Há 16 anos fiz-lhe uma entrevista que começava por lhe dizer que tinha a imagem de um troglodita. Hoje já é considerado um moderado… O que mudou neste tempo?
Falando da minha imagem televisiva, que é redutora do que sou, a verdade é que agora apareço como um moderado, atendendo a que no programa televisivo “Prolongamento” está um verdadeiro troglodita [Pedro Guerra] dez vezes pior do que eu, na verdadeira aceção da palavra.
Como aguenta um programa com o Pedro Guerra?
Essa pergunta faço-a todos os domingos à noite quando começo a pensar no dia seguinte e na segunda-feira quando termina o programa, comento com o Sousa Martins que “já foi mais um”. Temos de ter paciência para ouvir tantos disparates. Percebo que ele defenda os interesses do Benfica e que diga os disparates que bem entende, o que me incomoda é ele usar a estratégia que aprendeu na política em que fala mais alto quando estou a dizer alguma coisa que ele não quer que as pessoas oiçam. Isso incomoda-me muito e faz-me saltar.
Mas não estará hoje na situação em que estavam os seus colegas de há 16 anos quando dizia que eles o criticavam mas ficavam no programa por causa do dinheiro? Aceita os desaforos de Pedro Guerra porquê?
Não aceito, combato-os. Embora entenda as razões que levaram Eduardo Barroso a abandonar o programa, se todas as pessoas desistissem por causa dele ser mal-educado e de falar em cima dos outros já não havia programa. Continuar no “Prolongamento” apenas depende de mim e da TVI, mas, palpita-me, que, levando em conta o que dizem os benfiquistas, Pedro Guerra é capaz de sair do programa primeiro do que eu.
As eleições que se realizaram no domingo passado no FC Porto foram antidemocráticas.
Antidemocráticas não sei, sei sim que não houve voto secreto. Quando fui votar recebi os dois boletins, um para os órgãos sociais e outro para o conselho superior, e quem concordava com a única lista concorrente dobrava-os e à frente de toda a gente e colocava-os na urna. Quem queria votar em branco tinha de levar os boletins para casa e quem queria votar nulo tinha de os riscar à frente de quem ali estava. Por acaso, estava lá Pinto da Costa, calculo que tenha estado o dia todo, e disse-lhe que não concordava com a falta de voto secreto, apesar de ter votado nele. Lamentei que o nosso clube esteja a passar por uma situação destas. Se estes regulamentos se mantiverem, não faz sentido haver eleições quando só existir uma lista única.
Acha que as eleições foram semelhantes às do PCP onde os militantes votam de braço no ar?
Foi igual no que diz respeito à lista única, mas isso não é culpa do presidente, já que as pessoas que acham que podem fazer melhor deviam ter avançado. Não digo que tinham obrigação de ganhar, mas deviam avançar. Por exemplo, como é que o Vítor Baía diz que se ganhasse que “varria aquela gente toda” e depois nem sequer vai votar? Se ele acha que pode fazer melhor porque não avança? Ninguém se afirmou como alternativa, logo não há oposição.
No final do ato eleitoral disse que esperava que o presidente fizesse alterações na SAD.
Sim, é o que espero. Pinto da Costa até me disse que eu estava mal informado, pois há uma novidade na SAD que é o José Américo Amorim, e nem me falou da outra, que é o Antero Henrique, porque não estava à espera que eu me risse. O que o clube precisa é de uma mudança e essa podia ser dada, por exemplo, com a nomeação para presidente da SAD de André Villas Boas. Pinto da Costa ficaria com chairman, e Villas Boas trataria de fazer as mudanças necessárias, uma espécie de revolução tranquila. Pinto da Costa não tem que tratar da sucessão, mas o presidente do FC Porto que vai acabar o mandato com 82 anos deve pensar nisso…
Não pensa fazer parte da sucessão?
Não, a minha vida é outra, mas não posso alhear-me da vida do clube. Se me pedirem ajuda, claro que tento encontrar a melhor solução. Mas nunca serei parte integrante dessa sucessão.
Acha que os sócios estão esclarecidos quanto à história das comissões ganhas pelo filho de Pinto da Costa na compra e venda de jogadores?
Acho que com a história dos Papéis do Panamá não vai ser no Dragão que se vão esconder esses negócios. Se calhar, antigamente era possível, agora não. A história das comissões tem duas formas de análise. Uma diz respeito à legalidade dos negócios, há empresas que servem porcos que hão-de virar chouriços. O porco não ganha nada com isso, mas transforma-se em enchidos. Depois há os negócios de imobiliário, de artistas, de modelos, já fiz parte de uma agência, em que os intermediários ganham a sua comissão, o cachê pelo que vendem. Outra coisa é os negócios serem feitos por familiares, o que não é uma questão legal, mas sim ética. Se o presidente acha que negociar com o filho, o cunhado ou irmão de outro administrador é o mesmo do que negociar com o maior inimigo, é com ele. As pessoas são livres de acharem mal.
