A decisão do Tribunal Constitucional (TC) de dispensar os ex-titulares de cargos políticos de fazer prova de rendimentos para garantir uma subvenção vitalícia caiu que nem uma bomba na fase final da campanha presidencial. E dará argumentos aos candidatos, que têm entre hoje e amanhã para lançar o último apelo ao voto no domingo.
Maria de Belém é a principal “vítima” de uma decisão que foi conhecida na segunda-feira, dia em que o TC declarou a inconstitucionalidade da norma que foi introduzida pela primeira vez no Orçamento do Estado para 2014 e teve como consequência a suspensão do pagamento das subvenções vitalícias a ex-titulares de cargos políticos cujo rendimento do agregado familiar fosse superior a 2 mil euros. É que a candidata à Presidência da República está entre os 30 deputados que requereram a fiscalização sucessiva desta lei.
Ainda a digerir a morte de Almeida Santos, seu apoiante de primeiríssima hora, que faleceu na madrugada de terça-feira, Belém ensaiou uma reação numa nota enviada às redações: “O tribunal clarificou a natureza legal da subvenção vitalícia. Nunca a recebi. Irei avaliar as consequências da decisão do Tribunal Constitucional no meu caso pessoal e, oportunamente, decidirei.” E mais não disse.
A candidata falhou o debate de quarta-feira, já que cancelou todas as ações de campanha até hoje, na sequência do falecimento do presidente honorário do PS e ex-presidente da Assembleia da República. Mas Maria de Belém não deixou de ser desafiada pelos seus adversários a explicar os motivos pelos quais entende que a subvenção deve ser garantida a todos os ex-titulares de cargos políticos.
O tema foi puxado para o debate por Marisa Matias, que estranhou o “silêncio” dos candidatos. “Envergonham-me os deputados que pediram a subvenção vitalícia”, disparou a candidata do BE. Sampaio da Nóvoa e Marcelo Rebelo de Sousa também criticaram o espírito da lei que confere aos ex–políticos uma subvenção para o resto da vida.
O ex-reitor não se referiu ao tema durante o debate. À entrada disse que a sua posição é de “respeito pela decisão do Tribunal Constitucional, mas também de crítica em relação à possibilidade de se manterem subvenções vitalícias na sociedade”. À saída admitiu que, se for eleito PR, irá bater-se “para que acabe a subvenção vitalícia do Presidente da República e, se os deputados não concordarem, [renunciará] a ela”. Marcelo, na mesma linha, sublinhou que a decisão do TC (de devolver as subvenções) “é difícil de aceitar do ponto de vista da justiça social”.
Também os candidatos que correm sem apoio de partidos cavalgaram a onda de indignação com a decisão do TC, subscrita por Maria de Belém. Nas 48 horas que faltam para o fim da campanha, o assunto promete agitar uma corrida que não conseguiu mobilizar o país.
O ex-reitor da Universidade de Lisboa, no regresso à rua depois de suspender a campanha em virtude do falecimento de Almeida Santos, aproveitou para começar a disparar em todas as direções. “Compreendo mal que se respeite umas vezes e se ache que a Constituição é muito importante e que o Tribunal Constitucional é muito importante, e que outras vezes é uma vergonha a decisão do Tribunal Constitucional”, disse durante uma visita a uma fábrica de calçado em Guimarães, numa indireta para Marisa Matias, que considerou o acórdão do TC uma “vergonha”. E depois isolou Belém na mira: “Se eu fosse deputado, jamais tomaria uma iniciativa destas.” E lançou as bases para reflexão dos portugueses quanto ao sentido de voto: “Os portugueses devem ter em conta tudo. Tudo o que nós fazemos, tudo o que nós fizemos, tudo o que nós não fizemos.”
Edgar Silva, candidato com o apoio do PCP, também não deixou sair o tema da agenda: lembrou que defende “há mais de 20 anos o fim da vergonha das subvenções” e deixou um conselho a Belém: “Caberá a cada um, incluindo Maria de Belém, responder eticamente sobre as suas posições.”