Grécia. Foram-se os holofotes e voltaram as manifs

Grécia. Foram-se os holofotes e voltaram as manifs


Novo ataque às pensões, imposto por um resgate da troika rejeitado em referendo, volta a deixar a Grécia em estado de sítio enquanto Tsipras tenta captar apoios externos


É o primeiro líder europeu a visitar o Irão desde a assinatura do histórico acordo nuclear que recolocou a República Islâmica na rota dos mercados internacionais. “A Grécia irá tornar-se a ponte económica, energética e comercial entre o Irão e a União Europeia”, anunciou à chegada o primeiro-ministro grego. Isto depois de ter feito um acordo do mesmo tipo com o governo de Israel.

“Tirar vantagem da nova era pós-sanções”, como explicou o porta-voz do ministério dos Negócios Estrangeiros, será a principal prioridade de um Alexis Tsipras que um ano depois de ter chegado ao poder já vai tendo o tratamento tradicional de um primeiro-ministro grego – uma Bruxelas em silêncio enquanto vê aplicada a sua receita de austeridade e uma Grécia em erupção, com greves gerais e confrontos entre manifestantes e polícias.

  As imagens de uma capital a ferro e fogo são da greve geral da última quinta-feira, que levou ao encerramento de escolas e lojas, à paralisação de transportes públicos e deixou os hospitais em serviços mínimos. Mas há muito que os gregos mostram insatisfação com o último pacote de austeridade, que incluirá um aumento nas contribuições mensais para a segurança social como forma de financiar uma redução das pensões inferior à exigida pelos credores europeus.

Desde janeiro que os agricultores gregos protestam contra a reforma, com manifestações quase diárias e principalmente através do corte de algumas das principais estradas do país, incluindo a autoestrada entre Atenas e Tessalónica, a segunda maior cidade do país. “O que fazemos é cansativo mas não vamos parar. Ficaremos aqui até quando for necessário”, prometeu à agência “ANA” um dos líderes do protesto paralelo que há semanas interrompe a circulação nas duas principais fronteiras do país, com a Turquia e a Bulgária. O aumento da taxação dos seus rendimentos para 26% é a causa principal do protesto que rejeita ainda o fim dos subsídios estatais que permitiam ao setor aceder a combustíveis a um preço mais reduzido.

Ao mesmo tempo, grande parte dos advogados do país está também num boicote que desde janeiro já levou ao adiamento de centenas de julgamentos. “Uma reforma é, supostamente, um esquema que ajuda a melhorar um problema existente, mas isto não é uma reforma, é uma maneira de conseguir pagar as tuas dívidas enquanto país”, denunciou à “Bloomberg” Socrates Vrysopoulos, um advogado de 38 anos que diz que este aumento de impostos significará que um profissional da sua área que tenha rendimentos de 20 mil euros anuais pagará 13.800 em impostos – um aumento de 27% em relação à tributação atual.

Num país com 2,7 milhões de pensionistas, que ganham em média 960 euros mensais, os credores apontam para a redução de um peso que só no ano passado ‘roubou’ 22,7% do orçamento grego. Mas Tsipras quer apenas reduzir as pensões mais altas – reduzindo 500 euros à pensão máxima de 2.700 –, apostando por isso num reforço da carga fiscal que seja capaz de financiar o sistema.

Contrabando a aumentar “Eles preferem ir ao bolso da avó do que atacar o contrabando”, disse também à “Bloomberg” um destilador que fixa em 200 milhões de euros o prejuízo anual doEstado no contrabando de bebidas alcoólicas. Uma denúncia que reflete um problema cultural do país e que tem sido repetida em diversos setores da economia. A associação nacional de empresas petrolíferas – cujos representantes foram com Tsipras a Teerão tentar recuperar o volume de 100 mil barris diários que Atenas comprava antes das sanções internacionais à República Islâmica – acredita que os cofres do Estado perdem cerca de 200 milhões de euros anuais devido ao contrabando de combustíveis.

O representante grego da tabaqueira Phillip Morris garante na mesma reportagem que o contrabando de tabaco leva a perdas de 670 milhões de euros anuais só para o Estado. E ambos dizem que os números aumentam à medida que as autoridades de patrulha marítima se centram mais na chegada de refugiados do que no contrabando de materiais – outra exigência de Bruxelas. 

O problema para o primeiro-ministro grego é que já ninguém acredita que estas reformas colocarão o país no rumo do crescimento. Até porque há sempre alguém em Bruxelas a recordar o contrário: “Mais medidas serão necessárias em 2016 e 2017 de forma a cumprir as metas orçamentais previstas no memorando”, recordava um comunicado da Comissão Europeia que na semana passada antecipava que a Grécia voltará à recessão durante o ano – e com uma dívida pública que representa 185% do PIB.