Quando vai ao Estádio do Dragão como é recebido?
Muito bem. Sou o sócio 4517, tenho um camarote, e encontro muitas pessoas que me dão os parabéns pelas minhas posições públicas.
Porque diz que Vítor Baía devia ter concorrido à liderança do clube?
Porque é o único que afirma que é preciso varrer tudo o que está no clube e que tem ideias próprias para a liderança. Eu não tenho. Sei, ou penso que sei, o que está mal, mas se fosse para lá não conseguiria fazer melhor. Para se criticar não é preciso saber como se faz melhor. Não concordo com o Vítor Baía que acha que se deve varrer com aquela gente toda, como não concordo com Pinto da Costa que acha que se deve manter toda a gente. Estou no meio caminho. Era fundamental que enquanto o presidente tem capacidade física e anímica para ensinar e comunicar a sua experiência devia nomear alguém mais novo para ficar à frente da SAD iluminado por ele. Quanto ao Vítor Baía, não está a ser bem aconselhado. O que diz não é da cabeça dele.
Porque acha que está a ser mal aconselhado?
Conheço-o há muitos anos. Relativamente a algumas das atitudes que tem tomado… ou ele mudou muito ou não está a dizer coisas da cabeça dele. É público que Vítor Baía foi muito mal aconselhado nos seus negócios, nomeadamente no hotel de Évora. Não sei se são os mesmos, não devem ser, mas está a ser muito mal aconselhado neste dossiê do Porto.
Pinto da Costa também não foi o melhor exemplo de sucesso empresarial, fora do FC Porto.
Dizendo uma brincadeira, parece que Pinto da Costa quando chegou ao FC Porto ficou com pouco tempo para tratar dos seus negócios. Fico muito mais preocupado com quem antes de ir para o clube já está a falhar nos seus negócios, se tem todo o tempo do mundo para se dedicar aos mesmos e falha…
Há 16 anos também dizia que não podia ter a pretensão de ocupar cargos públicos ou mesmo no FC Porto enquanto não tivesse a sua situação financeira confortável.
Dizia isso como desculpa, mas não chegou esse momento e nem vai chegar porque não tenho essa ambição. Não quero ir para nenhum sítio público ou para o clube precisando desse dinheiro para viver. É certo que há 16 anos os dirigentes não eram remunerados e hoje ganham, sem prémios, 300 mil euros por ano, algo que não consigo na minha atividade profissional. Até ficava melhor, mas é fundamental ter vocação para serviço público e eu não tenho. Quanto ao clube, não se ganha mal, mas não vou também.
Conhece Pinto da Costa há muitos anos. É verdade que andou consigo ao colo?
Ele era vizinho dos meus pais na Rua Conde Abranches, no Porto, e, portanto, é possível que tenha andado comigo ao colo. De qualquer forma era um colinho muito diferente do que o Benfica tem agora (risos). O primeiro jogo do Porto a que assisti foi ele que me levou com o filho, sobrinhos e primos. O Porto tinha o estádio interdito e fomos todos a Coimbra. Na altura era chefe do departamento de futebol.
Continua convencido que Pinto da Costa é a melhor pessoa para dar a volta ao que está mal?
Não há outra. Acho que a idade ideal para alguém se candidatar a presidente é aos 40, como o fez Pinto da Costa aos 44. Já não é um jovem para andar aos berros, também não é um reformado e é alguém que pode fazer carreira. Quem é que eu vejo nessas condições? É o André Villas Boas que podia esquecer essa mania de ser treinador. Não vejo ninguém com melhor perfil, embora preferisse que ele entrasse pela mão do presidente.
Neste momento o que faz, além de ser o maior feirante em atividade, como gosta de dizer?
Sou diretor de uma revista de têxteis, a T, que faço com o meu amigo Jorge Fiel. Organizo feiras, no mundo inteiro, na área da indústria têxtil com várias vertentes: decoração, desportiva, militar, automóvel, construção civil, saúde. Neste ano vamos estar em mais de 70 feiras representando mais de 200 empresas. Depois também tenho uma empresa que organiza eventos ligados à moda, gastronomia e aos vinhos.
Sempre foi um dos rostos da “guerra” Norte-Sul. Na moda está no Portugal Fashion contra a Modalisboa. Acha que é prejudicado por só ser associado ao Norte?
