Sobre duas obras de José Pedro Croft


José Pedro Croft (Porto, 1957) é um dos artistas representados na Colecção de Arte Contemporânea da FLAD, com uma obra muito prolífica e diversificada 


JOSÉ PEDRO CROFT (Porto, 1957) é um dos artistas representados na Colecção de Arte Contemporânea da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento. O acervo das obras deste artista é constituído por desenhos, gravuras e  esculturas. Estas últimas percorrem um arco temporal da fase dos empilhamentos em pedra às esculturas em bronze (e bronze pintado) e em ferro, passando pela utilização de espelhos e cantoneiras de metal que o artista tem vindo a desenvolver até à actualidade. 

Uma das obras mais recentes da colecção é o desenho aqui reproduzido, Sem título, 120 cm x 160 cm, executado a guache e pastel seco sobre papel, do ano 2000. Este desenho é particularmente significativo quando observamos o seu trabalho escultórico, porque os elementos plásticos que o constituem estão aqui inscritos sob a forma de uma dupla grelha sobre a folha de papel. 

As formas geométricas são simples mas criam uma relação entre diferentes planos a partir de um vocabulário mínimo, em que a repetição de duas formas rectangulares se desenvolve num sistema de módulos que transforma a espacialidade da folha traduzindo um pensamento tridimensional, entre dentro e fora, profundidade e superfície – e o duplo aparente que a repetição do desenho transforma a partir da utilização da cor.

Neste aspecto, a sua obra é muito prolífica e diversificada na solução das questões que o seu trabalho lhe vai apresentando. A cor é uma camada que o artista veio a incorporar nas suas obras e atravessa as três áreas da sua produção artística, o desenho, a gravura e a escultura. E tem uma importância decisiva na obras realizadas para o espaço público, em Portugal ou no estrangeiro onde tem realizado projectos escultóricos efémeros, e outros que são instalados permanentemente numa relação de confronto, e simultaneamente de correspondência, com a paisagem, seja esta urbana e arquitectónica ou natural, mesmo quando se trata de um jardim público, uma praça arborizada, ou um parque natural. 

Gostaria de referir aqui uma destas obras, que se encontra num dos jardins de Lisboa, o Jardim do Palácio dos Coruchéus, em Alvalade. Esta obra foi encomendada pela Câmara Municipal de Lisboa ao artista e reveste-se de um significado muito especial dado que neste local se encontram os ateliês dos Coruchéus, que foram recentemente revitalizados, em 2010, por uma nova geração de artistas que estão a utilizar e a trabalhar nos ateliês, bem como a histórica galeria Quadrum, que apresenta desde então um renovado programa expositivo. A obra que José Pedro Croft criou para este jardim é ao mesmo tempo um desenho no espaço e uma escultura que se funde com o movimento dos ramos da árvore sobre a qual está instalada.

A escultura é constituída por três longas traves de alumínio que se projectam em altura a partir de diferentes cotas. As cores e texturas das traves têm correspondência com os materiais originalmente usados nos edifícios dos ateliês dos Coruchéus, o alumínio das portas, o vermelho do tijolo e o azul das varandas desenham sobre a árvore essa relação entre a arquitectura e potencialidade da natureza que religa e humaniza o espaço urbano onde a escultura se inscreve.
Contudo, a escultura, aparentemente perene, vai acompanhar o movimento que o lento crescimento da árvore continuará a desenvolver – e será visível de forma diferente consoante as estações do ano, a mudança da luz, ou a folhagem que se renova.

Esta obra é de construção muito simples, mas reclama a nossa atenção para a complexidade do que é transitório e sujeito à mudança. Tal como o desenho reproduzido nesta página do i, essa dupla grelha aparentemente constituída por linhas e módulos onde podemos descobrir mudanças e alterações subtis ao rigor do desenho. 
A escultura que descrevo merece ser vivida e observada nesse espaço da cidade, nem que seja de passagem, porque é presença da mudança pelo pensamento de um artista que não esqueceu a história do lugar.

