PS quer programa comum, PCP acordos pontuais

PS quer programa comum, PCP acordos pontuais


Reuniões técnicas continuam, com Costa a garantir que vão melhor à esquerda do que à direita. Mas há dificuldades.


Mesmo com o PCP a insistir publicamente que “não é fácil” chegar a um acordo com um partido cujo “programa não responde à aspiração da ruptura com a política de direita” – como fez ontem –, os socialistas mantêm que está tudo no bom caminho nas negociações para um acordo à esquerda. António Costa foi ontem dizer isso mesmo a Bruxelas. Entretanto, em Lisboa, as reuniões técnicas continuam, com o PS a insistir mais num “programa comum” do que em garantir a aprovação de orçamentos ao longo dos quatro anos. Mas PCP mantém dúvidas.

O ponto de honra para o PS é poder ter, para levar ao Presidente da República, um acordo que garanta a estabilidade, mas que também tenha presente a necessidade de restrições orçamentais. Um deles é colocar o país fora do procedimento de défice excessivo (as instituições europeias não acreditam na meta que o governo colocou para este ano, de 2,7%, ou seja, abaixo do limite dos 3%). É tendo em conta isto que seguem as negociações em busca de “um acordo de estabilidade” que, ainda que se cosa com linhas de restrição orçamental, pode não vir a incluir um acordo específico sobre a aprovação de orçamentos do Estado durante toda uma legislatura. 

Até agora, as reuniões estão a avançar com base nas propostas que existem em cima da mesa, muitas delas com implicações orçamentais imediatas (caso da reposição salarial na função pública) que estão a ser calculadas para prevenir derrapagens do défice e da dívida, mas não mais do que isto. “Conta pouco saber o que diz o programa de cada um dos partidos, mas o que cada partido pretende que conste num programa comum”, frisou ontem Costa. Mas anteontem à noite, na RTP, Ilda Figueiredo (membro do Comité Central) afastou o PCP de um “programa comum”, preferindo falar de um “compromisso” que “pode ser negociado a cada momento”. 

Nos últimos dias o PCP tem insistido que o PS já tem os mínimos para viabilizar um governo de esquerda, só que os socialista também não querem só a garantia de que o seu programa passa e argumentam que se os comunistas se mantêm em reuniões técnicas é porque também o sabem. Ontem, as duas partes voltaram a reunir-se à noite, já depois do fecho desta edição. A reunião com o BE foi adiada para hoje.

Mas fora destas reuniões que se têm escondido da comunicação social, o PCP tem mantido a linha dura e ontem, no editorial do “Avante!” desta semana, repetiu por duas vezes que “não é fácil” um acordo com o PS cujo programa “não responde à aspiração da ruptura com a política de direita”. Bem atrás da primeira declaração de Jerónimo de Sousa, na semana passada, depois de um encontro com António Costa.

Aviso comunista Aliás, os comunistas previnem, neste texto do órgão oficial do partido, que a primeira declaração de Jerónimo de Sousa (que foi lida como sinal de abertura total a um acordo com o PS) “deve ser lida e entendida na sua totalidade”. Volta também a dizer que o PS só não formará governo se não quiser e que isso pode acontecer mesmo que não seja possível “a convergência para uma política que responda às aspirações dos trabalhadores e do povo”. “Mesmo nestas circunstâncias não se pode concluir que a solução seja um governo PSD/CDS”, escrevem os comunistas face à posição do PS de não bloquear um governo sem uma “alternativa credível”. Entre os socialistas contactados pelo i, existe a preocupação de ter um acordo escrito e que inclua a “estabilidade de orçamentos”, assim no plural, nas palavras de um deputado. Outro dirigente socialista avisa que “o PS não pode fazer um acordo à esquerda sem as coisas bem escritas” e outro dirigente (também apoiante de sempre de Costa) defende que, em caso de acordo, “a solução é um governo com eles dentro e não um apoio pequenino”. 

A desconfiança existe e as sentenças são muitas, mas o modelo de acordo não está fechado, ainda que Costa fale da negociação como se já o estivesse. Ontem esteve em Bruxelas para uma reunião dos socialistas europeus e afirmou que “a esquerda está em condições de oferecer soluções de governo e de estabilidade que não tinha até agora”. E, apesar de garantir que a porta não está ainda fechada para a direita, atirou à coligação: “Infelizmente não temos visto do PSD e CDS idêntico esforço”. De Martin Schulz (socialista mas também presidente do Parlamento Europeu) ouviu: “É compreensível que eu deseje que o meu amigo António Costa se torne primeiro-ministro.”

Os socialistas devem enviar hoje para a coligação a contraproposta relativa à reunião de terça-feira. Costa disse esperar ter a situação (à esquerda e à direita) clarificada até ao final desta semana, mas este prazo vai derrapar.