Para que serve um congresso?


2016 parece ser um bom ano para congressos partidários, há-os para todos os gostos.


2016 parece ser um bom ano para congressos partidários, há-os para todos os gostos: em primor com o CDS, pós-quaresmal como o do PSD, estival a 4 e 5 de junho no caso do PS, pré-natalício de 2 a 4 de dezembro para o PCP e na versão “convenção prevista para finais de 2016” no caso do Bloco de Esquerda e que ontem foi antecipada para 2 e 3 de julho, evitando a proximidade temporal com o congresso do PCP. 

Em nome da democracia, os partidos mais sábios decidiram subtrair aos congressos qualquer dimensão de suspense e apostam na eleição direta dos respetivos líderes. Fenómenos como o da rodagem do Citroën BX de Cavaco tornaram–se impossíveis no PSD e no PS. Ungidos pela democracia direta, os líderes chegam aos congressos partidários com a garantia de que de lá sairão líderes. 

No caso do CDS, e imagino que também no do PCP, há ainda respeito pelas tradições e os congressos são, formalmente, eletivos das lideranças. Mas mesmo quando as lideranças mudam durante o congresso, coisa que se tornou mais rara no CDS do que no PCP, a mudança também é anunciada antecipadamente e os militantes são poupados ao stresse emocional inerente a uma votação competitiva. Foi assim com o cuidado posto por Paulo Portas, garantindo que não haveria mais do que um candidato à sua sucessão. Tem sido assim pelas bandas do PCP, sendo claros os sinais de que Jerónimo de Sousa já não será secretário-geral em 2017.

Do ponto de vista da inovação, o Bloco, fazendo jus à sua juventude, tem mantido a dianteira. Face ao risco de regresso às origens e da correspondente balcanização, optou pela liderança bicéfala, transformada mais tarde em unicidade da porta-voz. Mal ousamos respirar até à realização da x Convenção para conhecermos mais um contributo bloquista para a história dos partidos políticos em Portugal.

Se as eleições diretas e as sucessões dinásticas retiraram emoção aos congressos partidários, é legítimo perguntar para que servem? Se já não há atividade económica primária de extração de votos aos militantes através dos caciques locais e atividade económica secundária de transformação desses votos pelos barões partidários, o que é que se passa nos congressos? Há uma enorme atividade económica terciária, centrada nos serviços político-comunicacionais.

Os congressos tornaram-se um produto televisionado por onde desfilam políticos, comentadores, políticos-comentadores, comentadores-políticos, paineleiros e outras pessoas sem estudos que habitam em estúdios de televisão e procuram vender o congresso do dia como outros tentam vender Calcitrin ou, como no tempo dos verdadeiros congressos partidários, tentavam vender pulseiras Tucson.

A multiplicação dos canais televisivos ditos informativos encontra nos congressos partidários uma forma barata de preencher durante três dias a grelha de programação, dando descanso aos leitores de teleponto nos estúdios e assegurando os mínimos de presença popular através do estender de microfone aos militantes anónimos. No coração de todos os telespetadores está sepulta a dor inerente à quase desaparição dos espontâneos que, como nas touradas, asseguravam a comunicação entre os mortais e os deuses. Mesmo Tino de Rans, o mais celebrado, se profissionalizou.

A teoria geral dos congressos partidários aplica-se também ao que hoje começa. Passos sairá do congresso como entrou, formalmente coroado como presidente do partido. Mas será uma coroa de Espinho e sem quaisquer garantias de ressurreição.
    
Escreve à sexta-feira


Para que serve um congresso?


2016 parece ser um bom ano para congressos partidários, há-os para todos os gostos.


2016 parece ser um bom ano para congressos partidários, há-os para todos os gostos: em primor com o CDS, pós-quaresmal como o do PSD, estival a 4 e 5 de junho no caso do PS, pré-natalício de 2 a 4 de dezembro para o PCP e na versão “convenção prevista para finais de 2016” no caso do Bloco de Esquerda e que ontem foi antecipada para 2 e 3 de julho, evitando a proximidade temporal com o congresso do PCP. 

Em nome da democracia, os partidos mais sábios decidiram subtrair aos congressos qualquer dimensão de suspense e apostam na eleição direta dos respetivos líderes. Fenómenos como o da rodagem do Citroën BX de Cavaco tornaram–se impossíveis no PSD e no PS. Ungidos pela democracia direta, os líderes chegam aos congressos partidários com a garantia de que de lá sairão líderes. 

No caso do CDS, e imagino que também no do PCP, há ainda respeito pelas tradições e os congressos são, formalmente, eletivos das lideranças. Mas mesmo quando as lideranças mudam durante o congresso, coisa que se tornou mais rara no CDS do que no PCP, a mudança também é anunciada antecipadamente e os militantes são poupados ao stresse emocional inerente a uma votação competitiva. Foi assim com o cuidado posto por Paulo Portas, garantindo que não haveria mais do que um candidato à sua sucessão. Tem sido assim pelas bandas do PCP, sendo claros os sinais de que Jerónimo de Sousa já não será secretário-geral em 2017.

Do ponto de vista da inovação, o Bloco, fazendo jus à sua juventude, tem mantido a dianteira. Face ao risco de regresso às origens e da correspondente balcanização, optou pela liderança bicéfala, transformada mais tarde em unicidade da porta-voz. Mal ousamos respirar até à realização da x Convenção para conhecermos mais um contributo bloquista para a história dos partidos políticos em Portugal.

Se as eleições diretas e as sucessões dinásticas retiraram emoção aos congressos partidários, é legítimo perguntar para que servem? Se já não há atividade económica primária de extração de votos aos militantes através dos caciques locais e atividade económica secundária de transformação desses votos pelos barões partidários, o que é que se passa nos congressos? Há uma enorme atividade económica terciária, centrada nos serviços político-comunicacionais.

Os congressos tornaram-se um produto televisionado por onde desfilam políticos, comentadores, políticos-comentadores, comentadores-políticos, paineleiros e outras pessoas sem estudos que habitam em estúdios de televisão e procuram vender o congresso do dia como outros tentam vender Calcitrin ou, como no tempo dos verdadeiros congressos partidários, tentavam vender pulseiras Tucson.

A multiplicação dos canais televisivos ditos informativos encontra nos congressos partidários uma forma barata de preencher durante três dias a grelha de programação, dando descanso aos leitores de teleponto nos estúdios e assegurando os mínimos de presença popular através do estender de microfone aos militantes anónimos. No coração de todos os telespetadores está sepulta a dor inerente à quase desaparição dos espontâneos que, como nas touradas, asseguravam a comunicação entre os mortais e os deuses. Mesmo Tino de Rans, o mais celebrado, se profissionalizou.

A teoria geral dos congressos partidários aplica-se também ao que hoje começa. Passos sairá do congresso como entrou, formalmente coroado como presidente do partido. Mas será uma coroa de Espinho e sem quaisquer garantias de ressurreição.
    
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