O Banif foi alvo de uma resolução polémica no final do ano, depois de ter recebido ajudas públicas em 2013. Que avaliação faz do processo?
Agiu-se de forma arbitrária, burocrática e destrutiva sobre pessoas e empresas – Banif e algumas empresas clientes, acionistas e credoras do banco. Os factos não interessaram. Não foi feita uma avaliação objetiva. Não se sabe se houve mérito ou não na gestão do Banif. O Estado injetou 825 milhões de euros no banco e privados injetaram 450 milhões de euros. Muitos clientes do banco confiaram as suas poupanças de centenas de milhões de euros na dívida subordinada do banco. O banco e os seus funcionários passaram por um processo de reestruturação muito duro e muitos perderam o seu emprego. Muitas agências do banco foram encerradas. E, no fim deste esforço todo, o Estado e o Banco de Portugal tratam assim os cidadãos e os contribuintes? Sem sequer saber se o banco estava insolvente? Parece inaceitável.
O que acha das opções tomadas pelo anterior governo?
Logo na negociação inicial criaram-se constrangimentos desnecessários à atuação do Estado e do próprio banco, quiçá por questões ideológicas. Noutros países, a Comissão aceitou resgates e nacionalizações de bancos. A optar por recapitalização pública, e existiam outras alternativas, o Estado só deveria ter aceitado recapitalizar o banco com a concordância de todas as autoridades europeias e deveria ter nacionalizado o banco sem deixar impor prazos para o reprivatizar. A definição de prazos diminui o valor da posição acionista do Estado ao criar pressão para a sua venda. O “chutar” o problema para a frente resultou nesta situação de fragilidade da posição negocial do governo. Acresce que havia um grande desconhecimento dos mais altos responsáveis do país sobre a verdadeira situação do Banif e um tratamento do dossiê, em algumas dimensões, casuístico.
Em que sentido?
Por exemplo, o anterior governo, aparentemente, não sabia quanto valia o Banif; se o Banif estava insolvente ou não; se, em termos legais, podia ou não ser aplicada a medida de resolução; se deveria ou não ser intransigente e discordar com a Direção-Geral de Concorrência (DGComp) da Comissão Europeia. A ser necessária uma nova ajuda pública, com a aplicação da medida de resolução, o governo anterior não sabia qual o montante de ajudas públicas necessárias para estabilizar o banco. Por conseguinte, não estava em condições de fazer um bom briefing ao novo governo.
O novo governo não tem também responsabilidades?
Tem. Tinha a obrigação de responder a essas questões antes de gastar mais 3800 milhões de euros de dinheiros e garantias públicas, elevando a fatura total para quase 4600 milhões de euros. Quando em dúvida, o melhor é nada fazer. Se o novo governo tinha dúvidas, esperava e clarificava as questões em aberto, e só depois tomava uma decisão. Não devia tomar uma decisão de 4600 milhões de euros sob pressão de tempo, sem análises substantivas de cada uma das alternativas possíveis… Porque há sempre alternativas.
A atuação da Comissão Europeia não condicionou as decisões?
A DGComp tem aqui um papel muito estranho. Chegou a dizer às autoridades portuguesas para venderem o Banif ao Santander e defendeu oficialmente a resolução do banco, pelo menos, mais de um mês antes de esta acontecer, segundo o “Expresso”. Quase parece que a DGComp é um banco de investimento, e não a autoridade da concorrência europeia.
E como vê a posição do Banco de Portugal (BdP) no meio de tudo isto?
Não se compreende a atuação do conselho de administração, porque só podia intervir no Banif aplicando uma medida de resolução bancária, no curto prazo, se o Banif violasse os rácios de capital mínimos. Ora isso não aconteceu. Não se pode expropriar com base em suposições de que o Banif, num futuro incerto, iria violar as regras de supervisão prudencial na banca. É como prender um cidadão porque se acredita que irá cometer um crime no futuro. Isso só deveria ocorrer em filmes de ficção científica com o Tom Cruise [”Minority Report”].
A quem se podem então imputar responsabilidades?
