A primeira volta das presidenciais será a radiografia do PS


Vejamos: caso se mantenha o actual quadro de candidaturas à presidência da república, teremos à direita Marcelo Rebelo de Sousa e à esquerda um naipe de concorrentes bastante vasto. Haverá de tudo para todos nessa área.


O favoritismo de Marcelo Rebelo de Sousa mantém-se com possível potencial de vitória logo à primeira volta, mas não é certo que consiga esse desiderato (uma nota para assinalar à passagem a notável entrevista que deu à SIC).

Há, porém, uma análise susceptível de ser feita relativamente à votação que obterão os candidatos que se identificam com o Partido Socialista e que pretendem assegurar os votos dos eleitores deste espaço, a fim de passarem a uma fase seguinte.

Deixando de parte Henrique Neto, não há dúvida de que, apesar de ser um independente, Sampaio Nóvoa representa o sector socialista mais próximo de António Costa e, como tal, aquele que mais se identifica e sustenta  a solução governativa encontrada pelo líder socialista baseada em acordos com o Bloco de Esquerda, o Partido Comunista e os Verdes. Já Maria de Belém, embora militante do PS de que foi presidente no tempo de António José Seguro, não é propriamente oriunda de um quadrante de entusiastas da área política em que o governo de Costa assenta a sua base de apoio. Belém é uma católica da ala mais à direita do PS e tem muito mais a ver com um bloco central tipo PS/PSD. Embora no seu grupo de apoiantes haja gente que esteve com Costa, o facto é que a maioria dos seus apaniguados não se identificam plenamente com as actuais opções do PS.

Maria de Belém e Sampaio da Nóvoa representam posicionamentos diferentes dentro da área do PS e, por isso mesmo, o número de votos que recolherem na primeira volta das presidenciais (se não houver apenas uma) terão uma dupla leitura política que será muito importante fazer na noite eleitoral de 24 de Janeiro.

Se Maria de Belém efectivamente ficar à frente de Sampaio de Nóvoa e não houver desistências na área da esquerda que prejudiquem esta análise, será plenamente legítimo concluir-se que o eleitorado especificamente do PS não aprecia de sobremaneira a solução governativa que António Costa corporiza.

Evidentemente que não serão os socialistas nem os partidos situados à sua esquerda que irão admitir publicamente a realidade dessa dicotomia política. A exploração de uma circunstância dessa natureza caberá, naturalmente, à oposição de direita e eventualmente a um ou outro elemento do próprio PS que esteja claramente desconfortável com a situação que governativa, como, por exemplo, Francisco Assis. As presidenciais têm, portanto, ângulos múltiplos de análise que não só a questão fundamental da eleição do mais alto magistrado da nação.

Outro ponto de análise para o qual desde já se deve chamar a atenção será a votação de Paulo Morais que faz da denúncia da corrupção a sua bandeira política. Há que tê-lo em conta, pois os portugueses no seu quotidiano têm um discurso fluente e aguçado sobre esse fenómeno, considerando mais ou menos que em cada político há um potencial corrupto, o que, no entanto, não evitou que elegessem e reelegessem alguns várias vezes seguidas, apesar de já saberem o que a casa gastava.

Marine Le Pen não é de extrema-direita

Ao contrário do seu progenitor, esse sim genuinamente de extrema-direita, Marine Le Pen não pode ser catalogada nesse campo político, o que não quer dizer que não tenha pontos de afinidade com a extrema-direita. Mas não tem, por exemplo, o anti-semitismo que caracteriza genericamente essa ideologia e que o seu pai proclamava alto e bom som.

Marine tem mais directamente a ver com movimentos xenófobos, racistas, religiosos e sociais que não aceitam a invasão cultural externa de que a França é objecto e que leva mesmo à subversão dos seus valores tradicionais.

Esses valores franceses inspiram-se tanto nos de um país católico, campesino, burguês, mas simultaneamente republicano, laico, fraterno, igualitário e amante da liberdade em que se reviram sempre gente como os gaulistas e gente de esquerda socialista de que Mitterrand foi o expoente máximo nas últimas décadas.

O grito da primeira volta das regionais de França é a de um povo que não quer perder a sua identidade e os seus valores de tolerância face a uma islamização radical crescente da sociedade e à impossibilidade de integrar e absorver certos grupos de migrantes. Por isso vota Le Pen e vota Sarkozy. Mas amanhã poderá votar em quem à esquerda apresente soluções para o problema.

É, porém, possível que na segunda volta o eleitorado reveja o seu posicionamento, até tendo em conta o facto do PS ter determinado desistências a favor do partido de Sarkozy para afastar a Frente Nacional.

A França sempre foi o grande país de exílio e aceitou gente de todos os quadrantes e credos, mas nunca mudou a sua raiz cultural. O excesso de tolerância da sociedade laica e republicana tem agora o reverso da medalha.

