De onde vem tanto mal?


“Ora perscrute lá bem no seu fundo quem são aqueles que realmente não tolera – e, já agora, porquê!”


© Shutterstock

Há eventos que só a força maior nos faz perder. Um deles foi a conferência da Fundação Gulbenkian, comissariada por Pacheco Pereira, cujo título era: “De onde vem tanto mal? As fontes da intolerância e a aprendizagem da tolerância”. Uma conferência destas era imperdível. E perdi-a.

E a força maior não foi um acidente, um nascimento, um óbito! Nem sequer outro evento de igual magnitude. Foi a espuma dos dias. O que não serviu nem servirá para nada. O que nunca será história: as simples misérias do quotidiano: chamadas telefónicas que poderiam ter sido feitas noutro dia; reuniões em que nada se decidiu que não pudesse ser decidido noutro dia; diligências que se não tivessem tido lugar ninguém teria sentido a falta.

É o drama de ser-se profissional liberal. Somos de tal forma Senhores do “nosso tempo”, que acabamos por escravizados totalmente pelo efémero da profissão. Por aquilo que se não tivesse sido feito naquele dia, poderia sê-lo noutro qualquer: é a ditadura… do Cliente… do Judiciário.

Mas pensemos bem: quanto mais proveitoso teria sido para a Humanidade se, em vez de 1 Anfiteatro da Fundação Gulbenkian, se tivesse enchido 100 vezes esse mesmo Anfiteatro com tantos outros como eu? Advogados, Juízes, Procuradores, Médicos, Psicólogos, Professores, Sociólogos, Economistas, e outros profissionais que são, afinal, o Portugal que há!

A busca pela origem “de tanto mal” seguramente nos faria pensar pelo menos no mal que fazemos. E é muito, mesmo o não intencional. A começar pelo que espalhamos ao redor, na família, nos “amigos”, no trabalho, e a acabar nas organizações, nas associações políticas e no próprio Estado a que estamos, pela genética ou pela imobilidade, condenados a pertencer.

Segundo as palavras do Comissário desta conferência, que não me perdoarei ter perdido, o objectivo era discutir a tolerância falando da intolerância. Ora, isto é o cerne de todos os nossos problemas, enquanto seres, famílias, associações, Partidos, País. Discutir a intolerância na sua essência, e a sua potencialidade genética de mal.

Não me preocupava ir ouvir falar da crise dos refugiados como manifestação xenófoba. Mas era um local único para aprender o que é que nos faz intolerantes, qual a razão de ser de termos a sensação de que de algum modo nascemos intolerantes – pelo menos quanto a algumas intolerâncias –, porque foi (e ainda é) a tradição judaico-cristã tão magna fonte da intolerância, e qual a sua real dimensão na história perante o tsunami de intolerância que do mundo muçulmano avança.

Mas a questão que mais apetecia ouvir debater era precisamente a de saber como é possível que um conceito que significava originariamente “pessoa protegida” (Dhimmi), num mesmo contexto religioso (ainda que historicamente distinto) se transmute em “menorização”. Como é que do passado para o presente, a história nos trouxe no caminho da intolerância, e não no sentido inverso.

E isto vale para todos e cada um de nós. No Portugal de hoje.

Sim! Para si também, que me está a ler… ora perscrute lá bem no seu fundo quem são aqueles que realmente não tolera – e, já agora, porquê!

Advogado
Escreve à sexta-feira

De onde vem tanto mal?


“Ora perscrute lá bem no seu fundo quem são aqueles que realmente não tolera – e, já agora, porquê!”


© Shutterstock

Há eventos que só a força maior nos faz perder. Um deles foi a conferência da Fundação Gulbenkian, comissariada por Pacheco Pereira, cujo título era: “De onde vem tanto mal? As fontes da intolerância e a aprendizagem da tolerância”. Uma conferência destas era imperdível. E perdi-a.

E a força maior não foi um acidente, um nascimento, um óbito! Nem sequer outro evento de igual magnitude. Foi a espuma dos dias. O que não serviu nem servirá para nada. O que nunca será história: as simples misérias do quotidiano: chamadas telefónicas que poderiam ter sido feitas noutro dia; reuniões em que nada se decidiu que não pudesse ser decidido noutro dia; diligências que se não tivessem tido lugar ninguém teria sentido a falta.

É o drama de ser-se profissional liberal. Somos de tal forma Senhores do “nosso tempo”, que acabamos por escravizados totalmente pelo efémero da profissão. Por aquilo que se não tivesse sido feito naquele dia, poderia sê-lo noutro qualquer: é a ditadura… do Cliente… do Judiciário.

Mas pensemos bem: quanto mais proveitoso teria sido para a Humanidade se, em vez de 1 Anfiteatro da Fundação Gulbenkian, se tivesse enchido 100 vezes esse mesmo Anfiteatro com tantos outros como eu? Advogados, Juízes, Procuradores, Médicos, Psicólogos, Professores, Sociólogos, Economistas, e outros profissionais que são, afinal, o Portugal que há!

A busca pela origem “de tanto mal” seguramente nos faria pensar pelo menos no mal que fazemos. E é muito, mesmo o não intencional. A começar pelo que espalhamos ao redor, na família, nos “amigos”, no trabalho, e a acabar nas organizações, nas associações políticas e no próprio Estado a que estamos, pela genética ou pela imobilidade, condenados a pertencer.

Segundo as palavras do Comissário desta conferência, que não me perdoarei ter perdido, o objectivo era discutir a tolerância falando da intolerância. Ora, isto é o cerne de todos os nossos problemas, enquanto seres, famílias, associações, Partidos, País. Discutir a intolerância na sua essência, e a sua potencialidade genética de mal.

Não me preocupava ir ouvir falar da crise dos refugiados como manifestação xenófoba. Mas era um local único para aprender o que é que nos faz intolerantes, qual a razão de ser de termos a sensação de que de algum modo nascemos intolerantes – pelo menos quanto a algumas intolerâncias –, porque foi (e ainda é) a tradição judaico-cristã tão magna fonte da intolerância, e qual a sua real dimensão na história perante o tsunami de intolerância que do mundo muçulmano avança.

Mas a questão que mais apetecia ouvir debater era precisamente a de saber como é possível que um conceito que significava originariamente “pessoa protegida” (Dhimmi), num mesmo contexto religioso (ainda que historicamente distinto) se transmute em “menorização”. Como é que do passado para o presente, a história nos trouxe no caminho da intolerância, e não no sentido inverso.

E isto vale para todos e cada um de nós. No Portugal de hoje.

Sim! Para si também, que me está a ler… ora perscrute lá bem no seu fundo quem são aqueles que realmente não tolera – e, já agora, porquê!

Advogado
Escreve à sexta-feira