Encher centenas de milhares de quadrículas. Quando acabar, voltar ao início. Uma. Duas. Dez vezes. As vezes que forem precisas, aliás.
Cantar. Ou melhor, desfiar a lengalenga. 1×1, 1. 1×2, 2. 1×3, 3. Com um tom de voz monocórdico, que o ritmo é meio caminho andado para decorar o conteúdo. E a união faz a força: em grupo, funciona melhor. Passar da tabuada do um para a do dois, subir até ao dez e voltar ao início. Múltiplas vezes, claro, que a máxima “água mole em pedra dura tanto bate até que fura” é para seguir.
Usar um lápis com a tabuada à volta, impressa na madeira. Resultado deste método? O conhecimento não passará, nunca, de cábula. Ou optar pela Tabuada Escolar do Ratinho, de Alfredo Cabral, que marcou várias gerações. O livrinho, com cerca de 30 páginas, era a ”sebenta” que não faltava em nenhuma mochila, ao lado do Um Bongo ou de um Ucal, no caso das gerações que andarão agora pelos intas.
Hoje, além dos métodos mais tradicionais, há uma miríade de ferramentas disponibilizadas pelas novas tecnologias. Atualmente, os miúdos estão mais familiarizados, por exemplo, com a Tabuada do Dino, um jogo educativo online em que a personagem – um dinossauro, pois – ajuda à aprendizagem. Há ainda as canções didáticas da Maria Vasconcelos (a anos-luz das velhas ladainhas), as cartas do Super Matemático e outras apps ou jogos como o Multipli, este último certificado pela Sociedade Portuguesa de Matemática.
Os métodos diferem. E os resultados, aparentemente, também. Caso pergunte a alguém, aleatoriamente, a tabuada, verá que a probabilidade de uma pessoa que completou o primeiro ciclo há mais de 30 anos responder corretamente será superior do que o contrário. Será que há, portanto, métodos que funcionam melhor do que outros?
Olga Carapeto, professora do primeiro ciclo há 12 anos, diz que cada professor acaba por escolher o método que considera mais adequado para ensinar a tabuada. “A escolha do método acaba por ser um pouco também a forma como o professor aprendeu, misturada com novas abordagens decorrentes da investigação de cada um”, considera.
Desde 2004, Olga tem sido colocada sucessivamente em diferentes escolas. O ano passado esteve por Lisboa e, atualmente, leciona na Escola José Tagarro, no Cartaxo. Entre as mudanças, foi-se deparando com diferentes opiniões sobre a melhor maneira de aprender a tabuada. “Há professores que acham que é essencial que os alunos decorem primeiro. Eu acho que é mais importante que percebam e que só posteriormente decorem”, explicou ao i. No entanto, há um ponto sagrado para esta profissional: “Independentemente do caminho, o essencial é que os alunos não saiam do primeiro ciclo sem saberem a tabuada de cor”.
No entanto, admite que há gerações que sabem melhor a tabuada do que outras. “Julgo que tem a ver com várias coisas. Primeiro, com o facto de os alunos irem à escola por gosto. Hoje há muitos que estão ali obrigados e acabam por passar esse estado de espírito aos outros.”
Depois, Olga considera que o próprio olhar dos pais foi mudando. “Sinto que muitas escolas, hoje, são encaradas como um ATL, um sítio onde as crianças são despejadas e não um local onde se privilegia o conhecimento. Até a forma como os professores eram olhados anteriormente – não fazendo da classe um suprassumo, obviamente –, era diferente, mais proveitosa”, lamenta. Por exemplo, há pouco tempo, a professora ouviu, enquanto esperava numa fila, uma conversa entre alguns pais sobre a necessidade de saber a tabuada. “Estavam a comentar que não iam obrigar os filhos a decorar a tabuada ou pressioná-los a estudar porque depois iam ter a calculadora para realizar todas as operações. Isto mostra que as pessoas não têm noção de como a tabuada é importante na aprendizagem de outros conceitos da matemática que as crianças aprendem no futuro, como as frações ou o denominador comum. Além disso, é uma mais-valia necessária às crianças no seu dia-a-dia. Por exemplo, para saberem quanto vão pagar caso comprem alguns gelados ou o que for”, resume. No entanto, além desta “descrença” na tabuada, há outra diferença no ensino que é fulcral para a professora na hora de pensar sobre o tema: a quantidade de temas e conteúdos que os alunos hoje apreendem é muito superior comparativamente com os antigos programas escolares.
Do oito ao oitenta “Passou-se do ler, escrever e contar para um nível de metas e conteúdos superior ao desejável, visto que os professores não têm tempo de consolidar a matéria”, explica. “Todos os anos temos um número mais elevado de alunos e metas que não são compatíveis com as horas necessárias para o fazer bem”, conclui.
Questionada se os seus alunos do terceiro ano vão, daqui a 15 anos, saber ou não a tabuada de cor, a professora responde com uma gargalhada. “Não sei, espero que sim. Mas é como tudo, se não se pratica, vamos esquecendo.”
Seja qual tenha sido o método pelo qual aprendeu, esta pode ser uma boa altura para testar a memória. 9×7?