© Paulo Novais/Lusa
A longa entrevista a Yanis Varoufakis que a revista australiana “The Monthly” publicou já em Agosto passado, na altura devidamente destacada por este jornal, continua a ser uma leitura com muito interesse. Nos últimos meses de negociações entre o governo grego e o Eurogrupo, que acabariam por levar à assinatura de um acordo aparentemente contraditório com aquilo que era a política defendida pelo Syriza e referendada pelos gregos, a imagem que se obtinha de Varoufakis através da imprensa oscilava entre o louco furioso contra o capitalismo de matriz germânica e o académico deslumbrado com a fama e sem saber o que fazer com ela.
Ora não só a figura é bastante mais densa do que essa aparência pressupunha, como deste seu diálogo mais distendido, longe da pressão governativa, se retiram diversas nuances curiosas. A começar pela mais picaresca, como quando procurou reduzir os salários dos técnicos da “troika”, no seu salário de 18 mil euros mensais, para cerca de 10 mil euros, o que foi prontamente rejeitado pela “troika” alegadamente pela “falta de fundamentação de medida”, semelhante às decretadas sobre funcionários e pensionistas, que viram os seus rendimentos decrescer em média 40%.
A realidade do processo de decisão europeu dos últimos anos entre ministros das Finanças da zona euro é também devidamente anotada, feita de um misto de cobardia, de conveniência e de algumas – poucas – convicções. Ou seja, um processo puramente político, que fica bem ilustrado quando Varoufakis conta que, perguntado Schauble, num contexto privado, sobre se aceitaria para o seu país o que era ali proposto à Grécia, lhe terá respondido claramente que não.
Varoufakis viveu e trabalhou vários anos fora da Grécia, deu aulas em Cambridge e depois em Sydney durante dez anos. Para quem se deixou convencer de que Varoufakis seria um radical esquerdista anti-europeu, recorda aliás que a sua visão de Europa passava pela defesa de um federalismo assumido, pela criação de uns estados unidos da Europa, que pudessem efetivamente aproximar os povos europeus.
Assume a necessidade imperiosa de combater a corrupção nos serviços públicos e a evasão fiscal na Grécia, os dois grandes males do país, bem como o que apelida de cleptocracia assente na banca. Pergunta-se: como explicar que um quilómetro de auto-estrada na Grécia custe ao Estado grego três vezes o que custa na Alemanha ou em França? E dá a resposta, recomendando ao seu entrevistador que visite o bairro do norte de Atenas onde os empreiteiros têm as suas casas… E, já agora, alguém fez estas contas para Portugal?
Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
Escreve à terça-feira