Qual é a sua opinião sobre a aliança do PS com os partidos à sua esquerda, que está longe de ser pacífica no partido?
É natural que não esteja a ser pacífica. É a primeira vez que o PS negoceia à sua esquerda. Havia partidos que estavam excluídos do jogo democrático, ou por razões alheias à vontade dos próprios ou até por vontade dos próprios. O PCP também se excluía. É a primeira vez que a questão se levanta. Quando o PS forma um governo de coligação há sempre opiniões divergentes.Mas, dada a sua matriz de liberdade e justiça social, que são duas coisas que a direita não entende que se podem conjugar, o PS não pode agora negociar à sua direita.
Não era possível negociar com o PSD?
Os partidos da direita renunciaram aos seus valores. O PSD renunciou à social-democracia e o CDS renunciou à democracia-cristã. São partidos neoliberais, que entendem que as injustiças sociais são coisas naturais na vida. O PS não pode apoiar um governo da direita por esta razão, não tem afinidades com esta direcção do PSD. É um imperativo moral e patriótico o PS virar-se para a sua esquerda e fá-lo com toda a naturalidade, porque tem mais afinidades com a esquerda. E quais são as afinidades? A defesa da Constituição e do Estado social. Acha pouco? É muito.
Em anteriores coligações o PS esteve no governo com outros partidos. Julga que o PCP e o BE deveriam estar no governo?
É um problema secundário. O que é preciso é um acordo bem fundamentado e consistente. Um acordo de que as pessoas digam: “Isto é sério, podemos ter confiança. Mas eu pessoalmente preferia que eles entrassem no governo, porque era uma forma de distribuir as responsabilidades.
O Presidente da República mostrou que não era favorável a um governo de esquerda. Acha que vai aceitar o governo liderado por António Costa?
O Presidente da República não pode deixar de dar posse ao governo desde que haja uma maioria que o apoie. Não pode, porque senão põe-se à margem da Constituição. Ele, que jurou defendê-la e cumpri-la. Os governos dependem da maioria da Assembleia da República, não dependem da vontade do Presidente da República. Tem de dar posse, senão o Presidente fica fora da Constituição. Eu não coloco essa hipótese.
E acredita que a esquerda conseguirá um acordo sólido?
Tem de ser um acordo de legislatura.
Para quatro anos…
Acredito. O PS tem que ceder naquilo que é possível, mas há coisas em que não pode ceder, que é o cumprimento dos tratados internacionais. Isso nem se discute. O PCP já esteve nos governos provisórios e não instaurou o comunismo, o PPM já esteve numa coligação chamada AD e não instaurou a monarquia. Eles não têm que renunciar às suas ideias.
Muitos dos críticos acham que o governo não vai durar muito tempo…
Os críticos argumentam de toda a maneira, mas o que me preocupa é o futuro do país e o bem-estar da população. É um risco que o Partido Socialista assume, mas é um risco que o PS tem de assumir em nome das suas responsabilidades perante o país e o futuro. Deve assumir esse risco, porque até agora o PS só poderia fazer acordos à direita. Esse monopólio de coligações acabou.