Antes de imputar responsabilidades, é necessário tentar emendar a mão e corrigir o erro. É provável que o contrato de venda realizado com o Santander esteja blindado. Por conseguinte, deverá ser quase impossível reverter a resolução do Banif. Mas, muito provavelmente, é possível iniciar um processo de averiguações aprofundado para analisar se o Santander beneficiou ou não de ajudas do Estado português. O objetivo primeiro, antes de procurar culpados, deve ser procurar corrigir a situação, nomeadamente procurar recuperar uma parte significativa dos 4,6 mil milhões de euros de ajudas públicas concedidas ao antigo Banif.
Esses 4,6 mil milhões são a fatura total do caso Banif para os cofres públicos?
Neste momento, com base na informação disponível, estimo que seja esse o total das ajudas públicas. Mas as deliberações do BdP são ambíguas e opacas. Em particular, não sei em que se traduz uma das frases dessa deliberação que, essencialmente, diz que a Naviget/Oitante, do Fundo de Resolução, assume a responsabilidade pelos prejuízos do Banif. Até quando e até quanto?
Mas depois terá de haver responsabilização.
Aí há duas questões separadas. A primeira é sobre se as contas do Banif estavam ou não certinhas e direitinhas. Se não for esse o caso, as entidades responsáveis são a administração do banco, os respetivos auditores, o BdP e o anterior governo, uma vez que o Estado era o principal acionista e nomeou alguns dos administradores do banco. A segunda questão é sobre quem é responsável pela resolução do Banif, quer as contas estivessem certinhas e direitinhas, quer não estivessem. Parece-me que as entidades que tiveram um papel determinante na resolução do Banif foram a DGComp, o BCE, o Banco de Portugal e o anterior governo, que era responsável por conduzir as negociações com essas entidades e zelar pela proteção do interesse nacional. O novo governo também tem responsabilidades porque aceitou injetar mais 3,8 mil milhões de euros de dinheiros públicos, além dos 825 milhões de euros da injeção de capital realizada em 2013, e porque tem a obrigação de defender o interesse acionista do Estado. O Estado detinha 60% das ações do Banif.
A resolução era evitável?
Era evitável, foi desnecessária e, aparentemente, sem fundamento legal: o banco cumpria os rácios de capital, não estava insolvente, não estava em perigo iminente de falhar. Sim, ocorreu uma corrida ao banco porque circularam rumores, provavelmente com base na informação privilegiada de que a DGComp exigia desde 17 de novembro, pelo menos, a aplicação de uma medida de resolução ao banco. Portanto, o anúncio de que iria ser aplicada uma medida de resolução precipita uma corrida ao banco, que por sua vez é utilizada para justificar a aplicação da medida de resolução. Lógica mais circular é impossível.
Nessa fase, o Banco de Portugal ainda poderia ter feito alguma coisa?
Deveria ter imediatamente declarado que não iria ser aplicada uma medida de resolução ao Banif porque o Banif cumpria os rácios de capital mínimos. O BdP não podia ter afirmado que os depósitos estavam sempre assegurados. Os bancos centrais modernos foram criados precisamente para fazer face a corridas a bancos – são um emprestador de última instância. Não foram criados para promover a instabilidade financeira nem corridas a bancos.
Que outras soluções para o Banif poderia haver?
A primeira alternativa – e a melhor, em minha opinião – era não fazer qualquer tipo de intervenção. O Banif cumpria os rácios de capital. Recorreu a empréstimos de emergência do BCE e do BdP. Dispunha de ativos suficientes para oferecer como colateral e assim obter liquidez adicional. O BdP deveria ter feito um comunicado a declarar que não ia e não podia ser realizada uma medida de resolução porque o banco era solvente e cumpria os rácios de capital. E, simplesmente, aguardar. A corrida ao banco acalmou após os primeiros dias.
E se continuasse?
Aí, o Estado – se soubesse que o Banif era solvente e cumpria os rácios de capital – poderia anunciar que tinha dado instruções à Caixa Geral de Depósitos (CGD) para emprestar temporariamente dinheiro ao Banif. Dessa decisão poderia, é certo, resultar um processo de averiguações da autoridade da concorrência europeia, mas o Estado não pode ficar impotente e deixar que rumores plantados destruam bancos portugueses. E existiam ainda outras alternativas. Por exemplo, compra do banco pela CGD, injeção de dinheiros públicos direta ou indiretamente, por exemplo através do Fundo de Resolução, empréstimos do Estado, garantias do Estado, etc. E, se se provasse que o Banif não cumpria os rácios de capital, uma medida de resolução bancária com bail-in de grandes credores e de grandes depositantes, que deveriam receber em troca ações do banco.
