Os assassinos entre nós


A pobreza, a incultura, a injustiça e a corrupção são factores que criam as condições ideais para a radicalização, e sem dúvida há que combater sem quartel essas assimetrias


A brutalidade do crime não pode iludir a avaliação rigorosa, do ponto de vista histórico e politico, dos factos que levaram à perpetuação do acto de selvajaria. 

Ou seja, se queremos realmente salvar vidas e fazer justiça, se realmente desejamos vencer a barbárie, temos de ter coragem para ir à origem das coisas e exigir a condenação dos que beneficiam em poder e riqueza com estes massacres de ódio e esta guerra dispersa à escala global.

A mão que embala o terrorista é gémea da mão que recebe as transferências financeiras e as amealha na banca internacional, instalada nas avenidas mais glamorosas das mais sofisticadas e civilizadas capitais mundiais.
Os responsáveis pelo nosso luto são os comerciantes do medo, têm o apelido das grandes conglomerações internacionais. A sua mão é a que assina os multimilionários contratos do complexo industrial-militar. Para o seu negócio, a paz é simplesmente inaceitável

É uma mão cuidada, perfumada, que não treme a cada crime de guerra, seja em Paris ou no Cairo, não treme a cada homem decapitado ou mulher violada, a cada civilização destruída ou escola arrasada, não se emociona. 

É uma mão de untar, mão de pelica, para não sujar do rol da bomba e munição vendida, da arte roubada e do petróleo comprado aos desalmados. São intocáveis, espectros representantes do poder financeiro com o poder político vigiado e sequestrado. 

Criam assassinos que realizem o acto e a acção, subornam estadistas que lhes harmonizem os resultados e assalariam “especialistas pensadores” que lhes produzam a propaganda dissimulada de opinião. 

Os bárbaros e hediondos massacres de Paris vieram demonstrar, uma vez mais, que com as suas tácticas mortais, a destruição da memória cultural, os assassinatos em massa, a utilização das mais avançadas tecnologias de comunicação, o autoproclamado Estado Islâmico (EI) está longe de ser um grupo de exaltados militantes radicais provenientes das classes mais pobres e injustiçadas da sociedade.

A pobreza, a incultura, a injustiça e a corrupção são factores que criam as condições ideais para a radicalização, e sem dúvida há que combater sem quartel essas assimetrias. Porém, neste caso, não são a causa principal para o extremismo revelado. 

Existe um desígnio, uma missão ideológica e uma cumplicidade financeira de entidades terceiras que garantem a perenidade e capacidade de acção do Estado Islâmico e podem explicar muito do método e forma deste bando terrorista.

O objectivo da criação de um califado, com a consequente conquista de um espaço vital, assustadoramente idêntico ao desígnio do Terceiro Reich de Adolfo Hitler em 1933, o massacre e o terror como elemento fundamental para impor a sua ordem, equivalente ao bestial comportamento nazi. 

A pilhagem de artefactos culturais e a destruição de obras de arte a lembrar as tristemente famosas fogueiras nazis, a perseguição às comunidades e minorias religiosas que aos olhos do Califado são impuras e, portanto, sujeitas a serem eliminadas, levam-nos a reflectir sobre se o Estado Islâmico não é a adulteração fascista do islamismo.

É impossível combater o Estado Islâmico com fórmulas do passado. Estamos perante um terror eficazmente organizado à escala global que começou a sair das fronteiras da Síria e do Iraque e, em menos de um ano, atacou em França, Líbano, Egipto, Turquia, Tunísia e Koweit, provocando mais de 600 vítimas. 

Putin, ao afirmar ter provas de que o EI é financiado por 40 países, alguns do G20, e por privados, leia-se homens de negócios, banqueiros e políticos, e ao escutar os argumentos da Casa Branca para não atacar as linhas de abastecimento petrolífero, por receio de atingir civis – isto depois de bombardear hospitais –, revela a profunda hipocrisia e lágrimas de crocodilo de alguns dos decisores políticos mundiais.

Não vou referir sequer a criminosa mentira que foi pretexto para a declaração de guerra ao Iraque, na cimeira de 2003 dos Açores, e que agora, passados 12 anos, Tony Blair venha reconhecer “que a guerra do Iraque está na base da criação do Estado Islâmico e que, sem aquela acção injustificada, nunca o EI teria aparecido”.
Nem vou lembrar as primaveras árabes que de sonho passaram a pesadelo, e que tudo isso deixou vastas áreas de território, e milhões de pessoas em fuga, sem organização de estado, sem lei e ordem, regredindo à Idade Média, vítimas e perseguidas por bandos armados.

Hoje, o EI tem uma agenda ideológica própria e gere mais de dois mil milhões de dólares em bens e dinheiro. 
A sua principal receita é a venda ilegal de petróleo bruto a 30 dólares – enquanto no mercado internacional ronda os 90. Conta com quase 100 mil homens nas suas fileiras e tem armamento potente que vai adquirindo e saqueando.

Porém, nada disto nasceu de geração espontânea; necessitou e conta com a firme cumplicidade de entidades oficiais, grupos económicos e personalidades privadas no Ocidente. O combate eficaz aos terroristas passa também pela denúncia, acusação e julgamento dos que com eles negoceiam. 

A própria qualidade da democracia e a manutenção de direitos são já postos em causa na Europa pois, perante a tragédia, a dor é impossível de eliminar e o medo é fácil de inocular. 
A mão que embala o terrorista, que o abastece e sustenta, é a mão suja dos assassinos que se passeiam entre nós. 

