PS e PCP ainda nem acabaram as negociações e já começaram a atirar as culpas para cima uns dos outros. E creio que, se chegarem realmente a um entendimento, rapidamente se perceberá que uma coisa é estarem de acordo contra um inimigo comum e outra coisa, mais difícil, será a colaboração, ou mesmo a convivência pacífica.
De facto, o cimento que une a esquerda é a rejeição do governo Passos/Portas. Assim que esse inimigo deixar de representar uma ameaça (ou um alvo a abater), socialistas, bloquistas e comunistas começarão a lutar cada um pelos seus interesses.
O PS, como partido mais responsável, tenderá a ser mais pragmático e a privilegiar o equilíbrio das contas públicas, enquanto PC e Bloco, como partidos de contrapoder, insistirão nos direitos de pensionistas e trabalhadores. Durante muitos anos estes partidos assistiram à governação a partir de fora, criticando, exigindo mais e traçando objectivos inatingíveis. Despir esse papel equivalerá a abdicarem dos seus princípios.
Quanto a António Costa, perceberá que o desgaste de quem está no poder é muito maior. Para dar um exemplo, o líder do PS fez uma campanha baseada em promessas – aos novos e aos velhos; aos trabalhadores e aos desempregados; aos empresários e aos consumidores; e até a anónimos que se lhe dirigiam e a quem Costa prometia que se ocuparia pessoalmente dos seus casos. Ora governar é tomar decisões, tomar decisões é escolher, e escolher é excluir. Não vai ser possível agradar a todos.
O que farão o Bloco e o PC quando o dinheiro não chegar para tudo e for preciso fazer cortes? Apoiarão o PS ou, como é mais provável, vão pôr-se de fora e criticar?
Quando chegar ao poder, o cimento que une a esquerda ainda nem teve tempo de secar e por conseguinte a tríplice aliança tenderá a desagregar-se. A partir daí, ao contrário do que se tem tentado transmitir, o PS estará em clara minoria no parlamento. Perante isso, a vida do seu governo não será fácil. Nem provavelmente longa.