Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Portugal obrigado a pagar 22 milhões de euros em dez anos

Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Portugal obrigado a pagar 22 milhões de euros em dez anos


O direito à propriedade, a excessiva duração dos julgamentos e o direito a um julgamento justo são as violações mais recorrentes.


Nos últimos dez anos, o Estado português foi condenado a pagar quase 22 milhões de euros em indemnizações pelo TribunalEuropeu dos Direitos do Homem (TEDH), com sede em Estrasburgo. Desde que os primeiros juízes tomaram posse na instituição, em 1959, e até ao final do ano passado, os atrasos para lá do “razoável” nos processos judiciais resultaram em 122 condenações – a falha mais recorrente apontada à justiça nacional.

O i analisou as decisões relativas a Portugal desde 2005 tomadas pelo TEDH – em alguns casos referido também como TribunalEuropeu dos Direitos Humanos. Uma das maiores indemnizações atribuídas – pelo menos nos últimos dez anos – foi decidida há uma semana, quando o Estado português foi condenado a pagar mais de 2 milhões de euros à Companhia Agrícola da Apariça, em Beja. Nesse processo analisaram-se as expropriações de terras que ocorreram durante oPREC (Período Revolucionário em Curso), nos meses sensíveis após o 25 de Abril de 1974.

Logo a seguir à “duração dos processos”, a “protecção da propriedade” foi o princípio a que os juízes do TEDH mais recorreram para justificar as penalizações aplicadas ao Estado português – essa norma foi evocada 45 vezes nos últimos 56 anos, período em que Portugal foi 289 vezes objecto de queixas apresentadas por particulares, cooperativas, empresas, sociedades de advogados e também órgãos de comunicação social. 

A protecção da sua propriedade foi precisamente o que esteve em causa em 2008, quando 24 pessoas interpuseram um processo contra o Estado junto do tribunal de Estrasburgo. Nesse caso é referido que “os requerentes – ou os herdeiros dos requerentes – eram proprietários de terras agrícolas objecto de expropriação ou nacionalização no contexto da reforma agrária”. Há sete anos, mais de três décadas depois de terem perdido as terras, o TEDH considerou que essas pessoas tinham direito a receber quase 2,6 milhões de euros pelos prejuízos que tinham sofrido.

Portugal acusa falhas no respeito por vários direitos humanos. A “proibição de discriminação” foi violada apenas num caso nos últimos 56 anos, e o direito à liberdade e à segurança foi posto em causa duas vezes, nos processos que chegaram a Estrasburgo. Mas a “liberdade de expressão” (relevante, por exemplo, quando são levantados obstáculos à liberdade de informar) foi detectada em 19 casos e 27 vezes os tribunais portugueses não garantiram um “julgamento justo” aos cidadãos, além de 30 decisões terem sinalizado falhas na prestação de cuidados médicos a que os pacientes tinham direito.

períodos negros Não será grande risco afirmar que os anos de 2008 (aquele em que as consequências da reforma agrária fizeram mais estragos) e de 2011 vão ficar marcados na história judicial portuguesa durante bastante tempo.

No primeiro caso, pelas indemnizações que oEstado se viu obrigado a desembolsar para quem recorreu ao último dos últimos redutos da justiça: os nove processos analisados nesse ano pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (um valor que até ficou abaixo da média dos últimos dez anos) traduziram-se em mais de 5,3 milhões de euros saídos das contas públicas. No extremo oposto da tabela, o ano passado foi o mais contido da última década – as indemnizações ficaram por menos de 122 mil euros.

No segundo caso, o de 2011, o maior problema foi o número de vezes que o nome de Portugal foi posto em cima das secretárias dos juízes em Estrasburgo: contando apenas as decisões com direito a atribuição de uma indemnização, foram 20 os processos fechados. Nesse ano, a soma de indemnizações decretadas não foi além dos 2,56 milhões de euros. Neste capítulo, 2006 foi o ano em que menos vezes o país foi chamado a assumir responsabilidades, sendo visado em apenas cinco casos com direito a indemnização (ainda que o valor tenha ascendido a mais de 1,8 milhões de euros).

decisão: ilibado? Aconteceu pouquíssimas vezes, mas a verdade é que houve momentos em que Portugal viu o TEDH decidir a favor do país e não de quem interpôs a queixa.

Desde 1959, e de acordo com os dados disponibilizados pelo tribunal de Estrasburgo, houve (apenas) dez processos que chegaram ao fim sem que tivesse sido detectada qualquer violação à Convenção Europeia dos Direitos Humanos – o documento que serve de base às decisões do tribunal. Mas no mesmo período foram encontradas 216 violações aos direitos humanos. E em 56 casos o Estado e os queixosos chegaram a acordo sem que houvesse necessidade de realizar julgamento.