Se perco, não dou ou não quero dar por isso, porque a razão é boa, mas não sinto que perca. Quanto à moda, na altura em que Carlos Tavares foi ministro tentou impor que as duas se juntassem, passando a haver a Portugal Fashion Week. Haveria dois desfiles, um em Lisboa e outro no Porto, na apresentação das diferentes coleções. Como as revistas de moda diziam que a ModaLisboa era mais relevante, estes recusaram a ideia. Com a saída do ministro, a ideia morreu. Agora, apesar de já não fazer parte da organização, mas ainda ando por lá, sei que a ModaLisboa quis ressuscitar a ideia, até porque a sua importância é muito inferior ao Portugal Fashion, quer a nível nacional como internacional. Parece-me que agora quem não quer são os responsáveis da Associação Nacional de Jovens Empresários (ANJE) que organizam o Portugal Fashion. Compreendo que agora eles não queiram.
Há 16 anos defendia que as vozes do Porto eram Pinto da Costa, Fernando Gomes e Ludgero Marques? Acha que faz sentido tanto tempo depois ainda existir essa “guerra”?
Nunca disse que a guerra era entre Lisboa e Porto. Dizia é que era entre o Porto e o resto do país e a macrocefalia lisboeta. O mais engraçado é que essa massa nem era originária da capital, mas quando chegava a Lisboa punham os óculos do Sul. Eram os piores. Já vivi oito anos em Lisboa e quando andei na Católica fazia-me imensa impressão que num grupo de 200, 160 eram do eixo Lisboa-Cascais e a maioria nunca tinha ido ao Porto nem sabia quantos quilómetros distavam as duas cidades. Isso chocava-me, mas o problema era deles. Hoje é ao contrário, só vejo pessoas de Lisboa dizerem que o Porto é que está a dar. É a noite, os restaurantes, etc. A guerra hoje não faz sentido nenhum. O que existe é um país inteiro que trabalha e faz os descontos e depois é em Lisboa que se decide onde é que se gasta esse dinheiro. E isso é que não pode ser.
Nasceu no Porto, em 1959, mas veio para Lisboa muito novo quando o seu pai foi para Angola.
Fiz a segunda e a terceira classe no colégio Avé Maria e depois voltei para fazer a universidade na Católica, porque não havia curso de Direito no Porto
Nessa segunda vez fez-se sócio por correspondência do Benfica.
Sim, como tinha amigos de Alcobaça que eram benfiquistas ia muito ao futebol e chateava-me ter de entrar com um cartão que não era meu. Como o sócio por correspondência pagava uma ninharia, acabei por ver muitos jogos do Porto, Guimarães e da Seleção, entre outros, com esse cartão, apesar de só dar direito a quatro partidas. Mas, atenção, que nunca deixei de ser sócio do Porto com as quotas em dia. Até há uma história engraçada. O presidente do Benfica era o Fernando Martins que se dava muito bem com o Porto que uma vez fez um jogo internacional no estádio da Luz por causa de o estádio da Antas estar interdito. E lá fui ver o meu Porto com o cartão do Benfica. Quando saí de Lisboa deixei de pagar as quotas. Mas se bem se lembram, o Luís Filipe Vieira foi sócio do Porto e do Sporting e nunca percebi porquê…
Não consegue ser imparcial?
Não consigo, tomo sempre partido, mas não acho que seja um defeito.
As doenças perseguiram-no em criança.
Sim, apanhei uma hepatite, pois quando vivia com o meu padrinho ele dava-me todos os dias duas gemas de ovo, durante dois anos, deu-me cabo do fígado – deve ter lido que fazia bem e não fez por mal, seguramente. Mas estive quase a morrer.
Acabou por abandonar a atividade política por causa dos estudos?
Sim, quando fui para a Universidade Católica desisti, mas no meu regresso ao Porto, e depois de ter abandonado a advocacia, e enquanto fazia o estágio no “Comércio do Porto”, convidaram-me para vice-presidente da comissão distrital do Porto do CDS, dizendo-me que o partido precisava de uma mudança. Expliquei-lhes que não era filiado e que era muito crítico em relação a Basílio Horta, Freitas do Amaral e Adriano Moreira. Disseram-me que não fazia mal, mas pensei que era melhor revelar publicamente o meu pensamento antes de assumir o cargo, já que a lista era única e seria eleito naturalmente. Publiquei então um artigo no “Público” com o título “Os lobos já não dançam” onde desancava de alto abaixo o partido. Como o artigo saiu no dia no Conselho Nacional do CDS, contaram-me que o Basílio Horta apareceu aos gritos a querer expulsar-me do partido, até que perceberam que eu não era filiado… Foi uma risota total.
Sendo filho de um homem conservador e tendo tido uma educação católica o que pensa do aborto, da eutanásia e dos casamentos gays?
Acho que a lei do aborto está muito bem assim. Não é preciso mais nem menos.