O Ministério das Finanças alega que uma eventual solução com perdas para obrigacionistas afetaria aplicações de emigrantes.
Não concordo, porque se parte da premissa de que era necessário intervencionar o banco sem sequer o provar. As contas mais recentes do Banif indicam que o banco cumpria os rácios de capital e que, por conseguinte, o BdP não poderia ter aplicado uma medida de resolução. Mas mesmo que fosse necessário aplicar uma medida de resolução, era preferível a participação de grandes obrigacionistas e grandes depositantes do que a opção tomada de fazer pagar a fatura aos contribuintes. Era possível capitalizar o banco, mais do que já estava, impondo perdas pequenas aos grandes obrigacionistas e aos emigrantes. E nesse caso, estes deveriam receber ações do Banif em troca.
Na solução para recapitalizar o Novo Banco já houve perdas para obrigacionistas seniores. Concordou com essa solução?
Não. Foi uma decisão arbitrária, mal fundamentada e desnecessária. Não se refletiu sobre as consequências. Existiam outras alternativas que permitiriam suprir a alegada falta de capital do Novo Banco. Utilizou-se um expediente aparentemente fácil, mas que terá – já está a ter – consequências. Trataram-se obrigacionistas seniores, na prática, como se fossem acionistas. Houve alguns credores e clientes do banco que compraram essas obrigações já depois de o Novo Banco ser criado e que, de um dia para o outro, se veem expropriados de 100% dos seus créditos. Sem apelo nem agravo… Ao que parece, o BdP continua a improvisar e já promete garantir a devolução de 20%. Como o fará? De certeza, com dinheiros públicos. A litigância é certa e é provável que o Estado perca as ações na justiça. Ou seja, quem pagará a fatura será novamente o contribuinte. E há que considerar ainda os custos de credibilidade do país nos mercados financeiros.
O governo alega que esteve contra esta solução desenhada pelo BdP. Poderia ter feito alguma coisa?
Se estivesse mesmo contra podia, em última instância, alterar a lei e impedir o conselho de administração do BdP de fazer o que fez. O Estado é soberano. Significa que tem o poder para propor leis à Assembleia da República, aprovar decretos-leis, solicitar à Assembleia da República autorização legislativa ou até mesmo, aparentemente, alterar decretos-leis em sede de Conselho de Ministros. Foi o que ocorreu, por exemplo, com a resolução do BES, em que o Conselho de Ministros do anterior governo se reuniu virtualmente por email para alterar um artigo do decreto-lei que enquadra a resolução bancária. Se o governo tivesse alterado a lei, o conselho de administração do BdP, obrigado que está a cumprir as leis da República, não poderia ter feito o que fez. E, dessa forma, o governo não interferiria com a “independência” do supervisor. O governo esteve contra o BdP de uma forma soft.
O risco de litigância com a transferência das obrigações do Novo Banco para o BES não é excessivo?
A decisão tem consequências imprevisíveis porque se traduz numa operação nunca antes realizada a nível internacional, tanto quanto conheço. Não há precedentes. Ora, os tribunais no mundo anglo–saxónico funcionam, em larga medida, com base na jurisprudência estabelecida. Como essa jurisprudência, aparentemente, não existe, será estabelecida agora pela primeira vez. Parte dessa dívida titulada do Novo Banco deverá estar noutras jurisdições: Londres, Luxemburgo, ilhas Caimão. Acresce que existem contratos de derivativos sobre a dívida do Novo Banco – credit default swaps, uma espécie de seguros de dívida – que se transacionam nos mercados internacionais. Por outro lado, a dívida titulada do Novo Banco contém cláusulas de cross-default, que determinam que toda a dívida entra em incumprimento se uma porção da dívida entrar em incumprimento. É possível que baste um dos juízes de um desses tribunais considerar que a transferência retrativa da dívida sénior do Novo Banco para o BES constitui um evento de default para os restantes credores do banco considerarem que a restante dívida está em incumprimento. E há outros cenários possíveis. O Single Resolution Board – o BCE – pode intervir face a uma declaração de incumprimento. Não me parece possível antever todas as contingências possíveis neste momento.
