Sergi Arola. “Estou aqui a almoçar e esta noite vou estar em Madrid. É muito fácil”

Sergi Arola. “Estou aqui a almoçar e esta noite vou estar em Madrid. É muito fácil”


O percurso que mais faz é o de Madrid-Lisboa. De volta a Portugal, encontrámos o chefe na Penha Longa, onde apresentava a nova carta do restaurante com o seu nome.


Orestaurante Arola, na Penha Longa, apresentou esta semana a sua nova carta. O chefe Sergi Arola esteve por cá e revelou a aposta no português Milton Anes, que coordena os dois restaurantes: Arola e LAB. O catalão continua igual a si próprio, uma espécie de estrela rock que sabe cozinhar.

Sobre a nova carta que vem apresentar, o que tem de diferente em relação às anteriores?
É diferente porque tomámos algumas decisões que mudam algumas coisas, mas não é diferente enquanto filosofia, essa continua a ser a mesma. E acontece depois da abertura do LAB, onde de facto continua a ser apresentada exactamente a mesma carta que no restaurante de duas estrelas de Madrid. Gosto de ser generoso com a minha equipa, de gente muito jovem, são muito bons. E o que decidi foi deixá-los participar no cardápio do Arola. Há coisas novas, mas conservámos a essência, a magia, os princípios básicos e clássicos do Arola, agora também com pratos do Milton Anes. Milton está há muito tempo comigo, passa muito tempo em Madrid, trabalhamos juntos. Vai lá experimentar as receitas e fá-las aqui. Como confiamos um no outro decidimos apresentar também as criações dele. Agora podemos dizer que há uma personalidade mais portuguesa nestes restaurantes.

Um voto de confiança no Milton, portanto.
Absolutamente.

Estão a apresentar apenas a carta do Arola, e não do LAB…
Não queremos misturar. Faremos outro evento para apresentar a outra carta…

Para quando?
Em Novembro mudámos em Madrid, e creio que a 20 ou 25 teremos a apresentação da nova carta do LAB.

Desde que começou a trabalhar passou por algumas transformações no seu processo criativo. Hoje vê a sua cozinha como algo diferente ou continua a existir a mesma base?
Creio que continua a existir a mesma base, a mesma filosofia. Claro que aprendemos técnicas, reforçámos determinados aspectos da nossa personalidade, mas creio que continua a ser igual no espírito, na essência, o rock’n’roll continua o mesmo.

Hoje, com toda a moda e glamour que acompanham os chefes, o que pode fazer a diferença?
É simplesmente a personalidade, mais ou menos atractiva, e o facto de apostar. No meu caso em Portugal. Amo Portugal. De certo modo, sinto-me um pouco português. E desde o princípio foi para mim muito claro que é a minha casa. Em Portugal tenho o meu único restaurante gastronómico no mundo, que é irmão do meu restaurante em Madrid, com o mesmo cardápio. Adoro Portugal e para mim é muito fácil trabalhar com as pessoas em Portugal. Gosto de tudo, da paisagem.

Houve alguma coisa que o tivesse surpreendido muito na cozinha portuguesa?
O sabor. O sabor… penso que podemos trabalhar muito na melhoria das técnicas, na percepção da cozinha, mas há que conservar a pureza dos produtos. Creio que a cozinha portuguesa tem muito sabor e muito característico. Temos de preservar essa pureza.

Então a cozinha portuguesa influencia o seu trabalho?
Com certeza. É uma influência todos os dias. Gosto muito de estar aqui e de vir a Portugal.

Disse-me que este restaurante LAB é o irmão do de Madrid…
É igual. Como se diz em português, gémeo do restaurante de Madrid. Tem a mesma decoração, o mesmo cardápio, a mesma atitude no serviço. As funcionárias trabalharam comigo em Madrid, vão lá periodicamente atualizar os seus conhecimentos.

E é fácil gerir à distância?    
Muito fácil. Estou aqui a almoçar e esta noite vou estar em Madrid. É muito fácil.

E quanto aos outros restaurantes, onde é chefe-executivo, como no Brasil e noutros cantos do mundo? Como consegue gerir?
Penso que o Arola tem uma multinacionalidade e o espírito e a vocação de transgredir os limites da cozinha tradicional espanhola, das tapas, da partilha. Mas ao mesmo tempo, sem o comparar com o restaurante LAB, que é um restaurante gastronómico. 

Acha que é difícil conviver consigo dentro da cozinha?
[Risos.]

Porque há chefes muito duros…
Eu não. Para mim a cozinha é muito importante mas a vida é mais importante. A amizade e as pessoas são mais importantes. Para mim o mais importante é a equipa, a atitude das pessoas contigo e de ti com as pessoas. Sou o Sergi, o Sergi Arola. E nunca tive de dizer que sou o chefe. Não. As pessoas conhecem a minha personalidade e respeitam muito o meu trabalho.

Além das questões de cozinha, o Sergi é catalão e tem havido desenvolvimentos políticos na Catalunha. Como vê esses acontecimentos?
Para mim é muito triste. Muito triste. Falamos português em Portugal. Sou espanhol e você é português e falamos em português ou espanhol, e eu sinto--me um pouco português. Creio realmente na Europa. Na Europa dos povos. Das pessoas. Que não é compatível com as fronteiras. Não é compatível com a política, com toda estas burocracias. Agora há 40% de pessoas na Catalunha que pretendem que toda a gente da Catalunha pense como elas. Para mim é estúpido e completamente anacrónico, não tem a ver com os tempos de hoje.

Como as coisas estão actualmente seria a forma correcta de proceder?
O presidente da Generalitat da Catalunha, Artur Mas, está completamente louco. O exemplo claro da sua loucura é que se verdadeiramente acreditava num estado catalão diria para não votar por ele. Mas ele ficou louco. Crê-se um Messias, um iluminado do povo catalão.

E haverá muita gente na Catalunha que pensa o mesmo, não?
Mas é normal. É normal, mas é tudo mentira. Porque há gente que pensa que se formos independentes não terei mais hipotecas. Mas é claro que continuará a tê-las. Se for independente, não irei pagar mais impostos. Mas claro que vai pagar mais impostos. É tudo mentira, é manipulação dos políticos.

O Sergi sente-se um cidadão do mundo?
Absolutamente! Adoro ser espanhol. Sou catalão, mas adoro ser espanhol, gosto muito de Espanha como país, mas gosto de Portugal, gosto de França, gosto do mundo. Somos a primeira geração da história da humanidade que pode viajar, para conhecer. Que pode romper completamente as fronteiras, que pode desfrutar completamente de um mundo global. Não compreendo a intenção das pessoas que apenas procuram tornar os povos pequenos, com novas fronteiras.

Nessas voltas que o Sérgio dá pelo mundo houve alguma cultura que o tivesse verdadeiramente surpreendido?
Índia, Índia, Índia! 

Cultura? Gastronomia?
Tudo. Há coisas hindus na cozinha absolutamente globais, absolutamente mágicas. Sabores incríveis. E há muita influência portuguesa, mais do que as pessoas pensam.

É uma cozinha que pense incorporar nos seus pratos?
Penso que nos próximos anos pode ser a grande surpresa da cozinha mundial. Falo da cozinha hindu, que tem uma cultura muito forte como base.