Cerca de 11 anos depois de ter saído da prisão, o ex-banqueiro e político Mario Conde voltou a ser preso durante a manhã desta segunda-feira. O ex-presidente do Banesto, Banco Espanhol de Crédito, é suspeito de ter repatriado dinheiro de que se apropriou no banco que foi chefiado por si. Mario Conde é aliás um dos rostos do caso mais longo da Justiça espanhola e também foi protagonistas de um dos negócios mais polémicos em Portugal.
O ex-banqueiro foi preso, pela primeira vez, em 1994, por gestão danosa no Banesto. Acabou por conseguir sair em liberdade condicional em 1999, depois de vários recursos que acabaram por permitir a redução da pena. Na altura em que foi afastado da administração do Banesco, o buraco financeiro que deixou atingia os 2700 milhões de euros, o que acabou por ditar uma intervenção do Banco de Espanha. Mas também em Portugal, Mario Conde foi notícia por causa de um dos negócios mais polémicos de sempre: a privatização do Banco Totta & Açores (BTA).
Com ligações a José Roquette, o Banesto conseguiu controlar o BTA com ajuda de mãos portuguesas. Segundo conta Mario Conde no livro “Banqueiros de Rapina”, a operação de privatização do BTA, nos meados da década de 90, não podia ter sido mais polémica já que, em apenas quatro anos, o Banesto e a Valores Ibéricos – empresa detida pelo banco espanhol em conjunto com José Roquette –, conseguiu controlar 50 por cento do BTA, que era, na altura, uma das instituições portuguesas mais importantes.
A sociedade Valores Ibéricos é criada em julho de 1989 e nasce de um acordo entre o Banesco e o grupo de José Roquette. O objetivo, de acordo com Mario Conde era claro: “O controlo do BTA era o objetivo do Banesto”.
Em 1991, Mario Conde, então presidente do Banesto, e José Roquette assinam o ‘pacto de La Salceda’. Roquette, segundo o livro de Mario Conde, comprometia-se a vender as suas participações no banco ao Banesto. E com esta operação tornava-se possível conseguir o objetivo: 68 700 milhões de pesetas para ficar com 50% do BTA.
Mas se até aqui tudo corria bem entre espanhóis e portugueses na conquista do Totta, em Maio de 1993 tudo muda quando o então governo de Cavaco Silva é informado da verdadeira participação do Banesto no capital do BTA.
Num almoço com José Roquette, Mario Conde, Roberto Mendonça e vice-presidente da J.P. Morgan, Braga de Macedo, o então ministro das Finanças, fica a saber que na verdade o Banesto tem 50% do BTA, sendo que, de acordo com a lei, uma quaquer entidade estrangeira só podia ter até 10% do capital de uma empresa financeira portuguesa.
Ainda de acordo com o livro que escreveu, Mario Conde desistiu então do objetivo que tinha de fusão entre o Banesto e o BTA. E é em julho de 1993 que o escândalo rebenta, depois de ser comunicado à imprensa portuguesa a real participação do Banesto no BTA. É António Champalimaud quem acaba por comprar o BTA, que mais tarde acaba por ser vendido ao Santander.
Na verdade, entre 1990 e 1993, Mário Conde comprou ações do BTA enquanto, nos bastidores, disputava o controlo à revelia do governo português. E a meta era clara: criar um grande banco ibérico.
Do êxito ao fracasso Na manhã de 29 de dezembro de 1993, Espanha desperta com uma notícia que ocupa todas as primeiras páginas dos jornais daquele país: o Banco de Espanha vai ter de resgatar o Banesto.
Mas antes disto, o percurso de Mario Conde era feito de sucessos. Estilo, educação e sucesso: era assim que falavam dele. Conhecido como um playboy das noites de Madrid, era um exemplo para muitos homens e uma tentação para a maioria das mulheres.
Chegou mesmo a ser ator de uma verdadeira novela que envolveu várias mulheres, maçons, figuras políticas e até secretas, que usava para espiar os rivais e recolher o máximo de informações que conseguia sobre os negócios em que se queria envolver.
A carreira de Mario Conde foi fulgurante. Com apenas 24 anos tornou-se procurador, com 39 presidente do Banesto; e com 46 foi destituído do cargo pelo Banco de Espanha. Acabou sentado no banco dos réus. Numa entrevista dada em 2008 à Vanity Fair Conde explicava: “O que separa o êxito do fracasso é a sorte. Nunca consegui assumir que trabalhei tanto para fracassar. O que significa alguém equivocar-se? É ter razão antes do tempo”. Para Mario Conde, a primeira vez que foi preso não foi uma surpresa: “Eu sabia que a prisão seria o episódio final. Esta novela não podia ser escrita sem esse capítulo. Numa história que conta um grande drama de poder está sempre a prisão”.
Vida de conde dá um filme Mario Conde acabou por ser protagonista de um documentário sobre parte da sua vida. O trabalho começa com a aquisição em leilão de uma enorme mesa em madeira maciça que Mario Conde mandou construir durante os tempos de glória. Entre os temas abordados no documentário, está o tempo que passou na prisão, a morte do pai e da primeira mulher, Lourdes Arroyo, e ainda a sensação de estar no auge do sucesso profissional.
Lourdes morreu de cancro pouco tempo depois de Conde ter saído da prisão. Em outubro de 2015, a braços com rumores de separação de Maria Pérez-Ugena Corominas, Mario Conde decidiu recordar publicamente quem “foi o amor de uma vida”.
Já numa entrevista, dada um ano depois da morte de Lourdes, Mario Conde explicava que “ninguém tocou em nada do que era dela. A roupa ainda está nos armários”. Por esta altura, explicava ainda que tinha criado uma fundação com o nome de Lourdes Arroyo para promover a ajuda emocional tanto aos doentes de cancro como a quem os rodeia: “Os direitos dos meus livros são para a fundação”.
A nova queda Agora, anos depois de ter sido preso, Mario Conde voltou a ser detido esta segunda-feira pela Guarda Cívil Espanhola. De acordo com o jornal “El Mundo”, a “Operação Fénix” começou logo de manhã com buscas em casas e sociedades que alegadamente foram criadas pelo ex-banqueiro para esconder os lucros que teve com o dinheiro que tirou do Banesto, no caso que ficou conhecido em 1993 e que o levou à prisão.
Mas a publicação dá ainda conta de mais detenções. Nesta operação foram detidas mais seis pessoas, entre as quais estão os dois filhos de Mario Conde, Mario e Alejandra Conde Arroyo, bem como o genro do ex-banqueiro, Fernando Guash Vega-Penichet, que atualmente é diretor-geral da CaixaBI, unidade espanhola do banco de investimentos da Caixa Geral de Depósitos.