É a primeira mulher a liderar o CDS e isso parece ainda não ser normal. Pelo menos, a julgar pelas referências feitas ao sexo da líder.
"Isto agora são as mulheres que mandam", comentavam dois congressistas do CDS pelos corredores do Pavilhão Multiusos de Gondomar. O tom não chegava a ser pejorativo, mas um sinal de que o conforto com a liderança no feminino ainda não é total.
No palco do 26.º Congresso do CDS, também houve várias referências ao facto de Cristas ser mulher. Houve quem falasse no "sorriso" da sucessora de Paulo Portas, houve quem citasse Jerónimo de Sousa para dizer que também neste partido há políticas "engraçadinhas", mas que não se resumem a isso. Quase todas as referências serviram para tentar provar que ser mulher é uma vantagem, mas são a prova de que o género em política ainda não é neutro.
Até Paulo Portas encontrou uma imagem maternal para falar da mulher que lhe vai suceder à frente dos destinos dos centristas. Disse Portas que sabe que Assunção será "a safe pair of hands" para tratar dos portugueses.
A própria usou, de resto, a sua condição de mulher e mãe de quatro filhos para explicar como isso pode ser uma vantagem para o partido e alterar a forma de fazer política, "com menos sangue", porque "as pessoas lá fora" não gostam de ver essas disputas de berros que, na opinião de Cristas, são mais próprias do universo masculino.
"Dar espaço às mulheres significa dar espaço a esta outra forma de estar, menos bélica, mais aberta a consensos, mas saber que a construção se faz neste diálogo ambicioso e positivo", disse a nova líder num discurso auto-biográfico em que se apresentou como a pessoa certa para o lugar certo.
A ex-deputada Teresa Anjinho, que agora sobe à comissão executiva do CDS, fugiu, porém a este discurso que identifica feminilidade com ausência de agressividade. No palco, Anjinho anunciou a Cristas: "Tens aqui a tua soldado". A frase serviu para ir contra o estereótipo das mulheres pouco combativas, mas foi a única a tentar contrariar esta ideia de que a política é diferente quando é feita por uma mulher
As regras dos homens
Assunção tem noção de que está a abrir caminho às mulheres e não se coíbe de usar a sua experiência pessoal para falar de um tema que não deve deixar de o ser tão cedo. No Congresso chegou mesmo a contar que o pai lhe dizia que sendo rapariga tinha de estudar e trabalhar mais, porque em Portugal "quando alguma coisa corre mal, são as mulheres que ficam com as crianças nos braços".
"Não quero ser exemplo para ninguém, mas quero sentir que por estar aqui no parlamento ou no partido ou no Governo(…) mostre que é possível e que o país ganha muito quando estamos de braços abertos para criar as condições para que as mulheres que se realizam de formas muito diferentes também possam estar na política", tinha já afirmado Assunção Cristas numa sessão promovida pelo CDS no Parlamento o Dia da Mulher.
Nessa sessão, Cristas partilhou a reação da filha de oito anos quando começou a ser deputada em 2009. "Na altura disse: 'ó mãe, só deviam ir para deputados as mulheres sem filhos ou os homens'", recordou, explicando as críticas da filha por a mãe ter passado a chegar muito mais tarde a casa.
Assunção, que também teve essa preocupação quando Portas a convidou a ir para a política depois de a ver num Prós e Contras da RTP, explicou então à criança que as regras foram feitas a pensar no masculino, mas podem começar a mudar quando houver mais mulheres na política.
"Explicava-lhe que o mundo da política é muito dominado por regras feitas por homens e que (…) talvez [isso] mude paulatinamente quando mais mulheres se tornarem líderes", disse, defendendo que de 2009 para cá as coisas começaram a mudar, ainda que não o suficiente.