O antigo vice-reitor da Universidade Independente (UnI) vai pedir à Procuradoria-geral da República que analise a decisão de arquivamento do processo de equivalências de José Sócrates. Rui Verde contesta a decisão e espera que o caso venha a ter um desfecho diferente.
No início do mês, o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa dava conta do arquivamento do processo em que se analisavam os processos de atribuição de licenciaturas de oito ex-alunos da UnI – um desses alunos foi José Sócrates.
A respeito destes graus académicos, o Ministério Público (MP) considerava, no despacho de arquivamento, que os atos sob análise estavam “feridos de nulidade”. Mas isso não se traduzia em qualquer consequência. “Caso fosse instaurada ação impugnatória, [isso] criaria certamente para o Estado o dever legal de indemnização para com terceiros e para com os aqui visados”, apontava o MP para justificar o arquivamento.
Rui Verde não concorda com a decisão e prepara-se para agir. “Vou fazer uma exposição à Procuradoria-geral da República, para que analise os fundamentos de direito desta decisão do MP no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa (TACL) e se decida em sentido contrário”, avança ao i o antigo reitor da UnI.
O responsável da instituição pretende que o caso passe para a alçada do Tribunal Central Administrativo e, eventualmente, que as licenciaturas atribuídas com base em equivalências de “feridas de nulidade” sejam retiradas.
Governo fechou os olhos Na fundamentação do arquivamento, o Ministério Público justificou-se com o preço que o Estado poderia ser chamado a pagar caso anulasse, agora, os graus académicos atribuídos ainda na década de 90 através do recurso a equivalências de cadeiras.
A procuradora da República Carla Lamego menciona o encerramento compulsivo da instituição, em 2007, e chama o então ministro da Educação à responsabilidade. Mariano Gago deveria, de acordo com o MP, ter atuado a este respeito, num momento em que já havia informação sobre a forma como as licenciaturas tinham sido atribuídas por aquela instituição.
Pela inação do ministro, “acrescida ficou a confiança dos destinatários” daqueles graus académicos. Além de que, prossegue a procuradora, houve uma “conduta notoriamente omissiva da Administração no que respeita ao seu dever (…) de supervisão sobre todo o processo atinente à criação, funcionamento e supervisão da UnI”.
Pesados todos os fatores, a responsável pelo processo defende que “a proteção da confiança legítima das pessoas assume maior intensidade ponderativa”, restando o arquivamento.
É ou não licenciado? Resposta curta: é. Mas já nada vai ser como dantes para José Sócrates (e para os outros sete alunos da UnI sobre os quais a investigação se debruçou).
A investigação vem sustentar aquilo que durante meses se escreveu e disse na comunicação social: a licenciatura de José Sócrates em Engenharia Civil estava pejada de irregularidades e, em última análise, não era legal. Ainda que, como se disse, Sócrates seja licenciado em engenharia. O recurso de Rui Verde poderá ainda reverter a situação, mas até ao momento – e com base na decisão do MP do TACL – o antigo primeiro-ministro pode fazer uso desse grau académico, uma vez que não houve qualquer ação judicial que anulasse a atribuição desse título.
As dúvidas e as certezas No despacho de arquivamento, a procuradora Carla Lamego aponta quase tantas conclusões como dúvidas sobre o processo de atribuição de equivalências.
Desde logo, fica por esclarecer se as notas atribuídas aos alunos em questão eram ou não verdadeiras: a ausência de documentação “não permite retirar uma conclusão segura sobre a validade ou invalidade das classificações atribuídas aos alunos”.
Tão pouco se percebe se os alunos eram todos avaliados com base na mesma grelha de avaliação ou se os critérios eram aplicados ad hoc, em função das opções do professor ou do aluno que estivesse em causa. Ou, sequer, se os alunos cumpriram, de facto, os momentos de avaliação que os documentos finais dizem ter cumprido – porque os documentos que o comprovariam terão sido mandados destruir pelo então reitor da UnI.
Certo, para a investigação, é que “foram praticados verdadeiros atos administrativos de atribuição de equivalências”. Atos considerados “inválidos” pela simples razão de que, à época dos mesmos, a Universidade Independente não tinha um Conselho Científico em funções – o órgão a quem caberia a apreciação dos processos de equivalências, de acordo com a legislação em vigor nesse momento.
Além disso, o processo de equivalências violou a lei por não haver um “documento comprovativo da aprovação nas habilitações de que se requer equivalência e respetiva classificação, se atribuída”. Só depois de esse processo estar em marcha foram entregues nos serviços da UnI esses documentos.
Quanto ao Inglês Técnico, Sócrates terá efetivamente passado à cadeira. Mas num exame feito a 26 de Agosto de 1996: num momento “muito posterior à data prevista para o exame da época de Julho e muito anterior à época de Setembro”. E terminou o curso a 8 de Setembro desse ano. Uma data sem correspondência na afixação das pautas. Porquê então nessa altura? Não foi possível perceber a razão.