“ Não devemos subestimar ninguém. Ironicamente, até eu já fui um dos que foram subestimados e inverti o jogo, tornando-me campeão do mundo.”
Nelson Évora
José Manuel Durão Barroso foi o português que mais e melhor se destacou, na Europa e no mundo, no exercício de funções políticas e públicas. Enquanto presidente da Comissão Europeia, durante dez anos liderou a Europa, num tempo histórico e desafiante para o projeto europeu, com problemas muito difíceis de ultrapassar e com a persistente obsessão de vários países de nacionalizarem os sucessos europeus e de europeizarem os seus insucessos.
Europeísta convicto mas realista com provas dadas, José Manuel Durão Barroso, ou José Barroso (para os europeus), teve no magistério europeu de lidar com crises como da Grécia e de outros países como a Irlanda, Portugal e Espanha, no que diz respeito às suas contas públicas, bem como com a complexa crise do confronto ucraniano com a Rússia e também com a complexa gestão dos conflitos militares no Médio Oriente, que são os “pais” da atual crise migratória e de refugiados.
Para além destas matérias mais complexas e mediáticas, teve de liderar a Europa num conjunto de reformas políticas, económicas e sociais muito significativas no que diz respeito ao aprofundamento e alargamento do projeto europeu. Nos dez anos de liderança europeia do português José Barroso, foram vários os países que aderiram à União Europeia.
Mas para além de tudo isto, apesar das crises, dos avanços e dos recuos do projeto europeu, por exemplo na sua política externa, a Europa, num mundo complexo, aprofundou a sua influência em dossiês relevantes e continua a condicionar (há quem diga demais) a normativização de várias matérias relevantes da comunidade internacional. Aliás, enquanto ainda potência normativa do mundo, a Europa, nos últimos dez anos, marcou vários pontos em dossiês relevantes, como as alterações climáticas e o comércio internacional.
Sempre, no exercício destas funções de liderança europeia, Durão Barroso nunca se esqueceu de que era (é) português. Antes pelo contrário. Sem que isso o menosprezasse ou condicionasse, nunca o escondeu e sempre que pôde exibiu-o com orgulho. Não só por ser português. Mas também e sobretudo pelo que significa Portugal e os portugueses para o mundo, ao longo da sua rica e valiosa história, como povo e como língua e cultura de ligação entre povos e culturas dos vários continentes. Sempre que pôde, de forma certeira, fez questão de o enfatizar. A par de protagonistas como Cristiano Ronaldo e José Mourinho, Durão Barroso foi durante todos estes anos um grande e excelente embaixador de Portugal, da sua história, da sua língua e da sua cultura, pela Europa e pelo mundo.
E foi, como a história, estou certo, se encarregará de forma imparcial de o demonstrar, um líder europeu que ajudou e muito um país como Portugal, sobretudo em dossiês muito difíceis, como o da intervenção externa por via da troika. A Europa e o projeto europeu, com Durão Barroso, apesar de várias crises derivadas do seu alargamento e crescimento, avançaram. Só uma pessoa com a sua preparação e visão é que teria a paciência e a inteligência para lidar com egoísmos nacionais antagónicos e com personalidades difíceis como Sarkozy, Merkel, Cameron, Tsipras e outros. Só a sua preparação diplomática superior o permitiu.
Nós, portugueses, provavelmente durante muitos anos não voltaremos a ter ninguém a exercer funções como Durão Barroso exerceu. Também por isso estamos empenhados em que António Guterres vença a corrida para secretário-geral das Nações Unidas. Durão Barroso, ex-secretário de Estado, ex-ministro, ex-primeiro–ministro e ex-presidente da Comissão Europeia, é um ativo da Europa num mundo cheio de desafios e problemas. E é português. Um dos melhores de todos nós. Temos de o saber utilizar em benefício do nosso país e do nosso povo e até da família CPLP, onde tem grande prestigio.
Tive durante anos a grata possibilidade de trabalhar com ele, fora e dentro do seu governo. Mantenho a mesma opinião de sempre. Um ser superior. Servidor público de excelência. Um intelectual com uma visão pragmática da vida pública e política. Amigo do seu amigo. Um homem de equipas sólidas e perenes. São quase nenhuns os que trabalharam próximos dele com quem não se dá. Em tempos em que a ingratidão, a inveja e a intriga campeiam, julgo ser justo que se enalteça a sua figura. E já agora, eu e muitos registámos que o seu partido político, o PSD, realizou um congresso em Espinho, fez homenagens (umas mais mediáticas do que outras) e, tendo sido o primeiro congresso após a saída das funções de Durão Barroso da liderança europeia, nem uma palavra lhe foi dedicada. Registo. Registamos. Para mais tarde recordarmos.
Escreve à segunda-feira