O governo aprovou ontem um novo pacote de medidas de austeridade para entrar em vigor já a partir de 1 de Janeiro, mas com cortes mais brandos em relação aos que estão actualmente em vigor. Uma das alterações diz respeito à devolução aos funcionários públicos de mais 20% da redução remuneratória, elevando para 40% o valor devolvido até ao momento, e outra à manutenção da sobretaxa de solidariedade do IRS, que passa dos actuais 3,5% para 2,6% e afecta 1,7 milhões de trabalhadores portugueses.
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No entanto, para estas novas medidas avançarem e começarem a ser aplicadas logo no início do próximo ano é necessário que a oposição se disponibilize a votar favoravelmente este pacote de medidas na Assembleia da República.
A ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, justificou este pacote legislativo por ser “manifestamente impossível” que haja um Orçamento do Estado para 2016 aprovado e em vigor no dia 1 de Janeiro. O objectivo do executivo é minimizar as consequências do atraso na entrada em vigor das medidas orçamentais para o próximo ano e fazer com que, durante o período em que o país for gerido em regime de duodécimos, se mantenham em vigor medidas encaradas como temporárias e que estariam a terminar no final de 2015.
A ministra disse ainda que, se estas medidas não entrarem em vigor a 1 de Janeiro, o seu impacto nas contas públicas ascenderá a 1500 milhões de euros. “Nesta altura é urgente apresentar estes projectos de lei” porque implicam “prazos de consulta pública”, sendo necessário que as medidas “sejam aprovadas até ao Natal para permitir que possam ser promulgadas pelo Presidente da República” e entrem em vigor no início do próximo ano. “A apresentação destes projectos é um acto de responsabilidade do governo”, frisou.
De acordo com as contas de Maria Luís Albuquerque, os cortes salariais aplicados à função pública desde 2011 – que “começaram a ser revertidos este ano em 20%” – deverão ser “novamente revertidos em mais 20%” em 2016, o que quer dizer que serão “inferiores em 40% em Janeiro” face aos cortes iniciais, esclareceu na conferência de imprensa após a reunião do Conselho de Ministros.
Esta medida afecta os funcionários públicos e os trabalhadores de empresas públicas que ganham mais de 1500 euros brutos por mês. O certo é que este corte é inferior ao que foi defendido pelo Partido Socialista durante a campanha eleitoral e está a ser negociado por António Costa no acordo com o Bloco de Esquerda e com o PCP, que prevê uma reposição trimestral dos salários. Isto significa que, a cada trimestre, os trabalhadores do Estado veriam aumentar o salário de modo a receberem por inteiro no final do ano.
Alívio na sobretaxa No caso da sobretaxa em sede de IRS – que até ao final do ano é de 3,5% sobre o montante que exceda o salário mínimo nacional –, a proposta do governo mantém a medida mas “propõe que se reduza dos 3,5% para os 2,625%, ou seja, 25% de redução face ao que está em vigor”. Apesar do ligeiro alívio fiscal, este valor fica longe do que tem sido defendido pelo PS e que se fixava em 1,7%.
No que se refere à contribuição extraordinária de solidariedade sobre as pensões, a ministra das Finanças afirmou que a medida, que se aplicou em 2015 sobre as pensões mais elevadas – reformas acima de 4611 euros – se mantém em 2016, mas será “reduzida para metade”.
Maria Luís Albuquerque chamou ainda a atenção para uma série de outras medidas do lado da receita que estão em vigor este ano e que “se mantêm inalteradas” no próximo ano. É o caso da contribuição extraordinária sobre a indústria farmacêutica, o adicional em sede de imposto único de circulação, o adicional às taxas do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos, a contribuição do sector bancário e a contribuição extraordinária sobre o sector energético.
A verdade é que a maioria destas medidas já estavam previstas no Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC) apresentado em Bruxelas, explicou Maria Luís Albuquerque. No fundo, este pacote legislativo aprovado e prolongado para 2016 segue a estratégia que a coligação apresentou na Comissão Europeia, que colocou no programa eleitoral e que, segundo a ministra, passa por uma redução gradual da austeridade até quatro anos.
Diálogo com PS Apesar de ter aprovado estas novas medidas de austeridade, o ministro da Presidência, Luís Marques Guedes, garante que o governo se mantém aberto ao diálogo com o PS com vista à governabilidade do país. “O que está em causa é a governabilidade do país, a estabilidade e a recuperação económica e de rendimento dos portugueses”, referiu o governante no final da reunião do Conselho de Ministros, mas lamentou que, da parte do Partido Socialista, “não tenha havido até ao momento essa disponibilidade”.
O programa vai ser entregue hoje na Assembleia da República e Marques Guedes garante que o documento é voltado para a “legislatura” e não para um período curto. “Da parte do governo, o que posso dizer é que o programa está feito numa perspectiva de governação para a legislatura, em linha com o que foi sufragado nas eleições de 4 de Outubro”, salienta.