Marcelo Rebelo de Sousa diz que o senhor anda zangado nesta campanha. Acha que passou essa imagem?
Algumas vezes dizem-me que devia sorrir mais, mas cada um é como cada qual. Vivo um pouco obcecado com os problemas do país. Em termos pessoais, felizmente, não tenho grandes problemas, mas vivo preocupado com o país e é natural que, às vezes, tenha um ar sério ou duro. Não faço ideia, mas é capaz de ser verdade.
Anda a percorrer Portugal há algumas semanas. É este o país que esperava encontrar ou alguma coisa o surpreendeu?
Está a correr bem. Tenho tido contactos com muita gente. Andei pelo país inteiro. Nessas visitas a empresas e a universidades fiquei com uma visão do país ainda mais completa e a minha preocupação aumentou. Há situações trágicas, dramáticas, pessoas que estão completamente desiludidas e desanimadas. Muitas não têm meios de subsistência, estão desempregadas, e as pessoas contam isso. Não é uma peregrinação pelo país agradável. As histórias são comoventes e revoltantes…
Já tinha essa noção?
Hoje tenho mais essa noção. As desgraças são muitas e não tinha tanto a ideia de que os problemas eram tantos. Mas também vi coisas boas. Vi empresas de grande qualidade a concorrerem no mercado internacional em setores que não conhecia. Vi empresas de grande qualidade que me dão uma certa esperança, mas também instituições de solidariedade social que fazem um trabalho notável. A grande desilusão da campanha é que tenho tentado discutir os problemas e vejo um total desinteresse em discutir as questões reais do país. Os candidatos falam permanentemente dos afetos, da estabilidade, da necessidade de fazer pontes, de reduzir a pobreza…
Não são questões importantes?
São e todos nós estamos de acordo sobre elas, mas isso não acrescenta nada à solução dos problemas do país. A campanha tem sido um vazio total de ideias.
Este tipo de campanha favorece a candidatura de Marcelo Rebelo de Sousa?
Claro que sim. Ele andou anos a mentir às pessoas. Faz-me confusão que os portugueses não se apercebam de que os candidatos são especialistas na mentira, uns por uma razão, outros por outra. O Marcelo andou anos a dizer que não ia ser candidato ou que não sabia se era candidato e a organizar a candidatura. Os outros dizem que são independentes, apesar de uma das candidatas ter sido presidente de um partido. É espantoso como é que se pode ser independente e, ao mesmo tempo, presidente de um partido.
Sampaio da Nóvoa não é militante de nenhum partido.
O Sampaio da Nóvoa é apoiado pelos apoiantes do António Costa, tem os cartazes nos painéis do Costa, mas é independente. É um país que ilude a realidade. O próprio governo está em campanha eleitoral permanente e os problemas do país vão sendo adiados. Portugal está numa situação muito complicada. À mais pequena subida dos juros – e isso pode acontecer, estou convencido de que vai acontecer dentro de um ano, no máximo -, nós não temos condições para sustentar a dívida. Não tenhamos ilusões. O BE e o PCP que tirem o cavalo da chuva se pensam que a Europa nos vai ajudar. Não ajuda nada.
Têm razão os que dizem que a curto prazo podemos voltar a ter uma intervenção externa?
Têm. Claro que o governo atual não está a ajudar. Está a fazer coisas com que eu concordo, porque nunca concordei com os cortes nas pensões e nos rendimentos do trabalho. Mas é preciso saber onde é que se vai buscar o dinheiro e o governo nunca levantou o problema dos grandes interesses que estão instalados, as rendas da energia, as isenções fiscais, as mordomias várias que todos têm no Estado… Acho que os portugueses, nesta eleição, não estão a ver o filme, e a curto ou médio prazo vamos ter gravíssimos problemas e não vamos ter na Presidência da República ninguém que saiba controlar estas coisas.
Há quem ache que tem um discurso próximo da direita e pode captar alguns votos dos que estão descontentes com Marcelo. Pode ser assim?
Já me têm dito isso. O meu discurso não é próximo da direita nem da esquerda. Estou preocupado com os problemas do país e, francamente, não creio que o desemprego, o crescimento económico ou a honradez sejam problemas de esquerda ou de direita. O PSD tem feito coisas bem feitas e mal feitas. O PS também – o tempo do Sócrates foi trágico. Mas também agora. Vou bater-me até ao fim da campanha para esclarecer isto do Banif. Não há nenhuma razão para a negociata que foi feita com o Santander. Quer o Banco de Portugal quer o governo tiraram da negociação o presidente do conselho de administração, que era quem conhecia as ofertas e poderia defender o banco. O banco estava a ter lucro… Isto está muito mal explicado. Há aqui um negócio qualquer que eu não entendo.
Admite sair do PS?
Provavelmente, pode acontecer.
Tem alguma previsão em relação ao resultado que vai ter no próximo domingo?
Não sei. Tanto pode haver menos abstenção como pode aumentar. O que os portugueses quiserem é aquilo que será. Sou um democrata e aceito os resultados.