Ucrânia. Governo resiste à queda perante pressão do presidente

Ucrânia. Governo resiste à queda perante pressão do presidente


Arseni Iatseniuk foi chumbado na avaliação anual mas resistiu a moção de censura. “É só uma questão de tempo”, diz ao i ativista do Euromaidan.


Arseni Iatseniuk sobreviveu ontem a uma moção de censura no parlamento ucraniano. Mas o governo que saiu da revolução que em 2014 derrubou o pró-russo Viktor Ianukovich – e iniciou o conflito com a Rússia – parece ter os dias contados, tal a divisão interna que cresce ao ritmo da insatisfação popular.

Vários partidos da coligação pró-ocidental que compõe o governo votaram a favor da moção de censura, incluindo o bloco do presidente Petro Poroshenko, que de manhã havia pedido a Iatseniuk e ao procurador-geral da República, Viktor Shokin, que se demitissem, “de forma a restaurar a confiança no governo”.

Para o presidente, “há muito que passou o tempo que pedia uma renovação governamental”. Perante as saídas consecutivas de ministros que eram tidos, interna e externamente, como reformistas, Poroshenko concluiu que “para restaurar a confiança pública já não é suficiente uma terapia, é necessária uma cirurgia”. E embora defendesse que a convocação de eleições antecipadas iria “agravar a crise política”, o presidente ucraniano considerava “óbvia” a necessidade de “mudar de governo”.

Ao seu lado teve os populistas do Partido da Autodefesa e o bloco da antiga primeira-ministra (Pátria) – ambos na coligação governamental – , que também votaram pela queda do primeiro-ministro, que numa sondagem de janeiro tinha os níveis de popularidade nuns desastrosos 12%. Mas depois de um total de 247 deputados ter chumbado o relatório anual apresentado por Iatseniuk, apenas 194 confirmaram a intenção de derrubar o governo na moção de censura – eram necessários 226.

Antes do segundo voto, Iatseniuk prometia “respeitar qualquer resultado”, mas mostrava vontade de permanecer no cargo, prometendo “construir a Ucrânia europeia que o povo merece” depois de ter “construído as bases de um novo país”.

Para a politóloga Kateryna Kruk, que se destacou pelo ativismo nas redes sociais durante os meses de ocupação da Praça da Independência – protesto que adotou o nome Euromaidan –, “é apenas uma questão de tempo até à queda” de Iatseniuk, embora defenda que é “errado pensar que o problema está apenas relacionado com o governo e o primeiro-ministro”.

A crise “originada pela falta de reformas e continuação de práticas corruptas” mostra essencialmente duas coisas, defendeu a ativista em declarações ao i: por um lado, estão no poder figuras que recorrem às “velhas práticas do regime de Ianukovich”; por outro, “mostra que os ucranianos ainda pedem a mudança e que há gente no governo e no parlamento que está pronta a lutar por ela”.

Ao explicar a posição de força assumida por Poroshenko, Kruk lembra que no início de fevereiro, após a demissão do ministro das Finanças, Aivaras Abromavicius, os aliados externos foram “muito explícitos” ao recordar que “sem um verdadeiro combate à corrupção não haverá mais apoio financeiro” ao país.

O governo resistiu, mas os primeiros sinais de mudança surgiram com o anúncio da demissão do procurador-geral, Viktor Shokin, que fez o favor ao presidente saindo horas depois do violento ataque do seu adjunto.

Apesar dos percalços, a politóloga continua crente no sucesso da revolução: “A Ucrânia não é apenas as instituições do Estado. Só o facto de estes problemas serem debatidos significa muito. Há uns anos atrás era impossível, mas ainda há um longo caminho pela frente”.