Keynes para totós


Fernando Medina acredita piamente na necessidade de grandes obras públicas e tem uma descontração preocupante com a noção de despesa


Estou desiludido com Fernando Medina. O presidente da Câmara Municipal de Lisboa foi uma das vozes mais moderadas no nosso outubro Vermelho de 2015. Ao contrário dos seguristas, não atirou farpas ao seu secretário-geral e, ao contrário dos tontos, manteve a distância da extrema-esquerda. Não é por acaso que no dia em que Sérgio Sousa Pinto se demitiu do secretariado nacional socialista, Costa chamou Medina ao Largo do Rato. Queria agarrar a outra democrática exceção do PS.

Medina nunca largou os ideais atlânticos e europeístas que definem a sua identidade partidária. É certo que a doutrina pró-UE de Mário Soares tinha interesses próprios: um Estado mais democratizado (contra o PCP) e um Estado mais distribuidor de fundos (contra o centro-direita). Mas é curioso ver que tal só funcionou a curto prazo. Mais tarde, seria a União Europeia a impingir a maior liberalização de sempre em Portugal, via troika.

Por tudo isto, não creio na lengalenga do “delfim”. Aliás, a semelhança mais evidente do atual autarca com o atual primeiro-ministro será serem ambos filhos de pai comunista.

Assim, não será Francisco Assis o favorito a suceder a Costa no partido. Quem não ganha uma eleição interna contra Seguro, dificilmente ganha contra qualquer outro. Se for esperto, Assis deixar-se-á ficar pelos seus devaneios intelectuais nas páginas do “Público” e pelas suas tarefas como deputado no Parlamento Europeu (que, de certo modo, se trata de outro devaneio). Se alguém se lembrar de Pedro Nuno Santos, mais vale fundirem-se com o Bloco de Esquerda.

Medina, por outro lado, cresceu bem na câmara. Fez um discurso corajoso no 1.o de dezembro e sai-se lindamente como comentador na televisão. É jovem, tem boa imagem e não vemos fotos do mesmo com José Sócrates. Mas, pelos vistos, vai condenar-se.

Tal como a geração anterior à sua, parece ter engolido um manual de Keynes para totós. Está a perder-se na sua “visão” para a cidade. Acredita piamente na necessidade de grandes obras públicas e tem uma descontração preocupante com a noção de despesa. As pessoas não gostam de filas e de viver num estaleiro. Esta tão familiar megalomania pode deteriorar uma potencial reputação. O seu projeto de trazer bicicletas de uso partilhado para a capital vai custar mais de 20 mil euros por unidade, sem qualquer expectativa de retorno. É uma loucura. Somos a cidade das sete colinas; quem diabo vai de bicicleta em vez de metro sem gastar uma fortuna em desodorizante? E porque precisa de árvores na 2.a Circular? Para apreciar a paisagem quando estiver preso no trânsito ou pela publicidade ecologista? Aquilo já é caótico assim, imagine-se com menos uma faixa de rodagem.

O alargamento desproporcional de passeios e a imposição de ciclovias por toda a parte provocarão engarrafamentos de horas sem fim, acabando por aumentar a poluição. Como disse Fernando Nunes da Silva, um vereador demissionário, “é fazer à martelada com base numa maioria absoluta e sem preocupação pelos efeitos na vida das pessoas” – ou seja, a preferência pelo imediatismo e o renegar da reforma gradual.

Como esta coluna vem defendendo, nunca haverá bom progresso sem um bom conservador.

O Partido Socialista tem de decidir se quer ser pró-Europa ou pró-dívida. António Costa vai perceber a mal que não pode ter o melhor dos dois mundos. Fernando Medina ainda vai a tempo de perceber a bem; de optar por conseguir os melhores possíveis em vez de prometer o melhor absoluto – que, na prática, nunca existe.

Perdendo as próximas autárquicas, que seriam a primeira eleição da sua carreira, o futuro do presidente da câmara ensombra-se. Não legitima o mandato que veio herdar.

Sem ganhar Lisboa em 2017, o partido fica mais longe. E, em Portugal, sem o partido não se vai a lado nenhum.

Já me cheira a Santana Lopes.

Keynes para totós


Fernando Medina acredita piamente na necessidade de grandes obras públicas e tem uma descontração preocupante com a noção de despesa


Estou desiludido com Fernando Medina. O presidente da Câmara Municipal de Lisboa foi uma das vozes mais moderadas no nosso outubro Vermelho de 2015. Ao contrário dos seguristas, não atirou farpas ao seu secretário-geral e, ao contrário dos tontos, manteve a distância da extrema-esquerda. Não é por acaso que no dia em que Sérgio Sousa Pinto se demitiu do secretariado nacional socialista, Costa chamou Medina ao Largo do Rato. Queria agarrar a outra democrática exceção do PS.

Medina nunca largou os ideais atlânticos e europeístas que definem a sua identidade partidária. É certo que a doutrina pró-UE de Mário Soares tinha interesses próprios: um Estado mais democratizado (contra o PCP) e um Estado mais distribuidor de fundos (contra o centro-direita). Mas é curioso ver que tal só funcionou a curto prazo. Mais tarde, seria a União Europeia a impingir a maior liberalização de sempre em Portugal, via troika.

Por tudo isto, não creio na lengalenga do “delfim”. Aliás, a semelhança mais evidente do atual autarca com o atual primeiro-ministro será serem ambos filhos de pai comunista.

Assim, não será Francisco Assis o favorito a suceder a Costa no partido. Quem não ganha uma eleição interna contra Seguro, dificilmente ganha contra qualquer outro. Se for esperto, Assis deixar-se-á ficar pelos seus devaneios intelectuais nas páginas do “Público” e pelas suas tarefas como deputado no Parlamento Europeu (que, de certo modo, se trata de outro devaneio). Se alguém se lembrar de Pedro Nuno Santos, mais vale fundirem-se com o Bloco de Esquerda.

Medina, por outro lado, cresceu bem na câmara. Fez um discurso corajoso no 1.o de dezembro e sai-se lindamente como comentador na televisão. É jovem, tem boa imagem e não vemos fotos do mesmo com José Sócrates. Mas, pelos vistos, vai condenar-se.

Tal como a geração anterior à sua, parece ter engolido um manual de Keynes para totós. Está a perder-se na sua “visão” para a cidade. Acredita piamente na necessidade de grandes obras públicas e tem uma descontração preocupante com a noção de despesa. As pessoas não gostam de filas e de viver num estaleiro. Esta tão familiar megalomania pode deteriorar uma potencial reputação. O seu projeto de trazer bicicletas de uso partilhado para a capital vai custar mais de 20 mil euros por unidade, sem qualquer expectativa de retorno. É uma loucura. Somos a cidade das sete colinas; quem diabo vai de bicicleta em vez de metro sem gastar uma fortuna em desodorizante? E porque precisa de árvores na 2.a Circular? Para apreciar a paisagem quando estiver preso no trânsito ou pela publicidade ecologista? Aquilo já é caótico assim, imagine-se com menos uma faixa de rodagem.

O alargamento desproporcional de passeios e a imposição de ciclovias por toda a parte provocarão engarrafamentos de horas sem fim, acabando por aumentar a poluição. Como disse Fernando Nunes da Silva, um vereador demissionário, “é fazer à martelada com base numa maioria absoluta e sem preocupação pelos efeitos na vida das pessoas” – ou seja, a preferência pelo imediatismo e o renegar da reforma gradual.

Como esta coluna vem defendendo, nunca haverá bom progresso sem um bom conservador.

O Partido Socialista tem de decidir se quer ser pró-Europa ou pró-dívida. António Costa vai perceber a mal que não pode ter o melhor dos dois mundos. Fernando Medina ainda vai a tempo de perceber a bem; de optar por conseguir os melhores possíveis em vez de prometer o melhor absoluto – que, na prática, nunca existe.

Perdendo as próximas autárquicas, que seriam a primeira eleição da sua carreira, o futuro do presidente da câmara ensombra-se. Não legitima o mandato que veio herdar.

Sem ganhar Lisboa em 2017, o partido fica mais longe. E, em Portugal, sem o partido não se vai a lado nenhum.

Já me cheira a Santana Lopes.