Benfica e Sporting, que viagem

Benfica e Sporting, que viagem


Os melhores dérbis na Luz, onde o leão não é o rei da selva (só 14 vitórias em 81 jogos).


Um Benfica-Sporting

1948, 25 DE ABRIL

Em 1947-48, Peyroteo não consegue, pela primeira e única vez em 12 épocas, superar a média de um golo por jogo ao longo de uma prova oficial. Adoentado, o avançado está três meses sem jogar e só reaparece em pleno na equipa titular na segunda volta. O suficiente para uma semi-revolução e o Sporting revalidar o título nacional, à custa do rival. No dia 25 de Abril de 1948, o líder Benfica recebe o Sporting, nas Amoreiras, com dois pontos de avanço e vantagem no confronto directo (3-1 no Lumiar), a primeira regra de desempate. Cândido de Oliveira, técnico dos leões e benfiquista confesso, é acusado por um dirigente do Sporting de estar a delinear uma táctica suicida para entregar o título ao adversário, mas há o factor Peyroteo. O avançado resolve fazer (mais uma) exibição memorável. Com quatro golos em 34 minutos, o Sporting goleia 4-1 e é campeão.

1965, 17 DE OUTUBRO

Domingo gordo em Lisboa. À tarde, Benfica-Sporting. À noite, Belenenses-FC Porto. De folga até à hora do jogo, Hernâni e Flávio Costa, capitão e treinador do FC Porto, respectivamente, visitam a Luz e dão por bem empregue o tempo. Trata-se de um dos clássicos mais emblemáticos de sempre, com um triunfo inequívoco do Sporting ante um Benfica apático, a começar na defesa, onde Melo, que substitui o adoentado Costa Pereira, está na baliza. É o seu primeiro e último clássico. “O miúdo não teve culpa nos golos do Sporting”, defende o habitual titular, presente nas bancadas. Na verdade, a culpa é só de um homem: Lourenço. O avançado marca os quatro golos em 61 minutos e nunca dá razão aos adeptos benfiquistas, que, de honra ferida, justificam a tarde gloriosa do rival com o facto de Melo ser pequeno (1,70 m)

1978, 12 DE FEVEREIRO

Braços abertos, como um bailarino, Vítor Baptista domina a bola no peito, sem que Inácio pudesse fazer o que quer que fosse, para depois atirar uma bola indefensável ao ângulo superior esquerdo de Botelho. Um golo total! O Benfica marca assim o único golo de mais um dérbi com o Sporting, mas a festa não é total. “Os colegas correram para me abraçar e quando o Cavungi o fez, o brinco soltou-se e caiu na relva!”, conta, na altura, Vítor Baptista, que ainda passa três minutos e meio de pernas flectidas e com cara de mau, a resmungar consigo mesmo. Ao seu lado, os companheiros ajudam-no, sem êxito. “Sempre gostei mais de ter perdido o brinco e ganho o jogo! Ficava muito mais aborrecido se o Benfica não tivesse ganho… Veja lá, o brinco custou-me 12 contos e o prémio de jogo é de oito. Perdi dinheiro a trabalhar.”

1978, 19 DE NOVEMBRO

O dérbi dos 5-0 ao intervalo dá nas vistas por motivos díspares. Afinal, canta-se o hino nacional antes do encontro e a RTP2 dá um resumo de 25 minutos, o que não é nada habitual nesse tempo. Na verdade, esse período de tempo basta para explicar o jogo, já que o Benfica marca os cinco golos entre o minuto 15 e o 40 da primeira parte, com bis de Reinaldo (15’ e 28’) e Alves (30’ e 40’, este de grande penalidade) mais um Nené (18’), num Estádio da Luz lotado, com a presença de 71 mil espectadores, incluindo o presidente da República Ramalho Eanes. Até dá para John Mortimore substituir os guarda-redes aos 82 minutos, com saída de Bento e a entrada de José Henrique, o popular “Zé Gato”. No outro lado, a fina ironia de Botelho, guarda-redes leão. “Era impossível defender aquelas bolas. Só se fosse a do Alves, na marcação da grande penalidade.”

1983, 29 DE MAIO

O Benfica já entrara em festa há uma semana, com a vitória em Portimão (1-0, de Carlos Manuel aos 85’) que garantira o título de campeão nacional 82-83. Na 29.ª e penúltima ronda da 1.ª Divisão, Chalana dá início às celebrações aos nove minutos, com um belo golo, em que passa por Kikas e Meszaros. Aos 35’, penálti contra o Sporting, por falta de Meszaros sobre o irrequieto Chalana (sempre ele). No Benfica, não há uma política rígida para os marcadores de penáltis: já fora Nené, Humberto Coelho e Diamantino. Desta vez, Bento chega-se à frente. O herói Chalana lembra-se desse momento. “O Bento quis marcar o penálti e pediu autorização ao capitão, Humberto Coelho. Mas Meszaros defendeu o penálti. Julga que o Bento ficou desmoralizado? Nada disso. A três minutos do fim, defendeu um penálti de Jordão e garantiu a vitória [1-0]. O Bento era o maior”

1986, 13 DE ABRIL

É o dia de arranque da vitoriosa campanha europeia do FC Porto, culminada com a conquista da Taça dos Campeões Europeus, em Maio de 1987. É domingo e joga-se a penúltima jornada do Nacional da 1.ª divisão. O Benfica, líder com dois pontos de avanço sobre o FC Porto, tropeça surpreendentemente em casa (2-1) com o rival Sporting e é ultrapassado pelos portistas (vantagem no confronto directo), vitoriosos em Setúbal, com um magnífico golo de Futre, após contra-ataque lançado pelo guarda-redes polaco Mlynarczyk. Na derradeira jornada, o FC Porto confirma o título frente ao último classificado Covilhã (4-2, com 2-2 aos 64 minutos) e termina dois pontos à frente do Benfica, novamente derrotado, agora no Bessa (1-0 pelo Boavista). Antes do dérbi, numa tarde primaveril, as probabilidades do título de campeão fugir ao Benfica eram mínimas e é o próprio Carlos Manuel quem reconhece um certo desprezo pelo Sporting, “talvez a avaliar pelo último jogo entre as duas equipas que terminou 5-0 na Luz, para os quartos-de-final da Taça”, a 12 de Março de 1986. “Fomos um pouco culpados, porque julgávamos que já tínhamos ganho o jogo. Obviamente que o Sporting era um adversário de respeito, mas pensávamos que estava tudo resolvido e entrámos de peito aberto. Foi um dia para esquecer.” O jogo começou mal para o Benfica, que sofreu dois golos em 11 minutos, por Morato (11’) e Manuel Fernandes (22’), e nunca mais se recompôs. Nem com o cabeceamento de Manniche (60’).

2005, 14 DE MAIO

Há muito que não se vê uma ansiedade assim em Lisboa por um dérbi. Em 2004-05, na penúltima jornada do campeonato, o Sporting vai à Luz para defender a liderança e falhou esse objectivo, quatro meses depois de ter sido eliminado pelo Benfica na Taça de Portugal, num inesquecível 3-3 após prolongamento e desempate por penáltis. Nesse 14 de Maio de 2005 (exactamente 11 anos depois dos 6-3 em Alvalade), ao Sporting basta um empate e ao Benfica só a vitória interessa. E ela aparece, aos 84’, por Luisão, a beneficiar de uma saída em falso de Ricardo, que ainda hoje reclama falta do central brasileiro.