De Torres Vedras à Eslováquia: o comboio do golo


O que hoje interessa é o passado. Aquela teoria do recordar é viver. Sobre o Manuel Marques. 


Há um certo fascínio ligado ao Oeste. Poderia estar aqui a falar dos filmes de cowboys, daqueles que vemos desde crianças sobre a ocupação de terras, a criação de grandes propriedades dedicadas à criação de gado, as lutas com os índios, as corridas ao ouro e a procura das terras prometidas, com a mesma lengalenga de sempre, o cowboy – personagem solitário, seja pistoleiro, seja criador de gado, aventureiro, jogador, garimpeiro ou simplesmente vadio, de cidade em cidade, só com a roupa no corpo, um revólver e um cavalo.

Quando entra numa cidade, e quase todas têm uma só rua, há invariavelmente o saloon, local de prostituição, jogo e álcool (não necessariamente por esta ordem, o que até é natural, porque para fazer uma das coisas é preciso dinheiro e coragem), e a cadeia, onde o xerife está constantemente a mastigar tabaco, sentado numacadeira em equilíbrio periclitante entre a secretária e a parede. Não, não estou a falar desse Oeste.

Nem desse nem do outro, mais violento ainda, chamado spaghetti e inventado, digamos assim, por Sergio Leone, em que já havia telégrafos (usualmente vandalizados por grupos de bandidos ou pelos índios), comboios (para serem assaltados por bandidos ou índios) e até jornalistas (esses bandidos). 

Há um certo fascínio ligado ao Oeste. Parte 2.

Podia estar aqui a falar de uns bolos chamados areias brancas, das duas praias que quase se encontram no Baleal, da raia frita em Paimogo, dos super-tubos em Peniche e das sardinhadas (mais um chicharro ou outro) em Ribafria. Mas não, também não vou abordar essa temática.

O que hoje interessa é o passado. Aquela teoria do recordar é viver. Sobre o Manuel Marques. Esse mesmo, o campo do Torreense. Ponto de partida: é uma equipa especial. No campeonato 91/92, o último na 1.ª divisão, consegue a proeza de acabar em antepenúltimo lugar após proporcionar as duas maiores goleadas dessa época (6-1 ao Famalicão e 8-1 ao Estoril), além de um nulo na Luz.

Dizíamos, o Manuel Marques é o campo do Torreense e tem o seu quê de misticismo porque se acredita numa reviravolta no marcador a favor do Torreense a cada passagem do comboio. Não há obviamente qualquer estatística sobre o assunto e até é provável que o comboio (sem bandidos nem índios) desse mais azar que sorte, mas a verdade é que basta ele apitar e passar por ali para os espectadores acordarem da letargia e acreditarem nalguma força especial para chegar à vitória – excepção feita a um Torreense-Sporting B na estreia do indiano Sunil Chhetri em que o 0-0 se mantém teimosamente.

Lá está, aqui o comboio não funciona. Vai daí, temos de arranjar um outro comboio e encontramos um na Eslováquia, no estádio dos amadores do TJ Tatran Cierny Balog. E este passa mesmo no relvado, entre a linha lateral e as bancadas. Para quando um triangular com o Lokomotiv Moscovo?

Editor de desporto
Escreve à sexta