Jonah Lomu começou por ser um rapaz igual aos outros. Os pais eram do Tonga mas nasceu em Auckland, na Nova Zelândia. Nos antípodas, não jogar râguebi é como ser brasileiro sem nunca pensar em ser Pelé. O problema são as oportunidades: a oferta é demasiado pequena para satisfazer uma procura tão grande.
Ser um All Black é o derradeiro sonho mas o caminho é longo e em qualquer momento pode ser desfeito. Para o jovem Lomu houve um ensinamento que ficou marcado na sua evolução. Nos primeiros tempos no Wesley College, um mentor avisou-o que o primeiro passo para chegar a algum lado passava por acreditar nele antes de todos os outros. Um pouco como o anúncio que dizia “se eu não gostar de mim, quem gostará?”
É uma questão de auto-estima. Se quem tem mais a ganhar não acredita, não serão os outros a fazer força por isso. Seja no râguebi na Nova Zelândia, no futebol no Brasil (e em Portugal) ou no basquetebol nos EUA, é preciso acreditar. Ser confiante, roçar a arrogância, mostrar que se quer muito uma coisa. E trabalhar para isso.
Esse é sempre o primeiro passo. É um pouco por aí também que quando se começam a dar os primeiros pontapés da bola, há sempre quem possa dizer que é o Messi, o Ronaldo, o Figo ou o Zidane. Mesmo que as características se distingam dos heróis da vida real. O importante é ter um modelo.
O futebol de formação passa pelo mesmo processo. O problema é que nem todos são estrelas, mesmo que acreditem nisso. Podem ser bons, uns melhores do que outros, mas para alcançar o estatuto de estrela é preciso muito trabalho… e predestinação. Mas o “acreditar” colectivo consegue fazer ainda mais diferença. É isso que distingue a equipa que se dá por perdida da que soma reviravoltas atrás de reviravoltas, ganhando uma fama que se torna quase no medo cénico para os adversários de que falava Valdano.
Há onze anos, numa equipa de juniores, toda a gente era tratada pelo nome mas ninguém escapava ao jogador com quem mais se assemelhava, fosse pela qualidade, pelo gosto ou por características extra-futebol, mesmo fora de futebol. Havia de tudo, o presidente passou a Chumbita Nunes, o delegado ao jogo era o Reinaldo Teles e na equipa havia Mondragón, Helguera, Petit, Simão, Pauleta, Totti, Postiga ou Gattuso. O último, o Ricardo Pedro, não escapou à fama de médio italiano – era com cada pancada no treino! – mas o desejo era ser Pedro Barbosa. Por ser um fã acérrimo, por também gostar de marcar os cantos com os dois pés (e bem, escreveria ele) e… por ser do Sporting. Justiça seja feita, seguia o conselho dado a Lomu como ninguém. Nunca houve quem acreditasse mais que era possível chegar a algum lado do que ele. Não conseguiu, mas tentou. E ainda hoje pensa que passou ao lado de uma carreira. Se calhar, tem razão. Se calhar, não. Mais do que a crença ou o talento, também é uma questão de sorte. E essa Lomu não teve nenhuma… fora de campo. É uma lenda.
Coordenador de desporto
Escreve ao sábado