Mas deve-se também ao facto de a esquerda ter deixado vazio o centro político. Para além de o PCP e o Bloco terem apresentado candidatos próprios, o PS resolveu apoiar um candidato de esquerda radical contra a sua própria antiga presidente, Maria de Belém, cuja candidatura foi torpedeada por um oportuníssimo acórdão do Tribunal Constitucional. Como esta era a única candidata de centro-esquerda, os seus votos foram todos direitinhos para os braços de Marcelo, que assim ganhou facilmente à primeira volta.

Só que este abandono do centro vai implicar a canibalização dos partidos de esquerda, que se limitarão a disputar votos entre eles. Na noite eleitoral foi visível a irritação de Jerónimo de Sousa contra a "candidata engraçadinha" que o Bloco tinha apresentado. E também não parece que o Bloco fique muito satisfeito com este novo PS, que tenta pescar nas suas águas. A "geringonça" que apoia o governo corre assim o risco de gripar na próxima curva. Por isso, para cumprir a promessa de tudo fazer para manter este governo, Marcelo vai ter muito que trabalhar em Belém.

Quanto aos partidos da direita, irão fazer necessariamente um aggiornamento, pois Marcelo demonstrou que a maioria de esquerda não é inevitável, desde que o centro político não seja abandonado. Perspectiva-se por isso uma recomposição geral dos partidos nos próximos tempos.