Posse. Cavaco não muda  discurso

Posse. Cavaco não muda discurso


Cavaco Silva dará hoje posse ao governo de  Pedro Passos Coelho indiferente aos humores de um executivo que já se vê na oposição.


O Presidente da República dará hoje posse ao executivo de Pedro Passos Coelho, alheio ao curto horizonte de vida que se lhe vaticina. E não se desviará um milímetro da posição assumida no discurso de indigitação, proferido há uma semana, ignorando as condições de fragilidade que este executivo vai enfrentar no parlamento, a começar pelo mais que provável voto de rejeição do seu programa de governo. Abrir o espaço para dúvidas relativas à duração do governo seria admitir a possibilidade de uma outra solução governativa dever ser prevista, e Cavaco já afirmou que não há. Isto é, a rejeição não é, para o Presidente da República, um facto consumado.

Outra coisa fará muito provavelmente parte do seu discurso: a solução que se perfila à esquerda. Cavaco não vai alimentar e, pelo contrário, há a forte possibilidade de recorrer de novo ao anátema levantado aos partidos à esquerda. O PR não é de arrependimentos e já fez questão de o dizer uma semana depois do discurso polémico e muito criticado, mesmo por sectores próximos da sua área política.

“Aquilo que havia a dizer sobre esse assunto já disse na intervenção que eu produzi, que foi muito clara, e não estou arrependido nem de uma única linha de tudo aquilo que disse”, disse Cavaco na quarta-feira. O Presidente empurrou para a Assembleia da República, e até individualmente para os deputados, a responsabilidade de chumbar esta solução de governo, e apesar de conhecer o efeito catalisador à esquerda o PR não parece mudar uma linha do seu pensamento estratégico.

Ao não admitir outra solução plausível e não aceitar como consumada a queda deste executivo, Cavaco não poderá esclarecer categoricamente a interpretação plausível das suas palavras no discurso de indigitação do primeiro-ministro, designadamente quando abriu espaço à interpretação de que deixará em funções o governo ainda que chumbado no parlamento: “É aos deputados que compete decidir, em consciência e tendo em conta os superiores interesses de Portugal, se o governo deve ou não assumir em plenitude as funções que lhe cabem.”

Também na tomada de posse do XVIII Governo, o segundo de José Sócrates, depois de uma vitória relativa nas eleições de 2009, o Presidente fez questão de lembrar essa circunstância: “A ausência de um apoio maioritário no parlamento não é, por si só, um elemento perturbador da governabilidade. A ausência de maioria não implica o adiamento das medidas que a situação do país reclama. Para qualquer governo, o horizonte temporal de acção deve ser sempre a legislatura. Perante a gravidade da situação económica do país e a complexidade do actual quadro político, todos somos chamados a actuar com um grande sentido de responsabilidade e de lealdade institucional.”

O Presidente irá repetir, como é hábito, as suas ideias quanto às preocupações com os compromissos internacionais, salientando o que considera os pontos essenciais da governação, sobretudo os recados ao que considera uma boa governação económica. Um estilo que foi repetindo nas tomadas de posse ao longo da sua magistratura. Mas é também um estilo que não foi por si inaugurado, se nos lembrarmos do discurso de posse do XVI Governo Constitucional, em que Pedro Santana Lopes era primeiro-ministro e Jorge Sampaio Presidente.