O ex-líder do CDS Ribeiro e Castro pertence à comissão de honra da candidatura de Henrique Neto e lamenta que os outros candidatos se apresentem com “ideias soltas” e sem uma estratégia para o país. Ainda não decidiu se vai ao próximo congresso do CDS, em março, mas faz duras críticas a Paulo Portas e diz que o ainda presidente do partido tinha “obrigação de continuar”.
O partido de que é militante apoia Marcelo Rebelo de Sousa. O que o levou a apoiar outro candidato?
O partido não apoia Marcelo Rebelo de Sousa. O partido fez uma coisa estranhíssima que foi abrir uma crise de direção em plena campanha eleitoral das presidenciais. Sinal de maior desinteresse pela eleição do Presidente da República não podia existir. Acho isso completamente deplorável e inexplicável da parte do presidente do partido. O partido o que fez foi recomendar o voto em Marcelo Rebelo de Sousa.
Sem convicção?
Eu teria preferido outro caminho. Eu achava que a estratégia do CDS e da coligação devia ter sido definida com muito mais abrangência e mais antecedência. Defendi que a coligação deveria ter dado mostras, nas eleições europeias, de que tinha um projeto nacional. De que não eram apenas serviçais da troika, mas tinham um projeto nacional, um projeto que teria expressão nas europeias e, a médio prazo, nas legislativas. Se houvesse esse projeto nacional, essa dinâmica teria gerado uma candidatura presidencial. Haveria uma dinâmica articulada, mesmo que esse candidato fosse independente.
Não houve estratégia?
Não foi assim que aconteceu e prevaleceu a ideia disparatada de não ter estratégia nenhuma para as presidenciais. A estratégia do PSD e do CDS foi não ter estratégia e deu nisto. Nós, hoje, temos candidatos que não têm uma ideia para o país.
E decidiu apoiar Henrique Neto…
É uma pessoa que se apresenta com independência e com uma ideia para o país. Aparece nas presidenciais com um pensamento estratégico para Portugal. É um exemplo de vida, é um operário do Partido Comunista que depois evoluiu e teve uma carreira de grande sucesso, e também de afirmação na política. O país teria a ganhar se os candidatos fossem assim em vez de aparecerem com ideias soltas. Isto não é um concurso de beleza nem uma eleição para eleger o melhor parceiro para António Costa.
Qual é, no seu entender, a principal missão do Presidente da República nos próximos cinco anos?
Creio que o Presidente da República devia ser um farol de esperança e de mobilização e deve ser uma pessoa com grande experiência, atento à crise económica do ponto de vista do funcionamento real da economia, que é o nosso problema principal, e que possa ser de alguma forma um eixo estratégico do país. Tem de ter grande capacidade de criação de compromissos à esquerda e à direita para concretizar uma trégua política em torno de alguns objetivos essenciais para Portugal. Ao fim de 40 anos começa a haver um grande cansaço das pessoas. Não é só a fadiga fiscal de que falava Adriano Moreira, mas é uma fadiga perante a incapacidade do sistema para se reformar e para responder aos problemas.
Como se reflete essa incapacidade?
Dou o exemplo da reforma do sistema político. Todas as pessoas se queixam de que os deputados não as representam, mas desde 1997 que é possível fazer uma reforma eleitoral profunda e não é feita. Podemos até dizer que há quase uma inconstitucionalidade por omissão. Foi feita uma revisão constitucional em 1997 para permitir uma reforma do sistema eleitoral e depois ela não foi feita. Fala-se, fala-se, fala-se, mas não acontece nada. Outro exemplo é a regionalização, que está por fazer, e o que eu defendo é que é preciso descobrir uma alternativa. A questão da consolidação financeira… O discurso da tanga foi proferido em 2002 e nós ainda não conseguimos resolver o problema, e não conseguimos que a sociedade portuguesa assuma isso como uma necessidade imperiosa do país.
Como se consegue envolver as pessoas nesse objetivo?
É preciso assegurar que os sacrifícios são justos e sobretudo animar um esforço de reforma estrutural do Estado que o torne mais barato e mais eficiente, prestando os serviços que são necessários. Isso está tudo por fazer e é preciso encorajar os partidos a fazer esse debate, não sacrificando as funções essenciais do Estado, mas que o Estado funcione com os recursos que a economia do país é capaz de produzir. É esse tipo de trabalho que o Presidente deve fazer. Além de ser um fator de confiança do sistema, um fator de confiança da cidadania.
Na prática, em que é que isso se pode traduzir?
Eu, se fosse Presidente, passava uma semana por mês no interior do país. Em Vimioso, no Sabugal, em Fronteira, em Alcoutim, em Proença-a-Nova… Uma semana por mês, a Presidência da República seria no interior do país e o primeiro-ministro e os ministros teriam de ir lá despachar. Era uma forma de abrir o olhar do país para o país real. Era uma Presidência de proximidade e que levasse a política e a comunicação social ao Portugal profundo, ao Portugal desconhecido e ao Portugal que precisa da nossa atenção e do nosso olhar.
Vai ao congresso do CDS?
Não sei ainda.
Compreende a decisão de Paulo Portas de abandonar a liderança?
A minha principal crítica, nos últimos anos, foi quanto à forma de funcionamento. É um partido que deixou de pensar coletivamente. Não funciona de forma orgânica, não funciona de forma institucional. É um partido useiro e vezeiro na manipulação de eleições internas e nalgumas perseguições cirúrgicas e, portanto, há uma grande quebra de institucionalismo. Compreendo que Paulo Portas se vá embora, mas não nesta altura. Ele tinha obrigação de continuar, depois de ter feito um discurso tão brutal e tão radical contra o governo de esquerda. Devia continuar nessa batalha. Sou defensor de um outro modelo de partido, um partido de construtores e não de seguidores.