É provável que o Estado perca ações em tribunal?
O Estado poderá perder as ações na justiça colocadas pelos credores seniores do Novo Banco, por exemplo, porque a decisão do BdP, provavelmente, viola o direito à propriedade privada consagrado na Constituição. Além de poder não respeitar o disposto na lei de resolução bancária nacional, a qual determina que credores e acionistas têm direito a receber o que receberiam caso o banco tivesse sido liquidado. Ou seja, os credores seniores podem legitimamente argumentar que, se o banco tivesse sido liquidado, provavelmente receberiam mais do que 0%. Em suma, o Estado arrisca-se a perder muito mais do que os dois mil milhões de euros confiscados aos credores seniores. Nomeadamente, arrisca-se a perder a sua posição acionista no Novo Banco. Parece que se optou pela pior das alternativas. Existiam outras, a primeira das quais seria nada fazer no curto prazo.
Ao chamarem-se os obrigacionistas para a solução, há ecos de que a aversão ao risco do país e dos bancos portugueses aumentou. É, de facto, um problema?
Sim. O bail-in das obrigações do Novo Banco teve consequências enormes, muito para além do esperado. Foi como um bater de asas de borboleta com enormes e inesperadas repercussões. Além do impacto no risco do país e dos bancos portugueses, teve um impacto significativo na banca italiana, que já se ressentia do processo de resolução de quatro bancos pequenos nesse país. Ao ponto de o primeiro-ministro italiano se empenhar de novo na criação de um banco mau para limpar 200 mil milhões de euros de lixo tóxico da banca italiana e numa proposta para disponibilizar garantias públicas à banca italiana. E teve impacto nos mercados financeiros, com a publicação de artigos de opinião sobre o bail-in de credores seniores no “Financial Times” e de outros artigos na Bloomberg e na Reuters. Causou polémica. Obrigou o BCE a emitir um comunicado.
Portugal tem tido, desde 2008, sucessivas intervenções no sistema financeiro. O que motivou tantas dificuldades?
O enorme aumento de endividamento de empresas, famílias e Estado que ocorreu desde o fim da década de 1990 até ao final da década passada, só foi possível porque foi intermediado pela banca, com o apoio do financiamento do Eurossistema. Em resultado, a banca portuguesa passou a estar muito endividada face ao exterior. Até 1997, o Banco de Portugal obrigava os bancos a manterem reservas mínimas obrigatórias de 17%. Portanto, por cada novo euro de dinheiro depositado, a banca podia criar um máximo teórico de 4,9 euros de crédito. O crédito bancário era escasso. O BCE, quando foi criado, reduziu as reservas mínimas obrigatórias para apenas 2% e alterou os procedimentos de política monetária. Em consequência, por cada euro, a banca passou a poder criar um máximo teórico de 49 euros de crédito. O crédito explodiu e as taxas de juro baixaram. Acresce que os novos procedimentos de política monetária definidos pelo BCE permitiram à banca portuguesa endividar-se ao exterior quase sem limites. Em resultado, no final de 2009, a banca era responsável, direta ou indiretamente, por mais de metade da dívida externa bruta do país e mais do dobro da dívida externa bruta do Estado.
O memorando assinado com a troika não devia ter acautelado estas questões?
A parte do memorando relativa à banca era muito fraca e pouco elaborada. Estavam previstos apoios de 47 mil milhões de euros, dos quais 12 mil milhões para recapitalizar a banca e o restante em garantias do Estado. Os dinheiros eram públicos, mas a gestão continuaria com os antigos acionistas. O objetivo era evitar a palavra nacionalização – que ocorreu noutros países europeus, como a Inglaterra. A banca estava obrigada a devolver essas ajudas. No caso do Banif, por exemplo, o plano de recapitalização duraria até 2017. Mas o que estava no memorando era uma missão impossível definida pela troika: no meio de um programa de ajustamento e de austeridade sem precedentes, a banca nacional, muito endividada ao exterior, dependente da economia nacional, tinha de sanear-se e de encontrar, no prazo de poucos anos, investidores privados para a financiar em 47 mil milhões de euros! Claro que a estratégia, irrealista, tinha tudo para dar errado.
