Furacão. Começa amanhã o primeiro julgamento

Furacão. Começa amanhã o primeiro julgamento


Estado já conseguiu devolução de 142 milhões de euros com o Furacão. Caso que chega amanhã a tribunal envolve consultores, advogados, empresas e responsáveis do Finibanco


Dez anos depois do início da chamada Operação Furacão, realiza-se amanhã o primeiro julgamento. Na lista dos 12 arguidos constam antigos gestores do Finibanco e do grupo Finatlantic, consultores, advogados e empresas – suspeitos de fraude fiscal qualificada. Mas este caso que agora começa a ser julgado é apenas uma ponta do Furacão. No âmbito deste dossiê já foram constituídos 759 arguidos, existindo outros quatro inquéritos que terminaram com acusação.

Segundo a Procuradoria-Geral da República disse ao i, nestas cinco acusações estão em causa fugas ao fisco que, somadas, “ultrapassam os 57 milhões de euros”.

Primeira acusação vai a julgamento

O caso que chega esta terça-feira à Instância Central de Lisboa/secção criminal, foi conhecido em 2013, ano em que surgiram várias notícias sobre a primeira acusação da Operação Furacão.

O consultor Diogo Viana, então com 61 anos, criou em 1993 o grupo Finatlantic na Irlanda – uma plataforma que viria a revelar-se central. Passado alguns meses da sua criação o grupo já operava em Portugal, disponibilizando, segundo o Ministério Público (MP), “serviços de consultoria fiscal a clientes, incluindo serviços que passavam pela utilização de sociedades não residentes no país de origem dos clientes”. Para isso, concluíram os magistrados na acusação, eram “montadas estruturas societárias destinadas a práticas que visavam gerar vantagens fiscais para os clientes”.

A investigação centrou-se no período entre 2001 (antes os factos já estavam prescritos) e 2007, a Operação foi desencadeada em 2005 mas alguns crimes continuaram durante o curso do inquérito.

Na prática, foram criadas – pelo grupo Finatlantic – empresas fictícias na Irlanda e no Reino Unido que emitiam faturas falsas a empresas portuguesas, com os valores que estas quisessem. As faturas destes falsos serviços permitiam às sociedades nacionais diminuir a matéria coletável.

Além disso, o dinheiro que era enviado para a Irlanda e Reino Unido, sob a justificação de pagamento de serviços, era desviado para sociedades offshore também criadas pela Finatlantic e que tinham como últimos destinatários os sócios das empresas portuguesas.

Finibanco era intermediário

Estas operações permitiam que todos ganhassem. As empresas portuguesas, o grupo Finatlantic, que cobrava comissões pelas transferências entre a Irlanda e Reino Unido e as sociedades offshore, e ainda o Finibanco.

Desde 2001, o banco então da família Costa Leite, funcionava como um intermediário de clientes nesta teia. O esquema era apenas apresentado aos melhores clientes do banco.

Dos 30 acusados em 2013 no âmbito deste processo – Marina Mota era uma das que constava do rol – só 12 vão agora a julgamento. Os restantes conseguiram a suspensão provisória do processo, mediante o pagamento do valor em dívida acrescido de juros.

A suspensão provisória do processo está prevista no Código de Processo Penal mas vulgarizou-se no caso Furacão. O departamento do Ministério Público responsável pela investigação dos crimes económicos mais complexos entende que a liquidação dos impostos em dívida tem como consequência a suspensão do procedimento criminal.

O caso de Marina Mota

A atriz já não está entre os acusados, mas o seu caso ilustrava bem o esquema que foi montado. Em causa estava um montante de 980 mil euros de impostos não liquidados. A atriz terá aceitado o esquema de fuga ao fisco, ocultando das Finanças os valores que a TVI lhe pagou pelos programas “Bora lá Marina” e “As Pupilas do Senhor Doutor”, e ainda o valor recebido como indemnização e o resultado da venda de dois imóveis.

A Operação Furacão

Até agora, no âmbito do Furacão, foram instaurados 149 inquéritos e o Departamento Central de Investigação e Ação Penal constituiu arguidos mais de 750 pessoas e empresas.

Desses arguidos, explicou a Procuradoria-Geral da República (PGR) ao i, “foram acusados, até ao momento, 108 arguidos, entre pessoas singulares e coletivas.”

 Os valores em causa também mostram a dimensão do mecanismo montado para fugir ao fisco. Nas cinco acusações já deduzidas estão em causa montantes que, somados, “ultrapassam os 57 milhões de euros”. Mas, uma década depois, a investigação ainda não foi dada como encerrada. Estão ainda em curso cinco inquéritos.

São também muitos os arguidos que por pagarem os impostos em falta (acrescidos de juros) acabaram por não ir a julgamento. Segundo a PGR, “já foi proferido despacho de suspensão em 134 processos, mediante o pagamento pelos arguidos das quantias devidas.” Além disso, “há ainda inquéritos pendentes com o objetivo de suspensão provisória.”

142 milhões recuperados

Segundo os dados mais atualizados do Departamento Central de Investigação e Ação Penal, foram já recuperados cerca de 142 milhões de euros. “Quanto a quantias, o DCIAP contabilizou um total de 141.523.698,12€ recuperado até à data”, revela fonte oficial.

Mas o valor que regressou aos cofres do Estado pode na verdade ser ainda superior. Isto porque segundo a Procuradoria Geral da República, os 142 milhões “não inclui as quantias pagas na sequência de inspeções levadas a cabo pela Autoridade Tributária que tiveram origem em comunicações do DCIAP.”