O jornal “Público” tem uma curiosa rubrica chamada “Prova dos factos” que, na semana passada, pretendia responder à pergunta: “É verdade que o PS não preparou o eleitorado nem avisou do possível consenso à esquerda?” Para concluir que o PS antecipou ao eleitorado um possível consenso à esquerda, o “Público” utiliza a um tipo de argumentação que é parcial, não no sentido da opinião jornalística legítima, mas no desvirtuamento dos factos.
Desde logo, a moção “Mobilizar Portugal” a que o artigo se refere não é seguramente esclarecedora dessa intenção do PS de querer romper com um bloqueio que não tem só 40 anos: dura desde sempre, desde que foi instaurado o actual regime democrático. Mas se a proposta eleitoral já de si não nos dá grandes pistas, analisando aquilo que foi a realidade da campanha, só mesmo por esoterismo se poderia concluir positivamente pela existência de uma vontade de consenso à esquerda.
O PCP continuou a oferecer-nos a mesma música da M80, revisitando aquilo que lhe ouvimos sempre, nos anos 70, 80 e 90, protagonizando violentos ataques ao que considera ser a “política de direita” dos socialistas portugueses. Ouvir, aliás, as respostas de António Costa no debate com Jerónimo ou Catarina Martins só pode levar-nos a concluir por uma vontade frentista, na linha humorística com que Herman José nos cantava, “quanto mais me bates, eu mais gosto de ti”.
Acresce que, para concluirmos pela existência de um eleitorado esclarecido, não se pode fazer uma análise apenas centrada no PS, ignorando, se o que está em causa é um fact checking, a postura, os discursos e a campanha dos outros partidos.
O “Público” chega ao ponto de afirmar que a prova da existência de esclarecimentos sobre a suposta disponibilidade para fazer uma aliança à esquerda decorre da hipotética ausência, já na campanha, e cita-se, de “referências directas a consensos com o BE ou o PCP”. Ou seja, a clarificação teria existido na pré-campanha, mas na campanha teria sido diluída por um discurso à procura da maioria.
Para o fact checking do “Público”, pouco importa se Costa apresentou um programa macroeconómico nos antípodas do que é defendido por CDU e BE; se durante a campanha estes três partidos se digladiaram verbalmente, na linha tradicional que lhes conhecemos. O que importa é tentar encontrar uma frase, uma referência, algum sinal vital que permita salvar a face de Costa. Algo que, diga-se, não é difícil, conhecida que é a capacidade que o líder socialista exibiu, nos últimos meses, de defender tudo e o seu contrário.
Já o jornal “Público”, esse, na tentativa de imitar outros media, que souberam inovar na elaboração de fact checkings, ficou-se por aquilo que já há muito nos habituou: confundir opinião, e coração, com jornalismo.
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