Curador da Colecção de Arte Contemporânea da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento

Sobre duas obras de José Pedro Croft


José Pedro Croft (Porto, 1957) é um dos artistas representados na Colecção de Arte Contemporânea da FLAD, com uma obra muito prolífica e diversificada 


JOSÉ PEDRO CROFT (Porto, 1957) é um dos artistas representados na Colecção de Arte Contemporânea da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento. O acervo das obras deste artista é constituído por desenhos, gravuras e  esculturas. Estas últimas percorrem um arco temporal da fase dos empilhamentos em pedra às esculturas em bronze (e bronze pintado) e em ferro, passando pela utilização de espelhos e cantoneiras de metal que o artista tem vindo a desenvolver até à actualidade. 

Uma das obras mais recentes da colecção é o desenho aqui reproduzido, Sem título, 120 cm x 160 cm, executado a guache e pastel seco sobre papel, do ano 2000. Este desenho é particularmente significativo quando observamos o seu trabalho escultórico, porque os elementos plásticos que o constituem estão aqui inscritos sob a forma de uma dupla grelha sobre a folha de papel. 

As formas geométricas são simples mas criam uma relação entre diferentes planos a partir de um vocabulário mínimo, em que a repetição de duas formas rectangulares se desenvolve num sistema de módulos que transforma a espacialidade da folha traduzindo um pensamento tridimensional, entre dentro e fora, profundidade e superfície – e o duplo aparente que a repetição do desenho transforma a partir da utilização da cor.

Neste aspecto, a sua obra é muito prolífica e diversificada na solução das questões que o seu trabalho lhe vai apresentando. A cor é uma camada que o artista veio a incorporar nas suas obras e atravessa as três áreas da sua produção artística, o desenho, a gravura e a escultura. E tem uma importância decisiva na obras realizadas para o espaço público, em Portugal ou no estrangeiro onde tem realizado projectos escultóricos efémeros, e outros que são instalados permanentemente numa relação de confronto, e simultaneamente de correspondência, com a paisagem, seja esta urbana e arquitectónica ou natural, mesmo quando se trata de um jardim público, uma praça arborizada, ou um parque natural. 

Gostaria de referir aqui uma destas obras, que se encontra num dos jardins de Lisboa, o Jardim do Palácio dos Coruchéus, em Alvalade. Esta obra foi encomendada pela Câmara Municipal de Lisboa ao artista e reveste-se de um significado muito especial dado que neste local se encontram os ateliês dos Coruchéus, que foram recentemente revitalizados, em 2010, por uma nova geração de artistas que estão a utilizar e a trabalhar nos ateliês, bem como a histórica galeria Quadrum, que apresenta desde então um renovado programa expositivo. A obra que José Pedro Croft criou para este jardim é ao mesmo tempo um desenho no espaço e uma escultura que se funde com o movimento dos ramos da árvore sobre a qual está instalada.

A escultura é constituída por três longas traves de alumínio que se projectam em altura a partir de diferentes cotas. As cores e texturas das traves têm correspondência com os materiais originalmente usados nos edifícios dos ateliês dos Coruchéus, o alumínio das portas, o vermelho do tijolo e o azul das varandas desenham sobre a árvore essa relação entre a arquitectura e potencialidade da natureza que religa e humaniza o espaço urbano onde a escultura se inscreve.
Contudo, a escultura, aparentemente perene, vai acompanhar o movimento que o lento crescimento da árvore continuará a desenvolver – e será visível de forma diferente consoante as estações do ano, a mudança da luz, ou a folhagem que se renova.

Esta obra é de construção muito simples, mas reclama a nossa atenção para a complexidade do que é transitório e sujeito à mudança. Tal como o desenho reproduzido nesta página do i, essa dupla grelha aparentemente constituída por linhas e módulos onde podemos descobrir mudanças e alterações subtis ao rigor do desenho. 
A escultura que descrevo merece ser vivida e observada nesse espaço da cidade, nem que seja de passagem, porque é presença da mudança pelo pensamento de um artista que não esqueceu a história do lugar.

Curador da Colecção de Arte Contemporânea da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento