Desde 1976 que Portugal adoptou o semipresidencialismo, já que, ao mesmo tempo que estabelece a responsabilidade política do governo perante o parlamento, atribui amplos poderes ao Presidente da República, eleito por sufrágio universal, e por isso com a mesma legitimidade que o parlamento. Assim, o Presidente decide a nomeação do primeiro-ministro, pode demiti-lo se estiver em causa o regular funcionamento das instituições democráticas e, salvo nalguns períodos, pode dissolver o parlamento.
Tradicionalmente, no entanto, os governos procuram respaldar a sua legitimidade política exclusivamente no parlamento, e chegam a entrar em confronto político com o Presidente. Não é assim de estranhar que Cavaco Silva tivesse lembrado que conserva intactos todos os seus poderes com excepção da dissolução do parlamento, podendo por isso demitir o governo, e que António Costa tivesse respondido que a sua legitimidade política resultava exclusivamente da Assembleia.
O que já é estranho é que depois se tenha sabido que as propostas de lei do governo vão ser concertadas em reuniões semanais à terça-feira com o BE, o PCP e o PEV. Parece assim que o sistema de governo se converteu num sistema de directório ou de assembleia, em que o governo se assume como mero agente dos partidos que o suportam, não existindo verdadeira autonomia do executivo em relação ao legislativo. Se assim for, falar-se de um governo PS será uma mistificação, uma vez que é na maioria de esquerda na Assembleia que residirá o verdadeiro governo.
Professor da Faculdade de Direito de Lisboa
Escreve à terça-feira