António Capucho trabalhou com Marcelo Rebelo de Sousa nos tempos em que o agora candidato a Belém liderava o partido e admite que, se votasse com o coração, a sua opção seria Marcelo. Mas não coloca de lado votar em Sampaio da Nóvoa, depois de ter apoiado o PS nas últimas eleições legislativas. O ex-secretário-geral do PSD, que foi expulso, continua a defender a mudança dentro do partido, mas não acredita que ela seja possível no próximo congresso.
Quem vai apoiar nestas eleições?
Não sei se vou apoiar alguém. Ainda nem sequer decidi qual vai ser o meu sentido de voto nestas eleições.
O que o faz ter tantas dúvidas?
Estou sinceramente hesitante. Se votasse com o coração, votaria no Marcelo Rebelo de Sousa. Conheço-o há muitos anos e é uma pessoa extremamente categorizada. O problema, para mim, é estar mais identificado com a direita, embora não seja tão liberal como atualmente é o PSD. Se votar com a cabeça, pode ser que entenda que haja um candidato à esquerda mais consentâneo com o perfil que eu entendo adequado para Presidente da República. Decidirei brevemente.
Marcelo Rebelo de Sousa ficou identificado com a política de austeridade do governo liderado por Pedro Passos Coelho?
Não tanto com a política de austeridade. Ele é muito colado ao PSD e há que respeitar isso, porque é militante. Embora manifestamente tenha feito críticas nos seus comentários, por vezes até contundentes, no essencial apoiou o PSD nas eleições legislativas.
Trabalhou com Marcelo Rebelo de Sousa quando ele liderava o PSD. São injustas ou verdadeiras as críticas de que é uma pessoa instável?
São críticas manifestamente exageradas. Todos nós, que fizemos política durante estes 40 anos, temos posições que não são inteiramente coincidentes. As circunstâncias foram mudando e nós próprios evoluímos. Daí a dizer que ele é cata-vento, como disse o presidente do PSD, vai uma distância muito grande. Acho que são críticas exageradas, mas é natural que quer a Maria de Belém quer o Sampaio da Nóvoa tenham agarrado nessa arma de arremesso e explorado essa situação.
Marcelo daria um bom Presidente?
Tem perfil para Presidente da República, como tem a Maria de Belém e o Sampaio da Nóvoa, uns mais do que outros. Só a experiência dirá. Eu penso que o Sampaio da Nóvoa, neste momento, terá ultrapassado nas sondagens a Maria de Belém. Presumo. Esteve melhor contra o Marcelo e parece que reúne apoios mais consistentes do que Maria de Belém, que surge de uma expressão minoritária dentro do PS, sem o apoio da direção. O presidente do PS apoiou Sampaio da Nóvoa. Mas quer Sampaio da Nóvoa quer Marcelo poderão desempenhar o papel de Presidente da República de uma forma independente. Temos de reconhecer que Marcelo pode ter apelado ao voto em Cavaco, pode ter apelado ao voto no PSD, mas nunca deixou de ter alguma independência dentro do PSD.
E parece que não quer o PSD na campanha?
Só se fosse parvo é que queria o PSD na campanha, como é óbvio. Isso parece-me inteligente da parte dele. Se tem uma expressão de voto que ultrapassa largamente o voto do PSD e do CDS, é porque vai buscar votos à esquerda. E se vai buscar votos à esquerda, convém não ter colado a si o PSD e o CDS.
É verdade que Marcelo liga às pessoas às quatro da manhã? A Maria de Belém diz que sabe das horas tardias a que ele liga às pessoas.
Fui secretário-geral do PSD quando ele era presidente do partido e nunca me telefonou às quatro da manhã. Se me telefonasse, levava com o telefone na cara. A não ser que me dissesse que os espanhóis estavam a invadir Portugal. Ele tinha uma capacidade de trabalho muito grande. É verdade que dorme menos do que as pessoas em geral, mas é suficientemente bem-educado para não acordar as pessoas.
Algum destes candidatos pode ser mais favorável para a conjuntura que atravessamos, em que temos um governo minoritário?
Marcelo e Sampaio da Nóvoa têm características distintas, mas julgo que qualquer dos dois lidará bem com a situação no sentido de apoiar o governo, na medida em que o governo deve ser apoiado. Os dois já demonstraram ter capacidade – um mais na política, outro noutras áreas – para exercer o cargo e conseguir consensos na sociedade portuguesa. E daí a minha hesitação. Qualquer dos dois tem capacidade e características próprias para o cargo.
Foi apoiante de António Costa nas eleições legislativas. Qual é a opinião que tem sobre este governo?
Surpreendeu-me pela positiva e alguns ministros que eu não conhecia já deram provas de que António Costa tem um governo com categoria. A única crítica que faço é na educação. Mudar mais uma vez a questão dos exames a meio do ano letivo, não me parece bem, mas este governo, em termos globais, satisfaz completamente as minhas expectativas.
Seria desejável que o PSD mudasse de liderança neste novo ciclo?
O PSD só mudaria se Passos Coelho quisesse mudar de vida, como quis o Paulo Portas. Ele tem as bases completamente dominadas desde o tempo de Miguel Relvas. Vamos ver se surgem alternativas mas, com esta liderança, o partido não vai mudar coisíssima nenhuma em termos de posicionamento ideológico, mesmo que se liberte do CDS.
Porquê?
As prestações que eu já vi na Assembleia da República tornam evidente que vamos ter mais do mesmo. A radicalização verbal, que chega ao ponto do reacionarismo primário, que já vi da parte de alguns oradores na Assembleia da República vindos do PSD, não augura nada de bom. Não tenho a expectativa de que possa haver uma mudança que permita o recentrar do partido, deixando aqueles tiques neoliberais.
Gostava que Rui Rio fosse candidato à liderança do partido no próximo congresso?
Claro que sim, mas mesmo que ele não avance para a liderança por considerar que não há ainda condições, devia apresentar uma lista ao Conselho Nacional e assumir-se como alternativa, como uma tendência dentro do PSD. Se for essa a vontade dele. Pode preferir ficar calmamente com a família. Mas se tem ambição de ter um papel mais ativo na política, acho que devia candidatar-se ao Conselho Nacional.