Quando Marcelo Rebelo de Sousa se dispõe a contar a alunos do 11.o e do 12.o ano “como se chegou à democracia em Portugal”, a história começa na monarquia absolutista para acabar num 25 de Abril que “não foi uma, mas várias revoluções”. Pelo caminho, Marcelo opta por se apresentar mais como um espetador do que como o ator político que foi na verdade.
“Lembro-me, em miúdo, de estar na varanda de uma casa na Luciano Cordeiro e ver aquela agitação toda, da GNR a perseguir os apoiantes do general Humberto Delgado”, recorda Marcelo, concedendo que estava numa casa de simpatizantes da ditadura, mas sem entrar por episódios que já deram polémica nesta campanha, como a carta de 1973 na qual deu informações a Marcello Caetano sobre o Congresso da Oposição Democrática em Aveiro.
DA ESQUERDA PARA A DIREITA A aula segue com o sublinhar do atraso do país de Salazar e a explicação da forma como, depois da revolução, se construiu uma Constituição que, desde essa altura, “tem sido sempre revista da esquerda para a direita” – como reconheceu o candidato, que tinha passado o dia anterior a frisar ser “a esquerda da direita” e que, como líder do PSD, foi responsável pela última grande revisão constitucional.
De microfone na mão, Marcelo foi passando a história de Portugal em revista, perante uma plateia atenta que ao fim de uma hora de preleção começava já em conversas laterais mais políticas do que seria de supor para uma escola secundária de Alcabideche (Cascais). “Ele agora concorre em nome individual, não é?”, perguntava um aluno a outro. “Sim, mas é do PSD”, respondia outro.
CITAR PACHECO PEREIRA A campainha já tinha soado para o almoço, mas na sala, cheia pelas costuras, ninguém ousava sair do lugar enquanto Marcelo fazia o “balanço geral muito positivo” da democracia e citava Pacheco Pereira para defender que “é preciso que o discurso dos políticos não seja o politiquês”.
Mas foi só quando começaram as perguntas dos alunos que a sala se animou e o professor teve a oportunidade perfeita para exibir os seus dotes de comunicador, mas também para driblar algumas perguntas com rasteira.
“O Presidente da República é um árbitro. Não pode andar à procura de penáltis à primeira mão casual na bola”, foi insistindo perante as várias perguntas que o obrigaram a fazer o que tem feito desde o início da campanha: defender a legitimidade do governo de António Costa e garantir que irá para Belém evitar qualquer instabilidade política.
Se no PSD se procura agora evitar a insistência no discurso da ilegitimidade política, essa lição ainda está na ponta da língua de vários dos alunos, que quiseram saber a opinião de Marcelo sobre as “ambições pessoais” que levaram Costa a uma solução de governação “pouco ética”.
“O governo não pode entrar em funções se não passar no parlamento. Tem alguma lógica. É uma chatice, às vezes. Agora, imagine que era ao contrário”, foi dizendo a um dos alunos do secundário desgostoso com a solução. “Tem de haver regras. É uma frustração, é um desgosto. Mas as regras da Constituição têm de ser aplicadas”, sublinhou Marcelo, que nem quer ouvir falar na hipótese de a discussão do Orçamento do Estado para 2016 levar à queda do executivo do PS.
“Eu espero que não caia”, afirmou o candidato, que fez as contas ao que custará ao país dissolver a Assembleia. “São 70 dias [para o Presidente ouvir os conselheiros e convocar eleições] mais 30 dias [para o executivo tomar posse]”, frisou, chegando à conclusão de que “teríamos governo, na melhor das hipóteses, no pino do verão” e Orçamento só lá para o outono. “Isto é bom? Não é.”
CAVACO E RELVAS Rebelo de Sousa tinha acabado de explicar aos jovens o que tem dito aos militantes do PSD, sublinhando que “a política é feita de alegrias e tristezas”, e já uma aluna queria saber o que o diferencia de Cavaco Silva. Ora, se na quarta-feira Passos Coelho tinha defendido que a visão que Marcelo tem da função presidencial “não difere, na sua natureza, daquela que tem sido a interpretação do prof. Cavaco”, mais uma vez o candidato quis afastar-se do Presidente.
“Cada pessoa é uma pessoa”, reforçou, explicando que além dos percursos e personalidades que os separam, terá também uma Presidência diferente. “Maior proximidade das pessoas” e um Presidente que “faça pontes” em permanência são, garante Rebelo de Sousa, marcas que o diferenciarão em Belém dos mandatos de Cavaco Silva.
Os alunos não pouparam o candidato e até lhe arrancaram uma notícia, quando o puseram a criticar as mudanças na educação que, agora pela mão do ministro Tiago Brandão Rodrigues, levaram ao fim dos exames do 4.o e do 6.o ano.
Mas a questão mais complicada foi mesmo aquela que abriu a conversa e pôs Marcelo a garantir – de forma mais clara do que tinha feito até hoje – que Miguel Relvas não o está a ajudar na campanha. “Não tem ajudado”, respondeu sem descartar essa hipótese. “Tanto quanto sei, ele está no Brasil. Mas se vier a ajudar, eu digo”.