Afinal, em algumas matérias, a tradição ainda é o que era. O Banco de Portugal, regulador do sistema bancário, pago em boa parte por quem fiscaliza, continua a falhar redondamente na regulação e na prevenção das consequências do regabofe dos banqueiros. A CGTP continua a querer sempre mais e a estar indisponível para acordos na concertação social quando as soluções não são integralmente aquelas por si defendidas. O PCP e o Bloco de Esquerda continuam mais fiéis à desconstrução do que à construção do que quer que seja. Os portugueses continuam a ser a caixa-forte da irresponsabilidade alheia na gestão dos dinheiros públicos e na gestão privada de entidades relevantes da vida em sociedade. Só para os bancos, desde 2007, terão sido gastos cerca de 12 mil milhões de euros, o equivalente a 7,3% do PIB e a um ano de receito do IVA.
Falaram de um tempo novo, mas, num ápice, quando confrontados com o lixo escondido debaixo do tapete junto à porta da “saída limpa” do resgate financeiro, BE, PCP e PEV assumem a sua eterna vocação de marcadores dos problemas, serem forças de manutenção dos equilíbrios da sociedade e constituírem-se também em parte do problema. Não voltasse parte da Direita com a palavra atrás e teríamos o primeiro problema sério do atual governo na votação do Orçamento Retificativo, elaborado para acomodar os estragos do BANIF. É certo que paciência dos cidadãos perante as soluções em que os lucros são privados e os prejuízos nacionalizados está cada vez mais esgotada, mas governar ou ser a maioria parlamentar de apoio de um governo não é só reverter medidas ou querer ter apenas o “bife do lombo” da realidade política: as coisas boas para anunciar.
Hoje à noite, é tempo de tradições, de afetos e de sabores. Haverá quem tenha, quem partilhe, quem conviva com os seus familiares e quem não vá disfrutar do melhor que a época propicia. Para muitos a carência alimentar, a solidão, a falta de futuro, a rua, o frio e a exclusão vão ser o prato servido. É essa tradição de ciclo vicioso, negativo, e injusto que deve ser quebrada. É saturante constatar a mobilização de meios para salvar o setor bancário por contraste com a exiguidade dos recursos disponíveis para o combate ao risco de pobreza e de exclusão social; à precariedade e às injustiças sociais. É insustentável persistir numa situação em que uns têm só o bolo-rei e os outros têm apenas a fava. Porque quem decide não decide a tempo e no sentido certo. Porque o regulador não regula. Porque quem tem a massa não hesita em meter a mão. Só que, para podermos ter essa atitude, a solução não é o ”amanhem-se” do Bloco e do PCP, mas a solução do problema emergente, a alteração das regras, das circunstâncias e do que não funciona. Sejamos intransigentes com quem prevarica para que possamos dar tolerância, descanso e vida a quem cumpre. Senão, a realidade continuará a ser a da sobrevivência, mesmo para quem trabalha, e a das políticas de fato consumado.
Segundo o Inquérito às Condições de Vida e Rendimento do Instituto Nacional de Estatística (INE), em 2014, o risco de pobreza aumentou na população idosa e nos desempregados. A taxa de risco de pobreza para a população idosa fixou-se nos 17,1% em 2014, mais dois pontos percentuais face ao ano anterior (15,1%). A população em situação de desemprego registou uma taxa de risco de pobreza de 42% em 2014, mantendo-se a tendência de aumento registada nos anos anteriores (36% em 2010, 38,3% em 2011 e). O risco de pobreza para a população empregada aumentou de 10,7% para 11,0%, refere o inquérito do INE, realizado em 2015 às famílias residentes em Portugal.
Saibamos fazer desta noite e dos outros dias do ano, tempo para estarmos mais com quem gostamos e para fazermos o que tem de ser feito para garantir que o bolo-rei é para todos e que a fava só calha a quem deve calhar.
Boas Festas para todos.
Duas notas finais.
As eleições gerais em Espanha confirmaram que, desde 2009, no sul da Europa com programas de ajustamento (Grécia, Portugal, Espanha), só os socialistas portugueses ganharam eleições, nas autárquicas de 2013 e nas europeias de 2014.
O incêndio que destruiu o Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo, no Brasil, delapidou uma dos mais interessantes instrumentos de promoção da riqueza da nossa Língua. Saúda-se a vontade manifestada em Portugal e no Brasil para a recuperação do projeto.
Membro da comissão política nacional do PS
Escreve à quinta-feira