Quando o Inverno se aproxima, as pessoas recolhem-se mais em casa, os dias são muito curtos, a luz e o sol passam depressa. Começa-se a trabalhar quando o sol seca a névoa matinal e depois, quando se acaba, já é noite, vem o frio, e sem sol já não nos apetece tanto flanar, é fácil desistir de espairecer. Ficamos então no quentinho, mais introspectivos, talvez até mais tranquilos. Pura ilusão: a carência do sol torna-nos depois mais quezilentos, mais tensos, mais atreitos a picos de agressividade. A sublimação de tudo isto virá a seguir, com todo o esplendor, na época natalícia, na catarse das compras. As pessoas chegam a agredir-se por causa de um lugar no parque subterrâneo de um centro comercial. Ora, se isto acontece num país onde o clima é bem capaz de ser o melhor do mundo, e onde em Novembro ainda se consegue dar uns bons mergulhos no mar, imaginemos então, para nosso ilusório consolo, como será a realidade nos lugares onde o Inverno é a sério.
Só que as coisas não funcionam assim. O esboço que fiz de uma certa realidade, ainda que dotado de razoável senso sociológico, não é de todo exclusivo. Porque existe também, para além das horas solares, uma outra poderosa influência na atitude dos humanos em todas as estações do ano, que por isso mesmo paira olimpicamente entre o pecado mortal e o direito supremo: a preguiça. Alavanca irrefutável do progresso, por ela se inventou tudo o que tornou mais fácil a nossa vida e que assim, com ou sem sol, e sem stress, nos torna mais disponíveis para viver, amar e conviver. Usá-la bem, sim, eis o desafio.
Escreve ao sábado