Refugiados. Os trolhas do muro europeu

Refugiados. Os trolhas do muro europeu


Há os que temem muçulmanos, quem veja um exército a caminho da Europa e os hipocondríacos regionais, para além dos que consideram um campo de refugiados na Turquia um asilo perfeitamente aceitável. Uns na linha da frente, outros no importante jogo de bastidores – eis algumas das figuras que mais influências movem na UE para…


Milos Zeman

Presidente da República Checa

Entre os vários líderes europeus que desejam impedir a chegada de refugiados, o checo Milos Zeman assume uma posição original. O veterano de 71 anos não entra na discussão que tenta filtrar refugiados de migrantes económicos – aqueles que largam uma vida aceitável no país de origem só para enriquecer às custas dos estados sociais europeus. E não entra porque parece não acreditar que haja alguém a fugir da violência: “Estou profundamente convencido que estamos a enfrentar uma invasão organizada e não um movimento espontâneo de refugiados”, declarou em dezembro. O seu país recusa o sistema de quotas e é um dos que ameaçam a sobrevivência de Schengen com o controlo de fronteiras, mas Zeman não ignora os refugiados e até tem uma missão para eles: “Uma grande maioria dos ilegais são jovens saudáveis e solteiros. Pergunto porque estes homens não pegam em armas para lutar pela liberdade dos seus países contra o Estado Islâmico”. 

Johanna Mikl-Leitner

Ministra austríaca do Interior

Quando Angela Merkel assumiu a liderança de uma política de integração e acolhimento na Europa, a Áustria tornou-se a última etapa da rota dos Balcãs para os milhares de refugiados que durante meses alimentaram a esperança de chegar a solo germânico. Se o chanceler Werner Faymann sugeriu que o vizinho alemão “devia introduzir uma quota diária e trazer diretamente os refugiados da Grécia, Turquia ou Jordânia”, Johanna Mikl-Leitner passou de ministra do Interior para uma geografia bem mais alargada, que chega à rede de transportes públicos de Cabul – sim, a capital do Afeganistão. É lá que os autocarros têm, desde o início do mês, anúncios com o selo do Governo austríaco a avisar que o país “não dará asilo por razões económicas”. Para os teimosos que ignorem o marketing há mais medidas, como a vala construída na fronteira com a Eslováquia ou a suspensão do espaço Schengen.  

Lars Lokke Rasmussen

Primeiro-ministro da Dinamarca

A geringonça dinamarquesa deu-se em junho do ano passado, mas à direita do centro. Lars Lokke Rasmussen foi apenas o terceiro classificado mas foi até ao fim na promessa de afastar a então primeira-ministra social-democrata, Helle Thorning-Schmidt. Com apenas 34 deputados, Rasmussen teve de aceitar a aliança com o Partido Popular Dinamarquês, cujo radicalismo impediu que liderasse a coligação, apesar de ter sido o mais votado à direita. E a influência ideológica não se fez esperar: um dos Estados-membros que mais asilos tinha autorizado (o 4.º em proporção com a população) anunciava o corte de 45% nos subsídios atribuídos a quem recebeu autorização de asilo. Medida que quase passou despercebida entre a polémica causada pela decisão de revistar todos os que entram no país de modo a confiscar todos os bens superiores a 10 mil coroas dinamarquesas – ou pouco mais de 1300 euros. Hostil? Nada, até porque o primeiro-ministro Rasmussen fez lóbi para excluir as alianças e outros objetos de valor sentimental da lista de valores a confiscar.

Theresa may

Ministra britânica do Interior

Este é um caso particular, já que o Reino Unido e o governo de Theresa May não está obrigado a cumprir as diretrizes europeias sobre o tema, graças a um estatuto de exceção – que, por exemplo, sempre excluiu o país do espaço Schengen – muito mais antigo do que a atual renegociação imposta por David Cameron. Dirigente conservadora de 60 anos, a atual ministra britânica do Interior faz provavelmente parte da geração que se fartou de emigrantes graças ao meio milhão de pessoas que chegaram ao país após a adesão europeia da Polónia, agora um aliado na resistência aos refugiados. May admite que “há uma grande diferença entre uma família de jovens sírios que fogem da tirania de Assad e do Estado Islâmico e um estudante que solicita asilo porque ficou sem saldo no cartão de crédito”. E sem forma de fazer a filtragem, May já tem a sua própria: segundo a ministra os refugiados que conseguiram chegar à Grã-Bretanha ou ficaram retidos em Calais – cidade francesa do outro lado do Canal da Mancha onde há meses estão milhares de refugiados em condições precárias – “são os mais fortes e ricos”. 

Robert Fico

Primeiro-ministro da Eslováquia

Nem o discurso anti refugiados impediu Robert Fico de sentir nas urnas o desgaste de uma década de governação. Mas a perda de maioria nas eleições do início do mês não o deve afastar da liderança do governo e no segundo semestre do ano acumulará as funções com a presidência rotativa do Conselho Europeu. Adivinham-se mais horas difíceis para o grego Alexis Tsipras, já que Fico tem sido dos mais críticos face à incapacidade grega de controlar as fronteiras de formas a impedir as chegadas da Turquia. “Não queremos muçulmanos” disse em campanha o primeiro-ministro que promete não dar asilo nem a um crente da fé islâmica. Foi também o chefe de governo da Eslováquia, eleito por um partido do centro-esquerda, que levou para o Tribunal de Justiça europeu o sistema de quotas que acordara com os restantes 27 líderes da EU.

Mark Rutte

Primeiro-ministro da Holanda

Tal como o polémico Viktor Orban, o holandês Mark Rutte considera que a partir do momento em que um sírio consegue atravessar a fronteira com a Turquia deixa de ser um refugiado, pois ali já não há guerra. Sair de um campo de refugiados na Turquia para tentar a sorte na Europa é, como tal, uma migração económica, pois apenas melhorará a vida das pessoas e não reforçará a sua segurança. Para provar a sua boa vontade (e a sua crença na tese) Rutte propôs-se a ajudar no financiamento de um sistema de ferrys que devolvam à Turquia os migrantes que chegam à costa grega de forma ilegal. Uma ideia que foi  muito criticada – até pelo facto de a Turquia não ser, pelos padrões europeus, considerada um abrigo seguro para refugiados – mas que estará na base do esquema de trocas de refugiados que a EU negoceia atualmente com Ancara.  

Jaroslaw Kaczynski

Líder do partido que chefia o governo e ocupa a presidência polaca

Jaroslaw Kaczynski conseguiu que o Partido da Lei e Liberdade (PiS na sigla original) concretizasse na Polónia o sonho de Francisco Sá Carneiro. Mas com um extra: à maioria e governo, liderados por Beata Szydo, e ao presidente Andrzej Duda junta-se a autoridade não institucionalizada do próprio Kaczynski, que sendo um mero deputado no papel tem mais influência do que tinha nos tempos em que chefiou o executivo (2006-07). Foi ele que, em plena campanha eleitoral, alertou para as “doenças perigosas que não se viam na Europa há muito tempo” e que agora deteta “nos corpos dessa gente”. Com a vitória nas urnas, ninguém se espantou quando a nova primeira-ministra anunciou rejeitar o sistema de quotas de asilo previamente acertado entre líderes europeus, isto apesar de confessar que se sente “muito contente por ser membro da NATO e da UE nestes tempos difíceis”.  

Viktor Orban

Primeiro-ministro da Hungria

Para o menos democrático dos líderes europeus, dizer a palavra “moral” a falar sobre refugiados é uma inovação: “A nossa obrigação moral é deixar-lhes claro que não devem vir, é perigoso pois não podemos garantir que os aceitamos.” Perigoso? Mas então não fogem da guerra? Para Orban fugiram, pois “a Turquia é um país seguro e o melhor e mais seguro para as famílias é ficarem lá”. Se a Turquia já alberga 2,7 milhões de refugiados é problema de outros, Orban sempre gostou de se dedicar a outros temas, como o que é escrito na imprensa do seu país. “Será liberdade de informação que os media só mostrem mulheres e crianças quando 70% dos migrantes são grupos de homens jovens que parecem um exército”, questiona o primeiro-ministro húngaro. Mas não se pense que não sobre ponta de solidariedade em Viktor Orban, pois este garante estar disposto “a deixar passar comboios com imigrantes ilegais”. Confuso? Desde que estes “venham do ocidente rumo à Grécia e Turquia”, claro.