DJ Ride. A quarta mudança do rei dos pratos

DJ Ride. A quarta mudança do rei dos pratos


Dos maiores do mundo inteiro nas artes do giradisquismo para danças e rimas, o português chega ao quarto disco. “From Scratch”, em jeito de mixtape, está recheado de convidados.


Eis um jogo rápido. Tem três hipóteses para dizer o nome de um DJ português. Apostamos que nas suas três respostas vai estar aquela que procuramos. Sem querermos apelar a um sentido esotérico – ou muito menos chico-esperto –, damos a nossa teoria como garantida, com a certeza de que a memória conta nestas coisas e que DJ Ride vai sair da boca mais tarde ou menos.

Se é verdade que à primeira pode bem dizer um nome na berra que ultimamente lhe tenha invadido os ouvidos com anúncios publicitários e extensivas campanhas de marketing, a nossa intuição diz-nos que a sua cabeça o vai levar para nomes que ouve há muitos anos. Referências, no fundo. E se existe alguém com esse perfil nas cabinas de som nacionais é DJ Ride. 

O mesmo que agora chega ao quarto disco de originais, “From Scratch”, título que tudo diz, não fosse o scratch a sua escola, aquela que o fez ser campeão mundial, entre outras graças. São 13 faixas, todas com direito a convidados, que quem passa a vida num estúdio também merece conviver. 

À conversa com o DJ/produtor, perguntamos-lhe sobre a má vida, horas a fio como vampiro de instrumentais, mas DJ Ride – Tomás Oliveira de nome próprio – trata de relativizar: “Quando estou a fazer os beats, 90% das vezes estou sozinho. A maior parte da música, hoje, faz-se à distância. Por acaso, com os HMB gravámos juntos no estúdio, mas com a Capicua ela estava no Porto, não conseguimos estar juntos. Então mandei-lhe o instrumental e ela fez. Continua a ser um trabalho muito solitário, a questão é que também prefiro trabalhar assim, ainda que seja uma colaboração… quando estás sozinho, flui mais naturalmente”, afirma. 

Convidados

Nem sempre estamos sozinhos, daí que nem sempre possamos controlar o destino dos eventos. Só isso explica que este disco em estilo mixtape, repleto de convidados, só agora esteja finalizado. A ideia não é nova, muito menos a vontade; a habitual e aborrecida agenda é que trama sempre a equação. Ainda assim, “From Scratch” inclui um elenco bastante composto: Capicua, Free The Robots, HMB, Dengaz, Jimmy P, Valete, Stereossauro, Holly e MGDRV, entre muitos outros artistas.

Há sempre aqueles que vão e aqueles que ficam. Entre esses, eis aqueles que DJ Ride deseja que se concretizem no futuro: “Estive quase a conseguir a Kendra Foster, que é a backvocals do D’Angelo, foi mesmo por um triz. Ela gostou das músicas que lhe enviei, mas estava em tour com o D’Angelo e acabou por não se conseguir concretizar. Também cheguei a estar perto de conseguir a cantora inglesa Andreya Triana, da Ninja Tune, que já gravou com o Flying Lotus.”

E se há alguns anos conseguir recrutar alguns destes nomes parecia impossível, a realidade é que a premissa é hoje algo distinta e não se estranhe que num próximo projecto vejamos o produtor das Caldas da Rainha ao lado desta gente. 

Recordemos: “From Scratch” foi masterizado em parte no icónico estúdio de Los Angeles Cosmic Zoo, onde nomes como os Run The Jewels ou mesmo Flying Lotus já gravaram. “É verdade, tive um enorme cuidado na masterização, sobretudo para mais facilmente poder passar as músicas nos meus DJ sets. Na música electrónica, sobretudo há uns anos, sentia-se a diferença entre o que era feito lá fora e em Portugal.

Hoje em dia já não, as pessoas evoluíram bastante na produção. No fundo não queria pôr uma música minha num set e sentir que o volume ia um pouco abaixo”, explica quem começou na música de dança pouco depois do novo milénio e já não pode admitir falhas de primária. 

Sobrou-nos tempo para perguntar a DJ Ride o que significa este quarto trabalho nesta fase da sua carreira. “Acaba por mostrar que evoluí. Gosto sempre de reforçar a ideia de que não sou só DJ, sou produtor também, não toco apenas em festivais.” 

 

DISCOS PARA UMA ILHA DESERTA

Esta é a selecção de Ride. Pode acontecer tudo daqui para a frente – e é provável que assim seja –, mas pelo menos estes cinco discos nunca vão falhar. Marcaram o percurso do músico, influenciaram-no e continuam a ser “fundamentais”.

Endtroducing
DJ Shadow

O disco de estreia desta figura do hip-hop mundial é de Novembro de 1996. Ride ouviu-o pela primeira vez algures entre 2002 e 2003, numa altura crucial. “Foi um álbum que me ajudou imenso. Quando comecei a pôr som, ajudou-me a descobrir e a entender o que era o sampling, que dava para fazer um álbum inteiro só através de samples”, conta. Aqui se prova que foi nas raízes do hip-hop que Ride ganhou o gosto pela música. 

 

Microlandeses
Micro

Compara-o, no impacto que teve sobre si, ao disco de DJ Shadow: “Também me deu um clique. Foi um dos primeiros projectos de rap a nível nacional e como eram dois MC com um DJ… assemelha-se um pouco aos Beastie Boys, um DJ lá atrás sempre com muito relevo”, diz. A figura do DJ como fundamental, é isso que este “Microlandeses” (2002) conta para Ride. Os Micro eram D-Mars, Nel’Assassin e Sagas.

 

To Pimp A Butterfly
Kendrick Lamar

Este vai estar em todas as listas de melhores do ano. E percebe-se. Ride partilha da mesma opinião: “É um dos álbuns que mais tenho ouvido, que mais me tem influenciado”, antes de acrescentar um ponto que tem de ser abordado: “O álbum acaba por ser um filme, uma história do início ao fim, e esta foi uma cultura que se perdeu. Se tiras uma música, não percebes o disco.” Também para Ride, este é um dos melhores discos da história do hip-hop.

 

Dilated Peoples
Expansion Team

Até aqui chegar, Ride limitava-se a escutar hip--hop instrumental, a abordagem de um DJ e os botões certos para o sucesso. Com o conjunto californiano, a conversa mudou. “Foi provavelmente o primeiro grupo de hip-hop norte-americano com voz que comecei a seguir”, confessa. Diga-se que este segundo disco dos Dilated Peoples contou com produções de DJ Premier e The Alchemist, entre outros. 

 

Phantazmagorea
D-Styles

Um disco dos primeiros anos de Ride à volta com os pratos, já que D-Styles é um dos elementos dos Invisbl Skratch Piklz, a referência mundial no que à arte do scratch diz respeito que reúne nomes como Mix Master Mike, A-Trak ou DJ Qbert. “Foi o primeiro álbum feito só com scratch. Parece que é um disco normal, mas não, ele manipulou todos os instrumentos com scratch, foi feito em 2002 e continua actual”, afirma.