Mas a corrupção, o ato de corrupção passiva, fica só circunscrita ao que vem determinado no artigo 373 do Código Penal, que no seu número 1 refere que o funcionário que por si, ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiros, vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua promessa, para prática de um qualquer ato ou omissão contrários aos deveres do cargo, ainda que anteriores àquela solicitação ou aceitação, é punido com pena de prisão?
Envelhecer é um processo biológico natural e, portanto, inevitável; porém, há quem não conviva bem com o fenómeno e fuja dele, cultivando uma espécie de catarse diária em relação aos longínquos devaneios juvenis.
Vão apedrejando os distraídos com calhaus de perentória retórica com uma convicção que nunca sustentaram para nada na vida.
Vem esta treta a propósito dos acontecimentos em redor dos pretensos atos de corrupção e benefícios facultados às empresas Odebrecht e Petrobras, entre outras, em troca de subornos, que envolvem políticos brasileiros, e dos vários casos desde o Mensalão ao Lava Jato.
Importa recordar que Dilma Rousseff não está indiciada de coisa nenhuma e que Lula da Silva é referido, coisa diferente de ser investigado, e muito menos acusado, em quatro processos.
Mas isso é coisa pequenina e sem importância para os mosqueteiros da moral e do bem zurzir em tudo o que lhes pareça de esquerda, com a mesma tolerante bonomia com que transigem com os “deslizes” e “distrações” praticados pelos patrões, eternos donos disto tudo.
Como não é nada, para estes velhos rasurados, cheios de ardor justicialista, arrebatamentos de outros tempos, que o juiz Moro, responsável pela investigação, tenha violado a lei e extrapolado os limites do cargo ao divulgar as escutas da presidente, que deveriam ter ficado em sigilo, ou que participe nas manifestações de rua a pedir o impeachment de Dilma, palavra inglesa, fina, para elite usar.
E também sem importância para estes profissionais da carteira que venha agora o PMDB abandonar o executivo, determinando que todos os seus membros com cargos no governo os entreguem, com uma exceção: que o presidente do PMDB, que é o vice- presidente, mantenha o cargo.
Porque, numa lógica em tudo idêntica à acusação das habilidades de Dilma para proteger Lula, no caso de destituição, Michel Temer, vice-presidente do Brasil, assumiria o cargo de Dilma.
O Brasil está dividido, vivem-se momentos de alta tensão, existe um conflito entre o poder executivo e o poder judiciário. Lula está acossado e, com ele, toda a esquerda brasileira.
Pode-se dar-lhe o nome que se entender, mas o que deseja e aquilo por que luta a direita brasileira e a parte da sociedade que a apoia é recuperar o poder perdido nas urnas.
Aquilo a que se assiste por estes dias é à luta de classes, luta pura e simples pelo poder, substituindo o processo democrático por artifícios jurídicos que, independente da sua validade e razão, objetivamente promovem uma alteração dramática do poder outorgado pelo voto popular.
Manifesta-se de diversas formas. Circunscrevê-la exclusivamente, no campo ético e moral, politico, cultural e histórico, à mera permuta de favores em troca de bens materiais é redutor, não acaba com a corrupção e deixa escapar o corruptor.
Se é verdade que, hoje, o que politicamente se passa no Brasil não se pode só explicar com a crise capitalista e a reação dos poderosos, que até há pouco diziam “preferir o cheiro a cavalo ao cheiro do povo”, não é menos verdade e não é preciso ser um cientista para perceber que em torno de uma profunda crise moral e de valores de um país subdesenvolvido e desigual, governado há 500 anos por coronéis e nababos, com uma corrupção institucionalizada, venham agora os mesmos que até há pouco operavam na corrupção liderar, animar e organizar um assalto golpista em nome da sua “pureza democrática”.
A corrupção é muito mais que um ponto final parágrafo, e no coro dos golpistas têm sempre lugar as vozes dos fariseus e dos imbecis – não chegam ao céu, mas provocam ruído.
“Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque sois semelhantes aos sepulcros caiados, que por fora se mostram belos, mas interiormente estão cheios de ossos de mortos e de toda a imundícia! Assim também vós exteriormente pareceis justos aos homens, mas, por dentro, estais cheios de hipocrisia e de iniqüidade.” (Mt 23. 27-28)