Seria um “abuso de poder”, diz o constitucionalista Vital Moreira sobre a possibilidade de o Presidente da República poder vir a manter em gestão um governo de Passos Coelho, ainda que seja chumbado por votação maioritária de uma moção de rejeição durante a discussão do programa de governo no parlamento. Vital Moreira considera numa publicação do seu blogue, “Causa Nossa”, que para além das “funestas consequências para os interesses do país”, se trataria de uma “golpada” que “não tem pés para andar”.
E porquê? Porque, escreve Vital, “não havendo outra alternativa de governo nem a possibilidade imediata de convocar eleições, o PR tem a obrigação constitucional de chamar a formar governo o líder do segundo partido mais representado na Assembleia da República”. Não o fazer e manter em funções um governo chumbado na AR seria “incorrer num abuso de poder (…) pondo em causa o regular funcionamento das instituições que ele próprio tem a obrigação constitucional de garantir”.
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Para o professor e constitucionalista Carlos Blanco de Morais “a Constituição não impediria que o actual Governo fique em gestão até à tomada de posse do novo PR em Março”. Mas sustenta que há duas perspectivas: “a juridico-constitucional e a político-financeira”.
No plano juridico-constitucional “o Artº 186º da Constituição prevê a figura do governo em gestão sem que sujeite a sua duração a qualquer tipo de limite”. E lembra o caso da Bélgica que entre 2010 e 2011 teve governo interino mais de 500 dias. Depois, afirma Blanco de Morais: “em Portugal o Presidente tem pouca margem na escolha de um Primeiro-ministro quando há um partido com maioria absoluta”.
Mas, não existindo, há maior liberdade de escolha e “cabe ao PR, ele próprio legitimado por uma eleição direta por sufrágio universal, designar o Chefe de Governo” segundo a leitura que faz dos resultados eleitorais.”. Depois, lembra que na Austria, outro sistema semipresidencial, o Presidente, perante uma coligação de um partido de extrema-direita e um de centro direita ocorrida no ano 2000, impôs condições, “designadamente, que o líder do partido de extrema direita não integrasse o Executivo”.
Aliás, também em Portugal o Presidente Sampaio “impôs condições na formação do governo de Santana Lopes”. E questiona: “Que norma constitucional seria violada se o Governo permanecesse em gestão até Março?” Quem declararia a inconstituicionalidade?
Já no plano político-financeiro Carlos Blanco de Morais tem “as maiores duvidas que este Governo , caso o seu Programa seja reprovado no Parlamento,aceite permanecer em gestão durante tanto tempo”. Nem o Chefe de Estado “teriaa possibilidade deforçar o primeiro-ministro a permanecer por tempo indefenido”.
Depois, acrescenta, “uma coisa seria, no limite, ficar em gestão até ao final do ano. A oposição não poderia aprovar leis que envolvessem o aumento da despesa ou a diminuição da receita”. Já a partir de Janeiro, com o Orçamento de 2015 a vigorar em duedécimos“o Governo ficaria a cozer em lume brando”atolado num cenário de crise , o que não parece fazer sentido.