Consultor de comunicação
Escreve à quinta-feira

Os assassinos entre nós


A pobreza, a incultura, a injustiça e a corrupção são factores que criam as condições ideais para a radicalização, e sem dúvida há que combater sem quartel essas assimetrias


A brutalidade do crime não pode iludir a avaliação rigorosa, do ponto de vista histórico e politico, dos factos que levaram à perpetuação do acto de selvajaria. 

Ou seja, se queremos realmente salvar vidas e fazer justiça, se realmente desejamos vencer a barbárie, temos de ter coragem para ir à origem das coisas e exigir a condenação dos que beneficiam em poder e riqueza com estes massacres de ódio e esta guerra dispersa à escala global.

A mão que embala o terrorista é gémea da mão que recebe as transferências financeiras e as amealha na banca internacional, instalada nas avenidas mais glamorosas das mais sofisticadas e civilizadas capitais mundiais.
Os responsáveis pelo nosso luto são os comerciantes do medo, têm o apelido das grandes conglomerações internacionais. A sua mão é a que assina os multimilionários contratos do complexo industrial-militar. Para o seu negócio, a paz é simplesmente inaceitável

É uma mão cuidada, perfumada, que não treme a cada crime de guerra, seja em Paris ou no Cairo, não treme a cada homem decapitado ou mulher violada, a cada civilização destruída ou escola arrasada, não se emociona. 

É uma mão de untar, mão de pelica, para não sujar do rol da bomba e munição vendida, da arte roubada e do petróleo comprado aos desalmados. São intocáveis, espectros representantes do poder financeiro com o poder político vigiado e sequestrado. 

Criam assassinos que realizem o acto e a acção, subornam estadistas que lhes harmonizem os resultados e assalariam “especialistas pensadores” que lhes produzam a propaganda dissimulada de opinião. 

Os bárbaros e hediondos massacres de Paris vieram demonstrar, uma vez mais, que com as suas tácticas mortais, a destruição da memória cultural, os assassinatos em massa, a utilização das mais avançadas tecnologias de comunicação, o autoproclamado Estado Islâmico (EI) está longe de ser um grupo de exaltados militantes radicais provenientes das classes mais pobres e injustiçadas da sociedade.

A pobreza, a incultura, a injustiça e a corrupção são factores que criam as condições ideais para a radicalização, e sem dúvida há que combater sem quartel essas assimetrias. Porém, neste caso, não são a causa principal para o extremismo revelado. 

Existe um desígnio, uma missão ideológica e uma cumplicidade financeira de entidades terceiras que garantem a perenidade e capacidade de acção do Estado Islâmico e podem explicar muito do método e forma deste bando terrorista.

O objectivo da criação de um califado, com a consequente conquista de um espaço vital, assustadoramente idêntico ao desígnio do Terceiro Reich de Adolfo Hitler em 1933, o massacre e o terror como elemento fundamental para impor a sua ordem, equivalente ao bestial comportamento nazi. 

A pilhagem de artefactos culturais e a destruição de obras de arte a lembrar as tristemente famosas fogueiras nazis, a perseguição às comunidades e minorias religiosas que aos olhos do Califado são impuras e, portanto, sujeitas a serem eliminadas, levam-nos a reflectir sobre se o Estado Islâmico não é a adulteração fascista do islamismo.

É impossível combater o Estado Islâmico com fórmulas do passado. Estamos perante um terror eficazmente organizado à escala global que começou a sair das fronteiras da Síria e do Iraque e, em menos de um ano, atacou em França, Líbano, Egipto, Turquia, Tunísia e Koweit, provocando mais de 600 vítimas. 

Putin, ao afirmar ter provas de que o EI é financiado por 40 países, alguns do G20, e por privados, leia-se homens de negócios, banqueiros e políticos, e ao escutar os argumentos da Casa Branca para não atacar as linhas de abastecimento petrolífero, por receio de atingir civis – isto depois de bombardear hospitais –, revela a profunda hipocrisia e lágrimas de crocodilo de alguns dos decisores políticos mundiais.

Não vou referir sequer a criminosa mentira que foi pretexto para a declaração de guerra ao Iraque, na cimeira de 2003 dos Açores, e que agora, passados 12 anos, Tony Blair venha reconhecer “que a guerra do Iraque está na base da criação do Estado Islâmico e que, sem aquela acção injustificada, nunca o EI teria aparecido”.
Nem vou lembrar as primaveras árabes que de sonho passaram a pesadelo, e que tudo isso deixou vastas áreas de território, e milhões de pessoas em fuga, sem organização de estado, sem lei e ordem, regredindo à Idade Média, vítimas e perseguidas por bandos armados.

Hoje, o EI tem uma agenda ideológica própria e gere mais de dois mil milhões de dólares em bens e dinheiro. 
A sua principal receita é a venda ilegal de petróleo bruto a 30 dólares – enquanto no mercado internacional ronda os 90. Conta com quase 100 mil homens nas suas fileiras e tem armamento potente que vai adquirindo e saqueando.

Porém, nada disto nasceu de geração espontânea; necessitou e conta com a firme cumplicidade de entidades oficiais, grupos económicos e personalidades privadas no Ocidente. O combate eficaz aos terroristas passa também pela denúncia, acusação e julgamento dos que com eles negoceiam. 

A própria qualidade da democracia e a manutenção de direitos são já postos em causa na Europa pois, perante a tragédia, a dor é impossível de eliminar e o medo é fácil de inocular. 
A mão que embala o terrorista, que o abastece e sustenta, é a mão suja dos assassinos que se passeiam entre nós. 

Consultor de comunicação
Escreve à quinta-feira