“ É sempre sensato olhar para a frente, mas é difícil contemplar mais longe do que se consegue enxergar.”
Winston Churchill
A utilização massiva dos drones, do ponto de vista militar e sobretudo civil, irá ou não transformar as sociedades contemporâneas em sociedades dependentes de uma dronização excessiva? Acabando essa utilização por se transformar em instrumentos aceleradores de mudanças que considero, no que diz respeito aos seus diversos impactos, que os mesmos têm de ser avaliados com a antecedência devida.
Só nos EUA, nos últimos anos foram investidos quase 7 mil milhões de euros em tecnologia para este segmento de aparelhos aéreos. As estimativas são claras. Nos próximos anos, em todo o mundo, poderemos vir a ter quase 20 mil novos aparelhos aéreos, enquanto drones, a voarem e a serem utilizados não só militarmente, mas sobretudo civilmente em todo o mundo. Imaginem como os nossos céus irão ficar. Céus nacionais e continentais e céu mundial global com um novo exército aéreo impessoal. Tal e qual uma nova “praga” ou nuvem aérea carregada de tecnologia de ponta, à solta, a mexer com as nossas vidas, nas nossas sociedades contemporâneas, com riscos e oportunidades que têm de ser devidamente ponderados. Com impactos diversos. Desde logo, de perda de privacidade, de perda de segurança e de nova navegabilidade a ter em conta. Impondo necessidades ao nível de um poder regulatório efetivo e de um quadro jurídico sólido das licenças para propriedade e utilização transparentes e seguras.
Existe já uma espécie de cultura e indústria da dronização. Que, como outras, enfatizam, muitas vezes em excesso, as grandes vantagens da dronização. Menos mortes humanas nas contendas militares, mais e melhores resultados para a atividade económica, etc., etc. Até vários dos defensores desta dronização das sociedades contemporâneas advogam os seus efeitos positivos para diversas outras atividades humanas clássicas, como a agricultura, a investigação aplicada a várias áreas do saber, o desporto em geral e o cinema.
Estes veículos aéreos não tripulados – VANT em versão portuguesa, ou internacionalmente unmanned aircraft vehicle (UAV) e unmanned aerial vehicle (UAV), ou ainda remotely piloted aircraft system (RPAS) – devem levar-nos a pensar, muito bem e a tempo, naquilo que queremos ou não que sejam os objetivos e os limites da sua utilização. Que não devem chocar com os nossos direitos, liberdades e garantias. Para não ficarmos prisioneiros da sua utilização obsessiva e excessiva. Que não devem chocar, nas nossas atuais sociedades, com os valores de vida essenciais para o nosso padrão de vida normal. A sua utilização sem regras claras num quadro jurídico alargado não pode nem deve ser feita, como infelizmente já sucedeu com várias outras matérias, a posteriori da ocorrência de falhas, perigos e exageros. Antes pelo contrário, tem de ser feita a priori e de forma concertada à escala mundial e continental. Colocar no ar milhares e milhares de aparelhos, com autonomia e sofisticação significativa, a vigiar as nossas vidas, os nossos direitos, liberdades e garantias, é algo de muito desafiante que poderá ter impactos negativos graves. Imaginando este novo exército de aparelhos aéreos a intrometerem-se por exemplo na nossa intimidade e liberdade individual e familiar não é algo de somenos importância. A cultura da dronização e o seu impacto na vida e na sociedade devem obrigar-nos a pensar a sério nisto tudo. Porque a dronização das sociedades contemporâneas poderá vir a transformar-se num pesadelo e num estilhaçar do nosso modo de vida.
Sejam drones civis ou militares, não deixam de ser aeronaves e instrumentos tecnológicos sofisticados que vão (já estão, aliás) condicionar as nossas vidas.
Julgo que existe muita gente distraída com a dronização da vida e da sociedade. Alguns acham mesmo que são objetos voadores inofensivos e para divertimento, tal e qual os carros telecomandados do passado. Nada de mais errado. Estamos a esgotar o tempo para regular os objetivos e os impactos da utilização massiva dos drones.
Penso não estar errado se afirmar que poucos de nós queremos viver num tempo, num mundo e numa sociedade em que, como cidadãos, temos a nossa liberdade e individualidade coartadas por estas máquinas. Por uma questão de princípio e de coerência de valores de vida, nunca deveremos ser permissivos com a fragilidade e limitação da nossa intimidade e liberdade. Bem como com a securitização das nossas vidas. Ainda por cima protagonizadas por máquinas impessoais. Esta é uma matéria que deverá merecer a prioridade de governos. Em nome da preservação da nossa privacidade, da nossa segurança, de uma regulação efetiva e de um quadro jurídico para a concessão de licenças, ao nível dos títulos de propriedade e de pilotagem.
É imperioso, por exemplo, o estabelecimento de rotas e estradas aéreas para os aparelhos utilizados enquanto drones, por forma a garantir a boa segurança e a boa liberdade de circulação, com rotas e estradas e caminhos aéreos que não coincidam com as rotas aéreas clássicas.
Escreve à segunda-feira