É uma questão de prática.E sangue-frio. E colocação. E força. É o penálti no futebol e no hóquei. E o livre de sete metros no andebol. E a penalidade no râguebi. E o lance livre no basquetebol. E o da NBA (sim, fazemos uma clara distinção entre estes dois últimos desportos).
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O basquetebol é uma coisa fixe, a NBA é um espectáculo à parte. Com os seus bons e maus momentos. Há duas noites, um homem salta para a ribalta pelo recorde de 22 lances livres falhados num só jogo. Tal qual Wilt Chamberlain em 1967. Agora, quase meio século depois, DeAndre Jordan repete a exibição com requintes de malvadez. Como o homem não acerta com o cesto, os Blazers fazem-lhe sucessivas faltas. Qualquer coisa como dez no último minuto e meio de jogo, altura em que os Clippers dominam sem transtorno por 102-87. Com um total de 18 lançamentos nesse hiato temporal, DeAndre falha-os todos.Acredite, t-o-d-o-s. É obra.
Há assim alguém parecido no futebol? Com tanta assiduidade, só mesmo Palermo naquele Argentina-Colômbia para a Copa América. Falha qualquer coisa como três. Nós por cá temos um campeão de penáltis falhados. É ele o paraguaio Cardozo, do Benfica, com oito. Atrás dele, Gomes, do Porto e Sporting.
Isso não vem agora para o caso. Estamos a falar de penáltis, sim, mas de um específico. O de William ao Belenenses. O pontapé é seco, a bola entra junto ao poste. O guarda-redes cai para o outro lado e assiste ao golo. É o 1-0 para o Sporting e já não há segundos (quanto mais minutos) para a reacção. O árbitro apita para o fim e o leão ruge nas bancadas.A liderança está assegurada por mais uma jornada, duas se o Porto tropeçar na Madeira daí a dois dias.
Estamos no dia 30. De Novembro. Há cinco meses,William é protagonista de um lance parecido. Estamos no dia 30. De Junho. Portugal joga a final doEuro sub-21 com a Suécia, em Praga. Na meia–final, a Alemanha é varrida sem apelo nem agravo (agrafo, para o i) por 5-0. Com a Suécia, o favoritismo (ligeiro) é nosso. Fiel ao registo, a equipa de Rui Jorge trata a bola com categoria. Nada de nervosismo nem de precipitação. Tudo nos corre às mil maravilhas e o remate de Sérgio Oliveira devolvido pela barra só nos dá ainda mais força. Curioso falar no homem porque é ele o autor da primeira falta de Portugal na final. Aos 24 minutos.
Acredite, aos v-i-n-t-e-e-q-u-a-t-r-o minutos. E, já agora, quantas faltas portuguesas até ao intervalo? Só essa. Acredite. A segunda é de Esgaio, aos 50’. A terceira, novamente de Esgaio, aos 65’. A quarta de Bernardo Silva aos 80’.A quinta de João Mário aos 87’. E a sexta de Gonçalo Paciência aos 89’. Seis faltas em 90 minutos, uma na primeira parte, cinco na segunda. É obra.
Vamos para prolongamento e nada. De golos, calma lá. Faltas até há três. Vamos para penáltis. Aí não pode haver faltas.Só falhas. E William falha o pontapé decisivo, aquele que coroa a Suécia como campeã europeia. Além do pontapé macio, o ar pseudo-despreocupado a cobrir o erro. Cinco meses depois, Sporting e Belenenses anulam-se (0-0). Aos 90-e-tal, Tonel mete mão à bola e é penálti indiscutível. William é chamado à pedra.Sem Adrien, entretanto substituído, o número 14 avança para a bola e arranca a vitória a ferros com um penálti cirúrgico, à campeão: bola para um lado, guarda--redes para o outro.
É o terceiro penálti marcado aos 90-e-tal minutos peloSporting em casa, depois de Carlos Xavier (2-1 ao Boavista em 1985) e Matías Fernández (1-0 ao Marítimo em 2010). Continua atrás do registo do Benfica (Eusébio 1970, Pacheco 1989, AbelXavier 1994 mais Lima 2013) e à frente do do Porto (só um, o de McCarthy ao RioAve em 2004). Se alargarmos a pesquisa para penáltis dos três grandes fora aos 90-e-tal, aí o Porto apanha o Benfica, com Flávio 1972 (Bessa), André 1986 (Coimbra) e Lucho 2008 (Restelo). E, já agora, o Sporting (Adrien, Tondela 2015). É o universo (dos grandes) alinhado.