Jornalista

A primeira volta das presidenciais será a radiografia do PS


Vejamos: caso se mantenha o actual quadro de candidaturas à presidência da república, teremos à direita Marcelo Rebelo de Sousa e à esquerda um naipe de concorrentes bastante vasto. Haverá de tudo para todos nessa área.


O favoritismo de Marcelo Rebelo de Sousa mantém-se com possível potencial de vitória logo à primeira volta, mas não é certo que consiga esse desiderato (uma nota para assinalar à passagem a notável entrevista que deu à SIC).

Há, porém, uma análise susceptível de ser feita relativamente à votação que obterão os candidatos que se identificam com o Partido Socialista e que pretendem assegurar os votos dos eleitores deste espaço, a fim de passarem a uma fase seguinte.

Deixando de parte Henrique Neto, não há dúvida de que, apesar de ser um independente, Sampaio Nóvoa representa o sector socialista mais próximo de António Costa e, como tal, aquele que mais se identifica e sustenta  a solução governativa encontrada pelo líder socialista baseada em acordos com o Bloco de Esquerda, o Partido Comunista e os Verdes. Já Maria de Belém, embora militante do PS de que foi presidente no tempo de António José Seguro, não é propriamente oriunda de um quadrante de entusiastas da área política em que o governo de Costa assenta a sua base de apoio. Belém é uma católica da ala mais à direita do PS e tem muito mais a ver com um bloco central tipo PS/PSD. Embora no seu grupo de apoiantes haja gente que esteve com Costa, o facto é que a maioria dos seus apaniguados não se identificam plenamente com as actuais opções do PS.

Maria de Belém e Sampaio da Nóvoa representam posicionamentos diferentes dentro da área do PS e, por isso mesmo, o número de votos que recolherem na primeira volta das presidenciais (se não houver apenas uma) terão uma dupla leitura política que será muito importante fazer na noite eleitoral de 24 de Janeiro.

Se Maria de Belém efectivamente ficar à frente de Sampaio de Nóvoa e não houver desistências na área da esquerda que prejudiquem esta análise, será plenamente legítimo concluir-se que o eleitorado especificamente do PS não aprecia de sobremaneira a solução governativa que António Costa corporiza.

Evidentemente que não serão os socialistas nem os partidos situados à sua esquerda que irão admitir publicamente a realidade dessa dicotomia política. A exploração de uma circunstância dessa natureza caberá, naturalmente, à oposição de direita e eventualmente a um ou outro elemento do próprio PS que esteja claramente desconfortável com a situação que governativa, como, por exemplo, Francisco Assis. As presidenciais têm, portanto, ângulos múltiplos de análise que não só a questão fundamental da eleição do mais alto magistrado da nação.

Outro ponto de análise para o qual desde já se deve chamar a atenção será a votação de Paulo Morais que faz da denúncia da corrupção a sua bandeira política. Há que tê-lo em conta, pois os portugueses no seu quotidiano têm um discurso fluente e aguçado sobre esse fenómeno, considerando mais ou menos que em cada político há um potencial corrupto, o que, no entanto, não evitou que elegessem e reelegessem alguns várias vezes seguidas, apesar de já saberem o que a casa gastava.

Marine Le Pen não é de extrema-direita

Ao contrário do seu progenitor, esse sim genuinamente de extrema-direita, Marine Le Pen não pode ser catalogada nesse campo político, o que não quer dizer que não tenha pontos de afinidade com a extrema-direita. Mas não tem, por exemplo, o anti-semitismo que caracteriza genericamente essa ideologia e que o seu pai proclamava alto e bom som.

Marine tem mais directamente a ver com movimentos xenófobos, racistas, religiosos e sociais que não aceitam a invasão cultural externa de que a França é objecto e que leva mesmo à subversão dos seus valores tradicionais.

Esses valores franceses inspiram-se tanto nos de um país católico, campesino, burguês, mas simultaneamente republicano, laico, fraterno, igualitário e amante da liberdade em que se reviram sempre gente como os gaulistas e gente de esquerda socialista de que Mitterrand foi o expoente máximo nas últimas décadas.

O grito da primeira volta das regionais de França é a de um povo que não quer perder a sua identidade e os seus valores de tolerância face a uma islamização radical crescente da sociedade e à impossibilidade de integrar e absorver certos grupos de migrantes. Por isso vota Le Pen e vota Sarkozy. Mas amanhã poderá votar em quem à esquerda apresente soluções para o problema.

É, porém, possível que na segunda volta o eleitorado reveja o seu posicionamento, até tendo em conta o facto do PS ter determinado desistências a favor do partido de Sarkozy para afastar a Frente Nacional.

A França sempre foi o grande país de exílio e aceitou gente de todos os quadrantes e credos, mas nunca mudou a sua raiz cultural. O excesso de tolerância da sociedade laica e republicana tem agora o reverso da medalha.

Jornalista