Concorda então com o primeiro–ministro, que considera que os problemas dos bancos foram menosprezados durante a troika?
Sim. A troika preocupou-se e preocupa–se com detalhes, ignorando o elefante no meio da sala. O resgate à banca representou os tais 47 mil milhões de euros e o resgate ao país foi de 78 mil milhões de euros. Por conseguinte, deveria ter sido óbvio que a componente mais importante do resgate ao país era precisamente o resgate à banca. Ou seja, uma grande parte do memorando deveria ter sido relativo à banca, ao invés de representar uma ínfima parte do documento. Outra componente importante do resgate deveria ter sido a reestruturação da dívida, que também foi ignorada – para agora o FMI fazer o mea culpa. O valor económico de uma decisão contém em si informação importante e de interpretação relativamente fácil. Se o resgate à banca é no montante de 47 mil milhões de euros, tal sinaliza que o país e a troika deveriam ter dedicado muitos recursos a acompanhar esse dossiê. Ao invés, a troika e o anterior governo passaram a maior do tempo a discutir assuntos polémicos, com muita relevância e impacto social, mas com impacto económico para o país de muito menor dimensão: o salário mínimo, os apoios aos desempregados, os cortes na saúde, o aumento das taxas moderadoras nos hospitais, a introdução de taxas nas Scuts ou o número de juntas de freguesia, etc. Preocuparam-se e gastaram o seu tempo com medidas com impacto de talvez algumas dezenas de milhões de euros e, dessa forma, não tiveram tempo para acompanhar de perto dossiês de 47 mil milhões de euros. As resoluções do BES e do Banif são consequência dessa metodologia de trabalho.
Qual o grau de confiança que tem hoje na solvabilidade do sistema financeiro?
Os principais problemas da banca nacional, no presente, não são os seus rácios de capital, mas a sua posição de liquidez, fruto da sua elevada dívida externa, e a debilidade da atividade económica doméstica. A banca continua muito endividada face ao exterior, não obstante o enorme nível de ajudas públicas que recebeu nos últimos anos do Estado português, que na prática assume parte da dívida externa da banca neste período. Esse endividamento externo traduz-se numa enorme dependência do financiamento do Eurossistema e dos mercados financeiros internacionais, através de dívida titulada. Por este motivo, a banca portuguesa pode enfrentar a qualquer momento uma crise sistémica se vir o acesso ao financiamento do Eurossistema restringido ou se for incapaz de refinanciar a sua dívida titulada nos mercados internacionais. Em particular, se a agência de rating DBRS descer o rating da República em apenas um nível, a dívida pública portuguesa deixaria de ser aceite como colateral em operações de cedência de liquidez, sendo provável que o mesmo ocorresse em relação a muitos outros ativos que a banca nacional utiliza como colaterais. A banca nacional passaria a ter grandes dificuldades em financiar-se junto do Eurossistema e é praticamente certo que passaria a ter de recorrer à assistência de liquidez de emergência do Banco de Portugal.
A CGD será provavelmente alvo de reforço de capitais com o OE2016. Como encara a situação do banco público?
Com alguma preocupação. Sucessivos governos têm injetado enormes montantes de capital na Caixa sem que haja, aparentemente, explicações ou consequências. E algumas decisões estratégicas da Caixa suscitam dúvidas. A Caixa tem um papel muito importante no sistema financeiro nacional que deve ser preservado e defendido. Mas as instituições de governo da União Europeia compreendem a importância da Caixa para os decisores políticos nacionais e utilizam a ameaça de uma potencial intervenção na Caixa como ferramenta negocial, para poderem fazer o que bem entendem com o restante sistema bancário nacional. Portugal deve olhar para o modo como outros países estão a agir em relação à União Bancária, nomeadamente, a Itália e a Alemanha: houve um banco na Alemanha que colocou um processo em tribunal porque não queria passar a ser supervisionado pelo BCE.