courts fora. No entanto, antes já tinha passado pelo basquetebol no seu país. Mas foi mesmo de raquete na mão que começou a vencer e a destacar-se: em 2013 venceu o Open da Austrália júnior ao derrotar Thanasi Kokkinakis na final (7-6 e 6-3), para além de levar o caneco, mas em pares, no Roland Garros e em Wimbledon.

Três anos volvidos e regista uma final no Estoril Open (o ano passado perdeu para Richard Gasguet (10.o)), a vitória sobre Nadal e outra sobre Roger Federer em 2015 no Masters 1000 de Madrid, e a quarta ronda no Open da Austrália do ano passado, onde na sua casa venceu Andreas Seppi (41.o).Títulos? Só um, e deste ano, no Open 13 em Marselha onde deixou ficar para trás nomes como Tomas Berdych (8.o) ou Marin Cilic (12.o). E claro o melhor registo de vitórias até agora: 14 triunfos contra três derrotas

 É portanto uma estrela em ascensão com um ar de rufia, mas que no fundo esconde um lado mais mole. Esse foi revelado quando a sua avó, “a sua segunda mãe” morreu no princípio de 2015, depois do tenista ter tatuado o número “74” – idade com que a avó morreu. “Ela nunca chegou a ver-me no Australia Open mas quando eu era criança ela levava-me aos torneios em Canberra e em Sydney quando podia conduzir”, contou ao diário australiano “The Sidney Morning” Herald. Muito bem, e então o que tem este jovem aussie (como se chamam quem é da terra dos kangurus) de bad boy?

Insultos e traições Para além dos comentários entre partidas para adeptos que saem a meio de um jogo, de alguns insultos a árbitros e até cantores de quem é fã ( a Drake, por exemplo),  de fotografias de língua de fora e de algumas raquetes partidas, como descreve o jornal britânico Daily Mail, houve um caso em Agosto do ano passado, que podia muito bem ter “sujado” para sempre o nome de Nick: o Masters de Montreal onde mediu forças com o suíço Stan Wawrinka (4.o) – e venceu.

“Desculpa dizer-te mas o Thanasi Kokkinakis fez sexo com a tua namorada [a tenista croata Donna Vekic]”. Foram estas as palavras do australiano para Wawrinka durante o segundo set e claro, o mundo todo assistiu sentado no sofá. Em resposta, já depois do encontro, o tenista suíço respondeu no Twitter: “é muito desapontante por ver um atleta e colega a ser tão desrespeitoso de uma maneira que eu nem imaginava”, escreveu. A mãe de Nick tentou defender o seu filho, mas o resultado foi ainda pior: as redes sociais viraram-se contra a família do australiano.

Resultado? Foi avisado de que seria suspenso por 28 dias pela ATP caso acumula-se mais multas no valor de 4.4 mil euros (depois de já ter de pagar cerca de 22 mil euros) – a única novidade boa era que estas condições poderiam ser reduzidas até dia 24 de fevereiro deste ano. E logo dois meses depois, nova multa (perto de 2 mil euros) e nova violação do código de ténis – algo que tem repetido sucessivamente na sua carreira – no Masters de Sanghai, onde afirmou que jogou perante um “circo”. Os seus dois ídolos, Nadal e Federer, condenaram o episódio bem como as instituições que comandam o desporto, e o australiano acabou por se retratar, e quatro meses depois do incidente revelou que tudo estava bem ao jogar ao lado de Wawrinka emSingapura na International Premier Tennis League.

Só que o tal pedido de desculpas foi feito bem ao estilo de qualquer bad boy. “É claro que não o farei outra vez, mas não me senti embaraçado por isso. Eu pedi desculpa, se ele o aceita ou não, não é meu problema”, disse durante o Open dos Estados Unidos da América da época passada – torneio em quase foi expulso em 2014 –, citado pelo “Guardian”.

O episódio passou, mas a relação amor ódio com o ténis ficou bem vincada. “Não diria que amo este desporto para ser sincero. Gosto de ganhar, gosto de competir, o ténis é a minha vida, e não saberia o que fazer se fosse este desporto. Mas dizer que o amo é uma palavra demasiado forte”, disse. Uma ideia que já tinha deixado em declarações em junho do ano passado.

E em 2016? Bom, para já trocou críticas sobre lesões falsas com o seu parceiro da David Cup Bernard Tomic (22.o), afirmou que o ténis “está arruinado e não é imparcial” durante o Masters de Miami – onde se tornou o primeiro do seu país a chegar aos quartos de final desde Lleyton Hewitt – e pode vencer o Millenium Estoril Open. Isso e continuar a ser bad boy. Afinal não faltarão espetadores para o ver, não é?