Mesão Frio. Presidente da câmara atropela jovem e abandona o local

Mesão Frio. Presidente da câmara atropela jovem e abandona o local


Ministério Público acusa autarca de ter “abandonado” o local e não prestar auxílio ao jovem que sabia que tinha acabado de atropelar


O presidente da Câmara Municipal de Mesão Frio está acusado de dois crimes: um de ofensa à integridade física por negligência e um outro de omissão de auxílio. Segundo despacho de acusação do Ministério Público (MP), a que i teve acesso, Alberto Monteiro Pereira terá atropelado um jovem e abandonado o local sem prestar apoio a José Monteiro, apesar de ter percebido que a pessoa tinha ficado ferida no local. O autarca rejeita as acusações e já requereu a abertura de instrução.

Atropelamento e fuga Era sábado à tarde e, no início de dezembro, estava na altura das festas de Santo André. Ainda assim, as ruas da vila estavam praticamente vazias. José Monteiro percorria a avenida Conselheiro José Maria Alpoim com o cão pela trela e, à primeira vista, não havia ninguém a passar por ali. As barracas de venda de produtos tradicionais ocupavam parte dos passeios, e isso obrigava o jovem a caminhar pela estrada, junto ao passeio.

Alberto Monteiro Pereira vinha em sentido contrário, ao volante do seu carro. Logo depois de passar o edifício da câmara municipal, guinou subitamente o carro para a direita, “acabando por embater com a parte frontal direita do veículo e guarda-lamas direito (que ficaram amolgados) e a roda do mesmo lado na perna e pé direitos” de José Monteiro, refere a acusação.

O jovem ficou com o pé preso entre a roda e o passeio, deitado no chão. Mas o autarca nem sequer terá parado, apesar de, segundo o Ministério Público, ter consciência do acidente que tinha acabado de provocar. “O arguido, apercebendo-se de que havia embatido com o veículo” em José Monteiro, “e que lhe havia provocado ferimentos, abandonou o local”. Arrancou com o carro “sem prestar qualquer auxílio, sabendo”, insiste o procurador no despacho, “que o mesmo se encontrava ferido e, por isso, a precisar de auxílio, dadas as circunstâncias em que se deu o acidente”.

Perigo consciente O caso deu-se em dezembro de 2014. O socialista Alberto Monteiro Pereira tinha sido reeleito há pouco mais de um ano para a autarquia, com quase 60% dos votos – mais 10% que nas eleições de 2009.

O acidente aconteceu meia dúzia de metros à seguir ao edifício da câmara municipal e a cerca de 25 metros do posto da GNR de Mesão Frio. Apesar disso, apenas uma pessoa, além do autarca e de José Monteiro, terá assistido ao que se passou, acabando por ser chamado pela defesa para testemunhar no processo.

Quando atropelou o jovem, o presidente da câmara – que é, também, provedor da Santa Casa da Misericórdia de Mesão Frio – conduzia “de forma descuidada e imprudente”, mostrando “indiferença pela integridade física das pessoas que transitassem naquela altura pela via”, refere-se no despacho.

O MP aponta, de resto, alguns dados que deixam em aberto a possibilidade de o atropelamento não ter sido acidente. O despacho refere que “o local onde se deu o acidente é uma reta”, sendo que aquela estrada “tem 4,7 metros de largura”. Além disso, apesar de ser inverno, “na altura em que se deu o acidente, [havia] boas condições de visibilidade”. Não haveria, por isso, aparentemente, razões para que o autarca guinasse subitamente o carro para a direita e embatesse contra o jovem.

Acusação “sem fundamento” Sérgio Barbosa Pereira foi nomeado defensor oficioso de Alberto Monteiro Pereira. Ao i, o advogado explica que a defesa ficará, afinal, a cargo de Carlos Pombo Silva (advogado da autarquia), mas, como colaborador no mesmo escritório de Pombo Silva, deu conta da posição da defesa.

“Em virtude de os factos pelos quais o senhor presidente da câmara é acusado não terem qualquer fundamento, portanto, não serem verdadeiros, já foi requerida a abertura de instrução para esclarecimento da verdade”, refere. Nessa fase, o juiz terá de decidir se os factos  que constam do processo são ou não suficientes para levar o autarca a julgamento.

Não é obrigatório chamar testemunhas para depor, “Mas, no caso em concreto, como não é algo relacionado com prova documental, certamente terão sido arroladas testemunhas”, revela o mesmo advogado.

O despacho de acusação aponta para três provas testemunhais: José Monteiro, atropelado naquela tarde, Tiago Miranda, militar da GNR que recebeu a queixa apresentada contra o autarca, e Ricardo Teixeira, a testemunha da defesa, que terá assistido ao episódio no local. Há ainda documentos apensos aos autos, entre “fotografias”, “cartazes” e registos clínicos.

Consequências físicas José Monteiro teve de receber assistência hospitalar na sequência do atropelamento. O jovem sentiu “dores” e ficou com o tornozelo e pé direitos negros, que tiveram de “ser imobilizados com ligadura”. Durante 15 dias esteve a receber assistência médica, ainda que não tenha perdido condições para trabalhar.

Pena de prisão ou multa O presidente de Mesão Frio arrisca ser condenado a pena de prisão.

O artigo 148 do Código Penal prevê que “quem, por negligência, ofender o corpo ou a saúde de outra pessoa, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias”. A pena pode ser dispensada caso da ofensa não resulte “doença ou incapacidade para o trabalho por mais de três dias” – como aconteceu neste caso.

Pelo crime de omissão de auxílio, o cenário para o autarca pode ser ainda mais grave porque a legislação prevê que, “em caso de grave necessidade” provocada por acidente, “aquele que omite o auxílio devido (…) é punido com pena de prisão até dois anos ou com pena de multa até 240 dias” quando é o próprio a provocar o acidente.