O PS já avisou o PSD de que quer a maioria dos cinco lugares que o parlamento indica para o Conselho de Estado, apesar de o PSD ser o partido com maior representação no Parlamento. A direcção da bancada socialista informou o PSD que “três [lugares no Conselho de Estado] para a direita já não era ajustado ao actual quadro parlamentar”, disse ao i fonte do PS. Os socialistas têm meios para impôr uma posição de força, pois se avançarem com uma lista apoiada pelos partidos à esquerda – como está neste momento a ser ponderado – conseguem maioria, podendo entregar um dos três lugares ao Bloco de Esquerda, e eventualmente outro ao PCP.
Já o entendimento que até agora era usual, entre os ‘partidos do arco de governação’, deixaria o PS desfavorecido: as contas da proporcionalidade seriam feitas entre bloco de esquerda e bloco da direita, mas entre PSD e PS. E os socialistas só obteriam dois.
A Constituição da República dispõe que os “cinco cidadãos” eleitos pela Assembleia da República” serão indicados “de harmonia com o princípio da representação proporcional”. Segundo fontes do PS, “usa-se o método de Hondt” e “a proporcionalidade pode ser feita à partida, se houver uma lista única, ou à chegada, ou seja em fim de votação havendo várias listas concorrentes”.
O processo não é porém absolutamente pacífico e o presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, terá uma palavra a dizer, ouvida a conferência de líderes. E há ainda outro interveniente na eleição: Cavaco Silva. Uma deficiente aplicação da proporcionalidade poderia ser sempre barrada pelo Presdiente. “É ele que tem de dar posse aos conselheiros, no limite, embora não seja fácil, poderia inviabilizar a escolha da AR”, diz um ex-líder parlamentar ouvido pelo i, envolvido em várisos processos de eleição para cargos políticos, entre o PS e o PSD.
Neste processo, uma coisa é certa, o controlo do cumprimento da regra da proporcionalidade será sempre político, estando excluído um juízo jurídico. “Não há fiscalização da constitucionalidade. O Tribunal Constitucional pronuncia-se sobre normas, não sobre escolhas políticas”, explica um constitucionalista.
A negociação à esquerda ainda está por fazer. “Não há nada marcado como o PS e ainda não falámos”, diz ao i um dirigente bloquista. O PS confirma: “O tema ainda não foi objecto de qualquer conversa formal com os nossos parceiros”. Se houver avanço nas negociações, a decisão pode ser tomada na terça-feira, data da reunião da próxima Comissão Política do BE. Mesmo em cima do ‘fecho’ da lista de nomes para o Conselho de Estado, no dia seguinte.
“AGRAVAR RESSENTIMENTOS”
As contas de PSD e CDS são, porém, muito diferentes das que estão a ser feitas pelo PS. “Se se aplicar o método de Hondt, a PàF deve ficar com três lugares e o PS com dois”, defende uma fonte próxima de Paulo Portas, que entende que a correlação de forças só se alterará caso os socialistas optem por avançar com uma lista própria, contrariando a tradição de o bloco central se acertar para formar um lista única de consenso.
Essa atitude de “privilegiar o valor democrático dos votos da maioria em detrimento do valor do pluralismo e da representatividade” é vista à direita como “uma coisa muito perigosa”, que muda definitivamente a forma como os dois principais partidos se têm entendido nos últimos 40 anos.
“Isso só vai contribuir para agravar o ressentimento”, comenta a mesma fonte, explicando que a forma como o PS se prepara para indicar nomes para o Conselho de Estado vai contra o que António Costa anunciou no seu discurso de tomada de posse, quando disse que esta “não é a altura de salgar as feridas”.
À direita, o entendimento que o PS está a fazer da indicação dos nomes para o Conselho de Estado está, de resto, a ser lido como o agravar do precedente aberto aquando da eleição de Ferro Rodrigues para a presidência da Assembleia da República. Nessa altura, os socialistas elegeram Ferro usando o apoio maioritário que têm no parlamento em vez de seguirem a tradição que ditava que chegava à Presidência alguém indicado pela força política mais votada nas legislativas. “Acaba com as lógicas de entendimento ao centro”, defende o social-democrata António Rodrigues, que considera que esta atitude “altera todo o paradigma” e pode criar problemas em negociações futuras de nomeações para as quais é preciso uma maioria de dois terços.
Um conselheiro de Estado comunista? Num momento em que o Bloco está empenhado em entrar para o Conselho de Estado, os socialistas reflectem também sobre a solução que melhor salvuaguarde a solidez da aliança de esquerda que suporta o governo de António Costa.
“Não seria bom para o PS ter o BE no Conselho de Estado, deixando os comunistas de fora”, diz um socialista. O PCP deixou de ter com Cavaco Silva um representente no órgão que aconselha Belém. Com Jorge Sampaio, por escolha do Presidente, o secretário-geral comunista, Carlos Carvalhas, foi conselheiro. E até 1992, por eleição do Parlamento, Álvaro Cunhal,tinha assento no Conselho de Estado.
Depois das últimas legislativas, o Expresso noticiou que o PCP queria voltar a ter um conselheiro em Belém. Os comunistas não assumem para já o interesse nesse regresso, ainda que o BE acabe por ter uma cadeira em Belém, na negociação com o PS. Ao i, fonte comunista afirma que “o PCP não rasga as vestes por isso”.
manuel.a.magalhães@sol.pt com Margarida Davim e Ana Sá Lopes