Quanto ao casamento gay, não tenho nada contra as uniões de casais do mesmo sexo. Não tem mal nenhum, Sou é contra o nome casamento, pois os casais heterossexuais, por exemplo, que vivem em união de facto não são casados, nem querem esse nome. O casamento é entre pessoas de sexo diferente. Eu se fosse gay, que não sou, não queria casar. Quanto à eutanásia, tive muitas discussões com o meu pai, mas concordávamos que não se deve prolongar a vida artificialmente. Não faz sentido uma pessoa prolongar a vida por estar ligado a uma máquina.
Nunca mais recebeu ameaças de morte?
Não, as que recebi foram da IURD e do Scolari. Mas eram mais palhaçadas, nunca liguei muito a isso. Como agora não tenho telefone fixo, não atendo chamadas anónimas. Se a chamada for identificada, não há problema, pois apresento queixa e fica tudo resolvido.
Quem são hoje as grandes vozes do Norte?
O Pinto da Costa, na parte desportiva, o Rui Moreira pelo cargo que ocupa, obviamente que é uma voz importante, e em termos industriais o Paulo Nunes de Almeida.
Continua a achar que Fernando Gomes foi o melhor presidente da Câmara do Porto?
Sim, claro, até votei nele quando perdeu. Tive que pôr umas palas para votar PS, mas para os outros cargos votei PSD.
Por que razão os funcionários das suas empresas são todas mulheres?
Até 1992 trabalhei por conta de outrém, e descobri que os grandes conflitos aconteciam entre homens e mulheres ou entre novos e mais velhos. Desde essa altura que decidi que se algum dia tivesse funcionários só podiam ser homens ou só mulheres. Juntos dá muita confusão. Mas a área em que trabalho existem mais mulheres.
Qual é a importância das mulheres na sua vida?
É enorme porque há mulheres que já me acompanham profissionalmente há muitos anos. Na verdade, foram sempre elas que me ajudaram. Também agradeço a todas as mulheres com quem tive momentos afetivos. Não acho nada que as mulheres sejam burras ou chatas, são todas diferentes e ainda bem. Respeito-as muito. Não deixo que me mudem, mas eu também não as tento mudar.
Todas tentaram que emagrecesse?
Todas, a começar pela minha mãe que ainda hoje tenta. Estou a tomar uns comprimidos que ela pediu de joelhos para eu tomar, e eu tomo porque não me fazem mal nenhum.
Nunca se preocupou por não conseguir emagrecer?
Eu já fiz, durante alguns anos, uma dieta difícil. Sempre que ia para a neve, durante três semanas, com exceção dos sábados à noite, só comia legumes e fruta e só bebia chá e água. Não recomendo a ninguém porque é muito violento. Emagrecia 12 quilos e depois estava o resto do ano a recuperar um quilo por mês. Eu não sou magro, mas o meu peso, que não sei qual é porque não me peso, pouco variou nos últimos 10 anos.
Continua a ter uma relação especial com o Miguel Esteves Cardoso?
Sim, jantamos quase todos os meses. E está melhor porque ele está muito melhor de saúde o que é bom para todos. Mas também estou muito com o Rui Zink, de quem gosto muito.
Qual foi o melhor momento na comunicação social?
Na Noite da Má Língua, as crónicas da TSF e as primeiras no “Comércio do Porto” e agora o Prolongamento, embora gostasse mais da versão anterior.
Maus momentos na televisão?
Só no programa da Noite da Má Língua em que o Miguel Esteves Cardoso faltou.
Qual é o político que mais aprecia na atualidade, atendendo que há 16 anos elogiava Manuel Maria Carrilho por andar com uma apresentadora sexy?
(Risos). Gosto muito do Fernando Medina, primeiro porque é um portuense que está mostrar como se governa a Câmara de Lisboa, não tem manias, é muito acessível. Lá está: é do Porto.
Acha que as pessoas do Porto são melhores do que as de Lisboa?
Têm menos manias, mas não se pode generalizar. Há pessoas boas e más em ambas as cidades.
O que pensa hoje de Santana Lopes?
Simpatizo com ele, mas acho que cometeu um erro capital na vida, e não foi ser fotografado com um lenço na cabeça, mas sim ter aceite ser primeiro-ministro sem ter sido eleito. Acho que ele também pensa o mesmo. Foi muito marcante.
O que gostou de ver no cinema nos últimos anos?
O remake dos filmes portugueses O Pátio das Cantigas e o Leão da Estrela. Para o nosso meio, achei muito bom, além da Sara Matos ter estado fabulosa
Ainda sai à noite no Porto?
Sim, reconciliei-me com a noite porque agora começa a horas decentes. Podes ir jantar tranquilamente e a seguir vais a um bar e já tens bom ambiente bem cedo. Quem gosta de ficar até às tantas da manhã, segue em frente. Eu às três, quatro, já tenho a festa feita.